Oscar Bessi Filho - CORREIO DO POVO, 16/10/2011
- Desculpe. Não consigo.
- Não tem problema.
- Isso nunca me aconteceu antes.
- Eu sei.
- Sabe? Sabe mesmo? Como, se nossas posições são diferentes?
- Sei sabendo, oras.
- Tá achando que é frase feita, né? Que tô fingindo.
- Não, eu...
- Tá, sim. Dá pra ver. Mas eu juro, é a primeira vez.
- É só um estresse. Tá tudo bem.
- Tudo bem? Tudo bem mesmo?
- Aham.
- Ufa. Sabe, é tanto acidente, criança sofrendo, protesto aqui e ali. Gente xingando, gente tocando pedra. Homicídio, cadáver, família chorando, reclamando, bandido, delegacia, relatório e mais relatório. Muita pressão.
- Muita pressão.
- Fardado a gente vira um alvo ambulante. Em cada esquina pode ter um cara armado a fim de te dar um tiro. Ou querendo filmar teus erros com o celular.
- Tó, tó.
- Pô. É sério.
- Ok. Vá dormir. E não se preocupe, eu dou um jeito.
- Dá um jeito? Como assim?
- Eu me viro.
- Opa! Vai me trocar?
- Por um tempo.
- Não!
- Olha, tenho que tomar uma atitude. Não leu o Correio de sexta?
- Li.
- Pois é. Duas PMs nos deixaram em poucos dias. Uma tragédia. A gente tem que fazer alguma coisa e vou começar a me mexer aqui no pelotão.
- Rá! Só agora?
- Tá, tá, tá. Tua falta tá justificada. Fica dispensado até o último dia do mês pra curar o teu estresse. Aí, retorna ao serviço.
- Bá, mas logo no dia do salário? Não vai dar certo.
- Hein?
- Com aquele valor? Muita pressão, tenente. Muita pressão.
A Policia exerce função essencial à justiça. Não é instrumento político-partidário. A segregação pela justiça e a ingerência partidária em questões técnicas e de carreira dificultam os esforços dos gestores e operadores de polícia, criam animosidade, desviam efetivos e reduzem a eficácia e a confiança do cidadão nas leis, na polícia e no sistema de justiça criminal que, no Estado Democrático de Direito, garante a ordem pública e os direitos da população à justiça e segurança pública.
ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.
domingo, 16 de outubro de 2011
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