ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

MARCADOS PARA MORRER



End of Watch (2012)


Eu sou a polícia.

E eu estou aqui para te prender.

Você quebrou a lei.

eu não escrevi a lei.

Pode até não concordar com a lei.

Mas vou aplicá-la.

Não importa como você pleitear, persuadir, mendigar ou tentar mexer minhas simpatias,

nada vai me impedir de colocar você em uma gaiola de aço com barras cinzentas.

Se você fugir, eu vou atrás de você.

Se você brigar comigo, eu vou lutar. 


Se você atirar em mim, eu vou atirar.


Pela lei,

Eu sou incapaz de ir embora.

Sou uma conseqüência.

Eu sou a conta por pagar.

Eu sou o destino com um distintivo e uma arma.

Atrás meu crachá há um coração como o seu 
que sangra. 

eu acho.

eu amo.

E sim, eu posso ser morto.

E embora eu ser apenas um homem ...

Tenho milhares de irmãos e irmãs que são iguais a mim.

Eles vão dar a vida por mim.

Estamos  juntos.

No mesmo uniforme azul.

Proteger a presa dos predadores.

O bom do mau.

Nós somos a polícia!


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA -
Recomendo assistir. Esta é a introdução do filme que mostra a rotina de dois policiais do Departamento de Polícia de Los Ângeles.


Director: David Ayer
Writer: David Ayer
Stars: Jake Gyllenhaal, Michael Peña and Anna Kendrick 

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

PROMESSA DE MUDANÇA NA PMSP

29 de novembro de 2012 | 2h 08


OPINIÃO O Estado de S.Paulo


Ainda é muito cedo para saber se as mudanças feitas pelo governador Geraldo Alckmin na segurança pública produzirão os efeitos que todos esperam para superar a crise nessa área na Grande São Paulo, que é uma das piores dos últimos tempos. Mas as ideias expostas até agora pelos homens que assumiram nos últimos dias os postos-chave do combate ao crime indicam que eles estão no caminho certo. Depois de o secretário Fernando Grella Vieira ter traçado as grandes linhas que, garante, vão orientar sua administração - combinação de firmeza com respeito aos direitos humanos e destaque para o planejamento das ações e o serviço de inteligência -, foi a vez de o novo comandante da Polícia Militar (PM), coronel Benedito Roberto Meira, anunciar importantes mudanças no comportamento da corporação em relação à população.

Uma das principais queixas - de todas as classes sociais, indistintamente - sobre a ação dos PMs é a forma desrespeitosa, truculenta mesmo, com que a maioria deles aborda e trata as pessoas que julgam suspeitas. O que qualquer um, em qualquer região da cidade, dependendo das circunstâncias, pode ser. Agem esses policiais não como servidores públicos que são, mas como pequenos tiranos, que se atribuem o direito de considerar qualquer um culpado até prova em contrário, invertendo o consagrado princípio que deve orientar a conduta das autoridades policiais e judiciárias. Desrespeito que com frequência descamba das palavras grosseiras para a agressão física.

Daí por que é muito bem-vinda a promessa do coronel Benedito Meira: "O contato corporal deve ser feito de forma firme e respeitosa. O cidadão deve ser abordado com dignidade, sabendo o motivo da ação policial". Lembra ele que as revistas - são feitas cerca de 11 milhões por ano - são instrumento fundamental no combate ao crime. "Assim apreendemos armas, identificamos suspeitos e procurados. Por isso, creio que devemos aperfeiçoar a forma como essas ações são feitas." Acrescenta ele que essa maneira de tratar as pessoas, quaisquer que sejam elas, é o principal "cartão de visita" da corporação e instrumento estratégico de combate ao crime.

Melhor não poderia ser dito. Resta saber se o novo comandante da PM conseguirá fazer a corporação tornar essas palavras uma realidade. Isso tem uma dupla importância. Em primeiro lugar, ser bem tratado pelas forças policiais, pagas com seus impostos, é um direito do cidadão. Elas não fazem mais do que sua obrigação, portanto. Em segundo lugar, porque isso é indispensável para a polícia poder contar com a boa vontade e a ajuda da população, que, por sua vez, são fundamentais para o seu bom desempenho.

Aqui como no resto do mundo, como é notório, polícia que conta com a simpatia e o respeito da comunidade a que serve tem seu trabalho muito facilitado. O exemplo sempre citado é o da polícia inglesa, não por acaso uma das mais eficientes. Nada disso significa, como querem os adeptos da truculência, um comportamento mole e tolerante da polícia com relação aos bandidos. A população quer, como atestam as pesquisas de opinião, uma posição firme, dura mesmo, da polícia no combate ao crime. Mas ela quer igualmente receber tratamento civilizado em seus inevitáveis contatos com a polícia, que são frequentes em especial numa situação de crise como a que vivemos hoje.

O coronel Benedito Meira quer também, seguindo a mesma linha, melhorar a imagem das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), a seu ver indevidamente associada a ilegalidades e violência. Isso acontecerá quando abusos e excessos cometidos forem imediatamente punidos.

Tanto no caso das abordagens da PM como da imagem da Rota, não é realista esperar resultados imediatos. Mudar comportamentos arraigados exige tempo e paciência. Mas tudo começa com um primeiro passo, que o novo comandante se mostra disposto a dar. Se ele se mantiver firme e tiver, como se espera, o apoio do governador, as transformações surgirão aos poucos. Com isso todos ganharão - a população será tratada como deve e a corporação sairá fortalecida e prestigiada.

PROMESSAS PARA 2013

O SUL - Porto Alegre, Quinta-feira, 29 de Novembro de 2012.


WANDERLEY SOARES


Segurança nas ruas de Porto Alegre deverá ter um reforço, mas somente bem depois do carnaval.


Quinhentos brigadianos devem reforçar o policiamento nas ruas de Porto Alegre, mas isso está prometido apenas para abril do ano que vem. Segundo o anúncio feito ontem pelo governo do Estado, o grupo faz parte de 2,5 mil candidatos aprovados em concurso e que estão em processo de formação. O prefeito da Capital, José Fortunati, esteve no Palácio Piratini ontem para, pessoalmente, receber a promessa do governador Tarso Genro sobre medidas que estão sendo tomadas na área de segurança. Além dos PMs, Tarso prometeu 60 novas viaturas nas ruas da Capital entre janeiro e fevereiro, o que, realmente, é uma novidade, pois se trata de um período em que tudo se volta para a Operação Golfinho. Foi divulgada também a doação de um terreno para a Polícia Civil instalar uma nova unidade de pronto-atendimento.


Helicóptero


A Polícia Civil do RS recebeu, ontem, o primeiro helicóptero da história da corporação. A aeronave será empregada em ações em todo o Estado em missões de resgate, perseguições e desembarque rápido de agentes em locais de difícil acesso. O aparelho tem capacidade para seis pessoas. Helicóptero, sem nenhuma dúvida, para a segurança pública, apresenta uma eficiência excepcional e isso acontece na Brigada, que também tem aviões que bem poderiam ser desativados.


Drogas (1)


A Polícia Federal desarticulou uma das principais organizações criminosas que enviava cocaína do Paraguai para o Brasil. A droga tinha como destino preferencial a Região Sul. O esquema era comandado por Irineu Domingo Soligo, o Pingo, preso no Paraguai há dois anos e extraditado para o Brasil. A Polícia Federal cumpriu sete mandados de prisão e dez de busca e apreensão nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul.


Drogas (2)


Uma operação da Polícia Civil combate o tráfico de drogas, em Santa Rosa, no Noroeste do Estado, culminou com, pelo menos, trinta pessoas presas. Foram mobilizados mais de 200 policiais. Os suspeitos eram investigados pela havia seis meses. Segundo o delegado Márcio Stefens, a operação desarticulou diversas quadrilhas.


Mudo poliglota


Foi preso em Porto Alegre, na manhã de ontem, um homem que se passava por surdo-mudo para assaltar pedestres, principalmente no bairro Cidade Baixa. Ele roubava principalmente celulares e dinheiro quando se aproximava das vítimas para supostamente pedir informações. A prisão ocorreu na avenida Carlos Gomes. Segundo a Brigada Militar, o ladrão, além de português, fala francês e inglês. Ele deve estar se preparando para a Copa, pois não deverá ficar preso por muito tempo.


Tribunal em xeque


Em minha torre sempre recebi torrentes de argumentos em favor da manutenção do Tribunal Militar do Estado (o Tribunal da Brigada Militar). Talvez por ser leigo, não me impressionaram nenhuma das proposições dos defensores daquela Corte. Agora não é este humilde marquês, mas é o presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça, o ministro Joaquim Barbosa, que arma um xeque-mate contra a existência deste tribunal que possui similares apenas em São Paulo e Minas Gerais.

VIOLÊNCIA EM DP

ZERO HORA 29 de novembro de 2012 | N° 17268

Delegado indiciado por tortura

FRANCISCO AMORIM E LETÍCIA COSTA

O titular da Delegacia da Polícia Civil de Gramado e dois agentes foram indiciados por suspeita de tortura de nove pessoas detidas durante uma operação policial no ano passado. A investigação da Corregedoria-geral da Polícia Civil (Cogepol) entregue ao Judiciário na semana passada apurou que a equipe de Gustavo Barcellos teria agredido com choques elétricos um grupo suspeito de envolvimento com o tráfico de entorpecentes.

Conforme o inquérito policial, em 25 de novembro de 2011, após uma tarde em que foram cumpridos mandados de busca em apreensão em oito locais da zona rural e urbana de Gramado, suspeitos de integrarem quadrilha de traficantes e usuários de drogas teriam sido torturados para revelarem a localização dos líderes e das drogas. Algemados, eles teriam sido pressionados a entregarem informações que contribuiriam para o sucesso da operação policial.

O caso chegou até a Corregedoria-geral da Polícia Civil (Cogepol), por meio de denúncia feita pelo advogado de uma das pessoas que teriam sido torturadas. Na ocasião em que a operação foi deflagrada, o advogado teria ido até a delegacia para falar com o cliente e teve o contato impedido pelos policiais.

Na investigação da Cogepol foram encontrados laudos médicos de duas pessoas e, em um deles, foi comprovada as marcas de choque na pele. Com depoimentos das vítimas e de policiais envolvidos no caso, o delegado Paulo Rogério Grillo entregou, na semana passada, o inquérito onde indicia o delegado e dois agentes da DP de Gramado por tortura, abuso de autoridade e prevaricação. A polícia não divulgou o nome dos outros dois policiais suspeitos.


Contraponto - O que diz o delegado Gustavo Barcellos - Essa investigação é tendenciosa. Não houve nenhum excesso na operação policial, nenhuma agressão. Acompanhei toda a ação e não ocorreu nada disso. A nossa investigação ficou tão bem feita que os cinco líderes desse bando, presos depois, continuam recolhidos devido às prisões preventivas que solicitamos ao Judiciário. Meu advogado entrou com uma representação contra o delegado da Corregedoria (Paulo Grillo) por abuso de autoridade.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Há controvérsias. Por este e outros motivos é que defendo a extinção do formato do atual inquérito policial, restando apenas o relatório da autoridade policial juntada as provas e vídeos das oitivas, evitando que as partes inquiridas venham a dizer que foram "torturadas". Outra providência é o livre acesso do MP e das defensorias na Delegacias para acompanhar interrogatórios através do vidro refletivo e garantir a lisura das ações policiais. Respeito  o contraditório, mas a forma atual e burocrata de investigação facilita o uso de artifícios como a denuncia de tortura para invalidar o depoimento na justiça.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

NOVE ANOS DE GASTOS E DESVIOS DE POLICIAIS DAS RUAS


ZERO HORA
27/11/2012 | 05h02

Nove anos de gastos

Diárias da Brigada Militar em presídios custam uma cadeia nova por ano. Pagamento do Estado aos soldados e oficiais chega a R$ 1,2 milhão por mês




Policiais atuam em força-tarefa como carcereiros no Presídio Central e na Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ)Foto: Daniel Marenco / Agencia RBS


Francisco Amorim

Era para ser temporária, durar apenas seis meses, mas a presença da Brigada Militar (BM) nos presídios se estende há 17 anos. A força-tarefa que retira das ruas 595 PMs para vigiar presos custa ao Estado R$ 1,2 milhão por mês apenas em diárias pagas aos soldados e oficiais transformados em carcereiros, o suficiente para pagar o salário de 500 agentes penitenciários.

Criada no governo Antônio Britto, a Operação Canarinho tinha como objetivo frear fugas em massa em presídios gaúchos. Naquele ano, 49 detentos haviam escapado do Presídio Central. Depois de ocupar as maiores casas prisionais, a força-tarefa foi reduzida ao Presídio Central e à Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ), em Charqueadas. Mesmo assim, os gastos com diárias têm subido ano a ano. Conforme o site Transparência do governo do Estado, entre 2004 e 2011 o custo da operação aumentou 150,8%, chegando aos R$ 14 milhões. O dinheiro sai da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe).

Para assegurar a presença dos PMs dentro das cadeias, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) permite há mais de uma década uma prática que desafia a lógica da administração pública: o recebimento de diárias por meses e até anos a fio. Alguns oficiais chegam a receber, por conta das diárias,

R$ 30 mil a mais por ano — cifra suficiente para custear a contração de um agente penitenciário. E parte desse contingente permanece na força-tarefa em Charqueadas ou Porto Alegre por mais de dois anos.

Soldados continuam lotados no Interior

Uma das possibilidades nesses casos de permanência prolongada em uma cidade seria a transferência de batalhão. Não é o que acontece. Na prática, os dados do site Transparência indicam que PMs continuam lotados no Interior mesmo ocupando cargos-chave na administração do Presídio Central nos últimos três anos. Enquanto isso, PMs da Capital são transferidos para o Complexo de Charqueadas, onde também chegam a ficar até dois anos recebendo diárias.

As diárias tornaram-se uma espécie de gratificação para aos PMs dispostos abrir e fechar celas. Os policiais permanecem ligados burocraticamente a batalhões do Interior, mas acabam se transferindo de mala e cuia para a Capital ou para Charqueadas. A prática está na mira do Ministério Público de Contas (MPC). Ao tornar permanente uma medida paliativa, os governos que sucederam Britto gastaram dezenas de milhões de reais na manutenção da operação. Só nos nove últimos anos foram empregados R$ 74 milhões, valor suficiente para erguer seis presídios para 2,4 mil detentos.

— Você deixa de contratar e formar agentes penitenciários e tira PMs das ruas — critica Luiz Fernando Rocha, vice-presidente da Associação dos Agentes Penitenciários.

Conforme o superintendente da Susepe Gelson Treiesleben, a administração dos recursos repassados aos PMs é feita pela BM. Ele ressaltou, contudo, que a ideia é retomar o controle dos presídios em 2013:

— Queremos retomar esses presídios. Para isso temos de contratar mais pessoal. E tivemos o sinal verde da Casa Civil.

A previsão é de que 1,4 mil agentes sejam contratados via concurso público no próximo ano.

Pagamentos sob análise do Ministério Público de Contas

O pagamento de diárias por longos períodos para PMs que exercem atividade fixa em presídios gaúchos está sendo analisado pelo Ministério Público de Contas (MPC).

A investigação do MPC foi provocada por uma representação encaminhada pela Associação de Oficiais da Brigada Militar, em que são relatadas supostas irregularidades na concessão de diárias.

— Há no mínimo uma questão de economicidade de se empregar PMs nessas funções a esse custo — explicou o procurador-geral do MPC, Geraldo da Caminho.

Entre os fatos a serem apurados está o de que PMs lotados em Charqueadas são empregados na força-tarefa em Porto Alegre e vice-versa, contrariando a lógica de que poderiam atuar em presídios na cidade onde estão lotados. Segundo dados do site Transparência, do governo do Estado, só neste ano, essa única movimentação de PMs custou R$ 1,3 milhão ao Estado.

Além do uso de diárias como estratégia para gratificar PMs que aceitam atuar no interior das cadeias, o MPC deve apurar o impacto que essa estratégia causa à Segurança Pública. Isso porque o número de brigadianos empregado na força-tarefa seria suficiente para policiar duas cidades de 300 mil habitantes.

A reportagem tentou contato com o secretário da Segurança Pública, Airton Michels, mas não obteve sucesso. Michels tem afirmado que pretende restituir gradualmente à Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) as duas casas prisionais hoje sob controle da Brigada Militar. Soldados e oficiais voltariam para as cidades onde estão lotados.

Procurado por Zero Hora, o comandante-geral da Brigada Militar, coronel Sérgio de Abreu, preferiu não se manifestar. Por sua orientação, a reportagem tentou contato com o Comando de Operações Especiais (COE), que coordenada a Força-Tarefa, também sem êxito.

Uma solução emergencial dura 17 anos

Em 1995, o governo do Estado decide designar PMs para a segurança externa e o serviço de carceragem de detentos nos maiores presídios gaúchos. O objetivo era conter a criminalidade interna, frear os constantes motins nas casas prisionais e suprir a carência no efetivo de agentes penitenciários. Foram cerca de 600 PMs recrutados das mais diversas regiões, que assumiram o controle de cinco casas: Presídio Central, Hospital Penitenciário, Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ), Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) e Penitenciária Estadual de Charqueadas (PEC).






domingo, 25 de novembro de 2012

POLICIAL ESTÁ ABANDONADO, MAL VISTO E MASSACRADO

Revista Consultor Jurídico, 25 de novembro de 2012


Novo rumo. De Sanctis elogia mudança de viés do Supremo


O desembargador federal Fausto Martin De Sanctis, 48, que atua no TRF-3, concedeu entrevista à Folha de S.Paulo deste domingo (25/11). Ele disse que há uma "mudança de viés" do Supremo Tribunal Federal no julgamento do mensalão. Em outubro, o desembargador falou à ConJur sobre os dilemas enfrentados pelo STF na Ação Penal 470 e enalteceu as novas abordagens da corte.

À Folha De Sanctis afirmou ainda que o tempo de tramitação do processo do mensalão, que chegará a oito anos em 2013, indica "a falência" do foro por prerrogativa de função.

Ele acaba de passar oito meses nos EUA, onde fez pesquisa sobre lavagem de dinheiro no mercado de artes e deu palestras a convite de um centro de estudos jurídicos vinculado à Suprema Corte norte-americana.

Leia a entrevista:

Folha — Qual a repercussão do julgamento do mensalão no meio jurídico dos EUA?

Fausto Martin De Sanctis — A primeira coisa que surpreende nos EUA é o tempo de julgamento. Eles consideram inaceitável um julgamento demorar sete anos, um julgamento de primeira instância, como seria nos EUA, porque lá não há foro por prerrogativa de função [para casos como os julgados no mensalão]. Sempre achei inaceitável o foro de prerrogativa porque atenta à democracia, é um julgamento privilegiado. E totalmente ineficaz. O mensalão provou que o foro é um sistema falido.

Por que o mensalão é sinal de falência do sistema?

Eles [juízes nos EUA] perguntaram: 'Por que demorou tanto?' Eu falei que o Supremo está sobrecarregado, existem 200 milhões de processos no Brasil. A corte não tem condições, não quero dizer capacidade intelectual, digo que não tem condições de fazer face a essa demanda.

Qual seria o tempo razoável?

Um ano, um ano e meio.

Mas alguns ministros disseram que o mensalão só teve a decisão em tempo recorde para os padrões brasileiros justamente porque tramitou no foro privilegiado.

É que o brasileiro se conforma com a ineficiência. Eu não quero confrontar ministros, mas um julgamento de sete anos para [equivalente a] primeiro grau é lamentável.

O ministro da Justiça disse há poucos dias que a situação das cadeias é péssima. Como se falar em penas duras num sistema como esse?

Um estudo do Banco Mundial revelou que a situação das cadeias no mundo reflete o nível econômico e social mais inferior da população. O que se poderia esperar de um país como o Brasil, em que boa parte da população sobrevive em favelas e à margem da economia formal?

E do ponto de vista do mérito, o julgamento do mensalão é um divisor de águas? Que mensagem ele manda aos corruptos?

É visível a necessidade de experiência na Justiça criminal por parte dos juízes. Deixa claro que quando a corte decide como corte de primeira instância, que é como estão fazendo, o viés muda, e acaba ratificando e compreendendo muitas decisões tomadas pelas varas especializadas.

Em que sentido mudou o viés?

Os ministros agora estão adotando um pragmatismo jurídico. [Antes] eles decidiam levando em consideração a abstração dos valores constitucionais, mas agora, atuando de forma equivalente aos juízes de primeiro grau, levam também em consideração a realidade dos fatos concretos.

Quais são os buracos da nova lei de lavagem de dinheiro?

Incluíram na lei [a previsão de] que nenhuma medida pode ser tomada depois da extinção da punibilidade do crime antecedente. Isso é um erro grave. O dinheiro obtido ilicitamente jamais pode permanecer com o criminoso, ou com os sucessores do criminoso. E a lei agora estabeleceu isso. Lavagem nada mais é do que máquina de realização de mais e mais crimes. Lavagem é a perpetuação do crime organizado.

O que ocorre hoje em São Paulo com a morte dos policiais e suspeitos, do que se trata?

A certeza da impunidade. Acho que hoje o policial brasileiro está totalmente abandonado. O policial não tem nenhuma estrutura de apoio institucional. O policial é massacrado. O policial é malvisto. E o policial não é só um policial, ele representa a sociedade. O que está acontecendo é uma guerra civil.

Por outro lado, não se abre o risco de extermínio de suspeitos? Como lidar com os excessos da polícia nesse quadro de guerra?

Quando se está em guerra, se está em guerra. Então os excessos vão existir. O que acontece no Brasil é que se fecham os olhos à guerra. Agora, não quero referendar excessos, pelo amor de Deus. Acho o seguinte: estamos tratando de guerra, e guerra tem que ter legislação de guerra. E cadê a legislação? O crime organizado está tomando conta de tudo.

O STJ considerou, em votação na turma, que as provas colhidas durante a Operação Satiagraha são ilegais. Qual sua reação, as provas são ilegais? O TRF não havia considerado válidas essas mesmas provas?

De fato, o tribunal considerou válidas. Mas eu não posso falar sobre esse fato concreto, isso ainda deverá ser objeto de apreciação pelo Supremo, em recurso.

PARA 43%, PM QUE MATA BANDIDO NÃO DEVE RECEBER PUNIÇÃO


FOLHA.COM 25/11/2012 - 07h00
 

MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO



O policial que participasse de um grupo de extermínio fora do horário de trabalho não deveria ser punido se matasse um criminoso para 43% dos paulistanos.

A revelação faz parte da pesquisa Datafolha que retrata o estado da população da capital após a onda de violência que começou em junho e se intensificou em outubro.

O percentual que defende a prisão desse policial é ligeiramente inferior em relação aos que defendem a impunidade -40%. Para 11%, ele deveria ser expulso da polícia, mas não preso.

O levantamento, feito na última quinta-feira, ouviu 1.082 paulistanos.

O medo de andar à noite nas ruas de São Paulo mais do que dobrou em cerca de três meses.

Na última quinta-feira, 61% diziam se sentir muito inseguros com caminhadas noturnas no bairro onde moram. Na pesquisa DNA Paulistano 2012, finalizada em agosto, o índice era de 26%. Em 2008, também de acordo com a pesquisa DNA, era de 20%.

Só 11% dos paulistanos afirmam se sentir muito seguros ao andar à noite. Em 2012 e 2008, esse índice era o dobro do atual (19% e 21%, respectivamente).

A zona norte de São Paulo, palco de ataques, é considerada insegura por 83% dos paulistanos -um aumento de 34 pontos percentuais em relação à pesquisa DNA 2012, concluída em agosto.

O índice é superior aos das zonas leste e sul, mais violentas do que a região norte. A leste e a sul são apontadas como inseguras por 82% e 72%.

O centro é considerado inseguro por 75%. A zona oeste, uma das áreas menos violentas da cidade, é tida como insegura por 71%.

Notícias de toques de recolher já foram ouvidas por 44% dos paulistanos. Na zona norte, esse índice chega a 54%.

A fonte da onda de violência são as facções criminosas ou bandidos, segundo 34% dos paulistanos.

Para 17%, trata-se de um acerto de contas entre criminosos e polícia. Só 5% consideram que o PCC (Primeiro Comando da Capital) dirige os ataques.

O percentual é idêntico ao dos que dizem que os homicídios decorrem de vingança de criminosos por causa da morte de membros do PCC.

Para 18%, foi o governo que motivou os ataques por desleixo ou falta de controle. Os mesmos 18% põem a culpa na falta de estrutura policial, baixos salários ou ausência de um planejamento estratégico por parte da polícia.

A corrupção policial em geral é apontada como o principal motivo dos ataques para 18% dos paulistanos.


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

DESVIO DE FUNÇÃO


ZERO HORA 22 de novembro de 2012 | N° 17261

EDITORIAIS

Faltam policiais militares nas ruas do Rio Grande do Sul, e a tropa em atividade na linha de frente se queixa há muito tempo das carências de recursos e dos baixos salários. Esta é a realidade visível da BM no Estado. Uma situação encoberta, só desvendada por reportagem publicada ontem em Zero Hora, abriga uma elite de oficiais promovidos pelo governo por prestarem serviços a outras instituições. As promoções são viabilizadas por uma artimanha política. Como estão fora de função, os militares galgam altos postos desde que, como revelam depoimentos de quem conhece essa realidade, estejam afinados com quem está no poder.

É uma prática antiga, que lamentavelmente se perpetua. Só em outubro, conforme o levantamento, eram 13 coronéis, 35 tenentes-coronéis e 12 majores em atividade em secretarias de governo, na Assembleia Legislativa, no Tribunal de Justiça e no Ministério Público. Compreende-se que oficiais da BM sejam eventualmente cedidos para que prestem serviços em outras áreas do setor público. Entende-se igualmente, como ocorre em qualquer atividade, que servidores tenham seus desempenhos e aperfeiçoamentos reconhecidos pelo sistema de promoções. Constata-se, no entanto, que os excessos ultrapassam a razoabilidade e a economicidade, como destaca o procurador do Ministério Público de Contas, Geraldo Da Camino.

A promoção de oficiais no atacado é condenável como ato administrativo. Sob o ponto de vista moral, é deplorável, por se sustentar em critérios políticos, como diz o procurador e como atesta o ex-comandante da BM Nelson Pafiadache da Rocha, que sabe do que fala. Por tentar devolver os cedidos a funções na BM, mais de uma década atrás, o oficial esbarrou nos amigos do rei, recompensados por apoios partidários, e durou pouco tempo no cargo. A suspensão da prática, num Estado com tantas carências na segurança, não é uma questão restrita a um chefe militar. É dever do alto comando civil do Estado.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

OFICIAIS EM EXCESSO E CEDIDOS

ZERO HORA ONLINE, 20/11/2012 | 19h33


BM promove oficiais em quantidade acima do permitido e os mantém longe da segurança. A manutenção desse pelotão paralelo seria uma forma de premiar oficiais alinhados politicamente a autoridades

Adriana Irion



A Brigada Militar tem um pelotão altamente qualificado e bem pago que não trabalha na linha de frente da segurança pública no Rio Grande do Sul.

O grupo de elite é formado por 60 oficiais que extrapolam o número de vagas previsto em lei e custam ao governo do Estado cerca de R$ 6 milhões por ano, levando-se em conta apenas seus salários básicos.

NO MAPA, VEJA ONDE TRABALHAM OS OFICIAIS CEDIDOS




Na Brigada Militar, esses oficiais poderiam formar o comando de sete quartéis, coordenando o trabalho de 2 mil homens. O tamanho do quadro paralelo, verificado por ZH com dados de outubro, chama a atenção: são 13 coronéis, 35 tenentes-coronéis e 12 majores, todos trabalhando fora da corporação, como em secretarias de Estado, Assembleia Legislativa e Tribunal de Justiça, e com os salários elevados por funções gratificadas (FGs).

A manutenção desse pelotão paralelo seria uma forma de premiar oficiais alinhados politicamente a autoridades. Para efetivar as promoções desejadas mesmo que não existam vagas, a BM precisa manter os servidores beneficiados fora da corporação, cedidos a outros órgãos. A sistemática não é proibida. Apesar de o efetivo da Brigada ser definido em lei, o estatuto da instituição permite a promoção de militares emprestados a outros órgãos. Assim, "amigos do rei" seriam cedidos e, promovidos.

Entidade aponta desvio de função

A situação se repete governo após governo e cria duas distorções: além de o Estado pagar um servidor não previsto nos quadros da corporação, ele não atua na função policial e passa a receber mais do que os colegas que permanecem nos quartéis. Só de coronéis e de tenentes-coronéis, que, na Brigada, são responsáveis por planejar a segurança pública e representam os maiores salários, há 48 acima do número de vagas autorizadas por lei.

— As cedências de oficiais superiores a outros poderes, que fazem extrapolar o quadro efetivo da Brigada Militar, são previstas em lei. Na quantidade em que isso vem ocorrendo, entretanto, é de se refletir acerca da observância de princípios da administração pública, como os da razoabilidade e da economicidade — avalia Geraldo da Camino, procurador-geral do Ministério Público de Contas.

Da Camino recebeu da Associação dos Oficiais da BM (Asof) pedido de apuração sobre o total de PMs cedidos e o custo deste efetivo. Segundo a BM, há atualmente em torno de 490 PMs (incluindo os 60 oficiais excedentes) fora da corporação.

— Todo pessoal que está fora onera os cofres do Estado, enquanto falta na BM. Coronel é muito caro para estar fora. Isso é desvio absoluto de função. E as promoções de quem está fora da BM são um artifício para beneficiar os amigos do rei. Se disserem que isso sempre foi assim, está na hora de um governo que falava dos demais começar a agir — diz José Riccardi Guimarães, presidente da Asof.

Piratini e Brigada defendem promoções

O Palácio Piratini e o comando-geral da Brigada Militar avaliam como "normal" o fato de oficiais serem promovidos acima do número de vagas previsto em lei e não consideram que exista excesso de policiais militares prestando serviços a outros órgãos.

— Podemos nomear (promover) os que estão agregados, prestando serviço em outros órgãos, o que é permitido pela lei e pela Constituição. Não temos excesso de oficiais, temos é falta de efetivo e estamos complementando isso agora — garante o governador Tarso Genro.

O chefe do Executivo também afasta a suspeita de que esse sistema possa servir para beneficiar oficiais apadrinhados politicamente:

— Não sei se foi regra nos governos anteriores, no meu não é. No meu, fazemos promoções conscienciosas.

O comandante-geral da BM, coronel Sérgio Roberto de Abreu, ressalta que a promoção do oficial cedido é um direito dele. Sobre o custo do quadro paralelo aos cofres públicos, ele discorda que possa ser visto como dinheiro mal aplicado:

— Onde estão (os oficiais cedidos e promovidos acima das vagas), eles exercem funções que contribuem para a questão da segurança. Uma visão muito limitada entende que segurança é o brigadiano na esquina. É preciso ter o brigadiano na rua, fazendo a prevenção, atendendo o 190. Mas, para funcionar tudo isso, é preciso uma grande capacidade de relacionamento, porque a segurança envolve interligação de uma rede de instituições do governo, de órgãos.

Ele nega que as promoções acima das vagas prejudiquem o contribuinte:

— O contribuinte paga este oficial, mas poderia estar pagando outro técnico. É uma função técnica superior. O contribuinte pagaria outra pessoa para exercer aquela mesma função.


ENTREVISTA

Nelson Pafiadache da Rocha. Ex-comandante da Brigada Militar

"Sempre há um político escudando os atos"

Oito anos depois de deixar o comando da BM, o coronel Nelson Pafiadache da Rocha, 58 anos, segue defendendo ideias que causaram polêmica durante sua gestão, entre janeiro de 2003 e junho de 2004. Pafiadache é crítico contundente do excesso de PMs cedidos e defende uma revisão do sistema que permite promoções acima do limite de vagas. Abaixo, confira trechos da entrevista.

Zero Hora — Sempre existiu na BM essa situação de oficiais promovidos acima do limite previsto na legislação?

Nelson Pafiadache — São situações cíclicas, dependem de orientação governamental. A BM nunca teve um excedente deste tamanho. É um marco histórico que deixará dor de cabeça para o próximo governador, se ele quiser oxigenar essa relação que mesmo tendo aparência de ser legal, padece de respaldo no plano moral. É legal, mas não é moral.

ZH — São decisões de governo?

Pafiadache — O governador é culpado, ele sempre está informado dessas aberrações. É o governador que assina os atos. Sempre tem o governante, um político, escudando os atos. A Brigada não quer isso. Quer que os PMs estejam na tropa. O sonho de qualquer comandante é trazer todo esse pessoal cedido de volta para a Brigada.

ZH — Era o seu sonho?

Pafiadache — Por isso, fiquei só um ano e quatro meses no comando.

ZH — O embate pela volta dos cedidos ajudou a tirar o senhor do comando?

Pafiadache — Dentre as causas que ajudaram, está a minha insistência junto aos chefes de poderes para que alguns servidores retornassem à tropa, para produzir um revezamento salutar e cumprir o rito da carreira. Existia uma confraria dos que estavam fora. Eles queriam ser promovidos na frente dos outros. Fui burro porque enfrentei.

ZH — Os comandantes não têm força para trazer os cedidos de volta?

Pafiadache — Não. A pressão e as recompensas políticas aos colaboradores impedem que se reduza essa prática de cedências.

ZH — O atual número excedente de coronéis e de tenentes-coronéis é normal?

Pafiadache — Não. É muito alto o número, principalmente de coronéis. Tem um terço de coronéis fora da corporação. Temos que combater as cedências e também essas promoções feitas sem necessidade.

ZH — Que tipo de demanda uma secretaria, que não seja a de Segurança Pública, tem para justificar ter oficiais a sua disposição?

Pafiadache — Quer a verdade? É porque a pessoa (o PM) fez a campanha, na região, para o deputado que virou secretário, e aí ganha uma vaga na secretaria para ganhar mais (do que ganha na BM). Só que o comandante não tem força para dizer isso.

ZH — Que prejuízos isso traz à tropa?

Pafiadache — Tem gente fazendo carreira fora, sai da BM como tenente e já é tenente-coronel, sempre promovido fora da Brigada e ganhando três vezes mais do que os colegas que estão na tropa. Isso causa desânimo. Como motivar um PM para servir num quartel desgraçado, sem recursos? Essas situações também ferem o princípio da impessoalidade. Se tem vaga para um militar num órgão, por que é a mesma pessoa que fica lá por cinco, 10 anos? Isso caracteriza um ato administrativo impregnado de pessoalidade.

ZH — Há oficiais em secretarias, em bancadas de partidos.

Pafiadache — Isso sai caro e é desvio de finalidade. Só que soldado também faz falta na rua. Não tem de ter oficial nem soldado cedido. Os outros órgãos que aumentem seus servidores. Por que nós temos que ir para lá? Deputado não tem de ter brigadiano na volta. Os PMs fazem nesses locais o que um civil faria: mandam cartas, atendem demandas da região, dirigem para os deputados, fazem de tudo. Quantos soldados faltam na BM? Mas temos excesso de oficiais. Tem comandante sem comandado. É por isso que o governador tem de colocar a BM em forma.


ONDE TRABALHAM E QUANTO GANHAM

http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/infografico/onde-trabalham-oficiais-da-bm-cedidos-47341.html

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

LEI DA IMPUNIDADE: AUTORIDADE POLICIAL E FIANÇA

 
Revista Consultor Jurídico, 30 de junho de 2011

Preço da liberdade


A Lei 12.403, a autoridade policial e a fiança

Por Abrahão José Kfouri Filho



Como é do conhecimento geral, com a recente edição da Lei 12.403, de 2011, que alterou o Código de Processo Penal, o artigo 322, que trata da fiança e que até então atribuía à autoridade policial competência para conceder e arbitrar fiança nos crimes apenados com detenção (independente da pena máxima), a partir da vigência da nova regra (4.7.2011), ela "somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 anos".

A teor do que dispõe o artigo 7º, da Lei 8.137/90, em cujos incisos II e IX são, em regra, autuados em flagrante, gerentes e funcionários dos supermercados, mercearias, padarias e similares, a pena máxima, embora de 5 anos, é de detenção, o que vem permitindo a concessão de fiança por parte da autoridade policial.

Em face do novo regramento, a partir da data apontada, esses presos passarão, perversamente, a ser recolhidos à cadeia, até que se consiga a concessão de fiança pelo juiz, o que poderá demandar dia ou dias até que o preso seja liberado.

Atente-se que, na absoluta maioria dos casos, o evento ensejador da prisão decorre de culpa (negligência), cuja modalidade é expressamente prevista no parágrafo único do artigo 7º da Lei 8.137/90, com significativo abrandamento da pena. As denúncias, na espécie, oferecidas pelo Parquet, ou já descrevem conduta culposa ou mesmo citam expressamente o parágrafo único.

O legislador, com certeza, não atinou para esse detalhe e criou um verdadeiro contrassenso, pois, ao alargar a competência da autoridade policial para poder afiançar crimes apenados até com reclusão, aliviando a população carcerária, deixou de fora crimes apenados com detenção, como esses, contra as relações de consumo, até então afiançados pela autoridade policial. Pela nova regra, passarão a ser afiançados os crimes de quadrilha ou bando; autoaborto; lesão corporal dolosa, ainda que grave; maus tratos; furto; fraude; receptação; abandono de incapaz; emprego irregular de verbas públicas; resistência; desobediência; desacato; falso testemunho e falsa perícia; todos os crimes contra as finanças públicas; nove dos dez crimes de fraudes em licitações (o remanescente tentado), contrabando ou descaminho, entre outros.

Se a intenção foi, como consta ter sido, aliviar a população carcerária deixando de recolher à prisão pessoas que não apresentam periculosidade, houve aí um retrocesso, que está a ensejar providencial reparo. Ousa-se afirmar que, in casu, houve um autêntico desvio de finalidade da lei, que a fez desbordar para o irrazoável e para o desproporcional.

Vem do consagrado magistério do ministro Celso de Mello, do E. Supremo Tribunal Federal, a oportuna lição a respeito de “norma destituída do necessário coeficiente de razoabilidade” (Acórdão lavrado na Méd.Caut. em ADIn nº 2.667-4/DF –v.u., Pleno, 19.6.2002):

“ As normas legais devem observar, no processo de sua formulação, critérios de razoabilidade que guardem estrita consonância com os padrões fundados no princípio da proporcionalidade, pois todos os atos emanados do Poder Público devem ajustar-se á cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do ‘substantive due process of law’. Lei distrital que, no caso, não observa padrões mínimos de razoabilidade.”

“ A exigência de razoabilidade – que visa a inibir e a neutralizar eventuais abusos do Poder Público, notadamente no desempenho de suas funções normativas – atua, enquanto categoria fundamental de limitação dos excessos emanados do Estado, como verdadeiro parâmetro de aferição da constitucionalidade material dos atos estatais.”

“ A teoria do desvio de poder, quando aplicada ao plano das atividades legislativas, permite que se contenham eventuais excessos decorrentes do exercício imoderado e arbitrário da competência institucional outorgada ao Poder Público, pois o Estado não pode, no desempenho de suas atribuições, dar causa à instauração de situações normativas que comprometam e afetem os fins que regem a prática da função de legislar”.

Posto isso, o que, respeitosamente, se sugere é que, por prestigioso intermédio da Ordem dos Advogados do Brasil, eleve-se ao Exmo. Sr. Ministro da Justiça, proposta de urgente alteração do artigo 322 do CPP para que passe a viger com a seguinte redação:

“Art. 322 – A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração apenada com:
I – detenção;
II – reclusão, desde que a pena máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.

Nesse ínterim, enquanto não sobrevenha a solução legislativa acima alvitrada, máxime para evitar-se o desnecessário encarceramento de empregados que trabalham na área de supermercados, mercearias, padarias e similares – pessoas primárias, destituídas de qualquer periculosidade – que se debrucem sobre a questão magistrados, promotores, advogados e autoridades policiais no sentido de que seja reconhecida em favor destas últimas, quando presidirem autos de prisão em flagrante lavrados com base nos dispositivos retro citados (art. 7º, da Lei nº 8.137/90, incisos II e IX, c/c parágrafo único), a competência para que continuem arbitrando fiança em favor desses autuados.

Para tanto, aduzimos ainda os seguintes argumentos:

A) A pena prevista para tais condutas é de detenção de 2 a 5 anos ou multa, cuja natureza, meramente pecuniária, jamais justificaria um encarceramento, ainda que breve, mas não menos perverso.

Se, como veremos a seguir, a previsão (ainda que alternativa) de multa como pena única, autoriza em favor do réu (como medida de desburocratização da Justiça) a suspensão condicional do processo, com maior razão (justamente como medida de política criminal que inspirou a alteração da norma processual penal), poderá a culta autoridade policial (como hoje faz), mediante despacho fundamentado, continuar arbitrando fiança nos casos da espécie, evitando encarcerar quem não precisa ser encarcerado, tal como preconizado e destacado nos trechos jurisprudenciais e doutrinários abaixo.

Bem a propósito da importância jurídica que decorre da destacada alternatividade de pena prevista no dispositivo citado, traz-se a lume, como relevante argumento de analogia, a oportuna e pertinente lição que vem do E. Supremo Tribunal Federal, extraída do v. acórdão lavrado no HC nº 83926-6, da relatoria do eminente ministro Cezar Peluso, hoje o presidente da Corte, verbis:

“Ementa — AÇÃO PENAL — Crime contra relações de consumo. Pena. Previsão alternativa de multa. Suspensão condicional do processo. Admissibilidade. Recusa de proposta pelo Ministério Público. Constrangimento ilegal caracterizado. HC concedido para que o MP examine os demais requisitos da medida. Interpretação do art. 89 da Lei nº 9.099/95. Quando para o crime seja prevista, alternativamente, pena de multa, que é menos gravosa do que qualquer pena privativa de liberdade ou restritiva de direito, tem-se por satisfeito um dos requisitos legais para a suspensão condicional do processo.”.

Do corpo do v. aresto, pinça-se o incisivo pronunciamento favorável da Procuradoria-Geral da República:

“Com efeito, para os delitos do art. 7º da Lei 8.137/90 são cominadas penas de detenção, de 2 a 5 anos, ou de multa. Tais as circunstâncias, bem demonstra a esmerada petição que, para fins de aplicação do art. 89 da Lei 9.099/95, a pena mínima a ser considerada é a de multa que, em tese, pode ser a única a ser aplicada.”

Segue-se a conclusão do eminente Relator:

“Não discuto a desproporcionalidade entre as penas cominadas e as condutas previstas no artigo 7º da Lei nº 8.137/90.

O fato é que, contemplada, de forma alternativa, a aplicação exclusiva da pena de multa, abre-se ao acusado a possibilidade de suspensão condicional do processo. É, aliás, o que sustentam os idealizadores da lei: [1]” .

B) O enquadramento da conduta na modalidade culposa impõe uma redução de 1/3 (um terço) na pena, fato que – ab initio - fixa a própria pena máxima (na prática, aliás, nunca aplicada), em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de detenção, ou seja, em limite aquém do máximo previsto na lei nova para concessão de fiança pela autoridade policial, o que, por si só, vale como argumento autônomo e suficiente para fundamentar e legitimar a decisão da autoridade policial.

C) A lei nova, sem dúvida, ao alargar a atribuição da autoridade policial para conceder fiança também em alguns crimes apenados com reclusão, emprestou maior e merecido prestígio a essa importante figura que preside aos atos de polícia judiciária. Nesse diapasão, soaria insólito se esse “alargamento” fosse, de forma contraditória, coarctado pela supressão de parcela de poder que antes já detinha, tudo a indicar, realmente, como escrito no início, que o legislador, com certeza, não atinou para esse detalhe e criou um verdadeiro contrassenso.

Outros elementos poderiam ser aqui eleitos para um justo e perfeito deslinde da questão. Ouso acreditar, entretanto, que os argumentos aqui expendidos a título de colaboração, já se fazem suficientes para que, no exercício do poder discricionário que constitucionalmente o delegado de Polícia detém e enquanto integrante das carreiras jurídicas do Estado, acaso se convença da justiça e do cabimento da medida, arbitre e conceda fiança a quem vier a ser autuado nas situações fáticas de início apontadas.

[1] “Nas hipóteses em que penas diversas vêm cominadas alternativamente (prisão mínima acima de um ano ou multa, ad exemplum, arts. 4º, 5º e 7º da Lei 8.137/90), nos parece muito evidente o cabimento da suspensão do processo pela seguinte razão: a pena mínima cominada é a de multa. Se a lei (art. 89) autoriza a suspensão condicional do processo em caso de pena privativa de liberdade mínima até um ano, a fortiori, conclui-se que, quando a pena mínima cominada é a multa, também cabe tal instituto. Pouco importa que a multa seja, no caso, alternativa. Se o legislador previu tal pena como alternativa possível é porque, no seu entender, o delito não é daqueles que necessariamente devam ser punidos com pena de prisão. Se, para os efeitos de prevenção geral, contentou-se a lei, em nível de cominação abstrata, com a multa alternativa, é porque, conforme seu entendimento, não se trata de delito de alta reprovabilidade. Sendo assim, entra no amplo espectro da sua nova política criminal de priorizar a ressocialização do infrator por outras vias que não a prisional. Na essência da suspensão condicional, ademais, outros interesses estão presentes: reparação da vítima, desburocratização da Justiça etc. Para os crimes de média gravidade (e dentro desse conceito entram evidentemente os delitos punidos em abstrato com pena – alternativa – de prisão ou multa) a resposta estatal adequada é a de que acaba de ser descrita.” – GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antônio Magalhães; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES, Luiz Flávio. Juizados Especiais Criminais. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 255-256. (grifei e realcei).

Abrahão José Kfouri Filho é advogado e professor de Direito Administrativo. Foi Delegado de Polícia até 1991.

LEI DA IMPUNIDADE: PRISÃO E MEDIDAS CAUTELARES

2012/02/25


Apontamentos Sobre A Lei Nº 12.403 de 2011 – Prisão e Medidas Cautelares
 
Paulo Sergio Markowicz De Lima, Promotor de Justiça


Com as alterações do Código de Processo Penal, trazidas pela Lei 2403 / 11, com vigência a partir de 4 de julho de 2011, acentua-se ainda mais que a prisão é medida de exceção. Já era assim bem antes da nova lei, pois a Constituição da República garante a presunção de inocência a todo cidadão, decorrendo daí a excepcionalidade do cárcere cautelar, que é sempre provisório, ao contrário da liberdade, que é a regra. Com as novas medidas cautelares, a prisão cautelar somente se justificará quando demonstrado na decisão judicial a inaplicabilidade de tais medidas. Em suma, com os novos preceitos o legislador denota claramente a intenção de acentuar a prisão provisória como última medida. Observa-se isso também ao se prever que o juiz, ao receber o auto de prisão em flagrante, deverá convertê-lo fundamentadamente em prisão preventiva, se cabível. No regime anterior à vigência da Lei 12403 / 11, inexistente ilegalidade do flagrante, o juiz não decretava a prisão preventiva e expressava a existência dos seus pressupostos e requisitos apenas quando analisava pedido de liberdade provisória proposto pelo autuado ou pelo Ministério Público. Além disso, nas novas regras privilegia-se a aplicação da fiança, ampliando-se as hipóteses de cabimento. Sem contar que a prisão preventiva, como primeira regra, somente pode ser decretada aos crimes dolosos com penas superiores a 4 anos. O legislador guiou-se pelo princípio da proporcionalidade, pois se a lei permite a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direito em caso de condenação até 4 anos (art. 41, I, do CP), como primeiro requisito objetivo, não se justificaria a custódia cautelar para crimes com penas inferiores a tal patamar.

Saliente-se que, de posse do flagrante, o juiz também terá que fundamentar a aplicação, isolada ou cumulativa, de medidas cautelares diversas da prisão, bem como deverá conceder liberdade provisória cabível, mesmo sem pedido do autuado, o que é mais uma novidade da lei. Persiste o direito do autuado em ter sua liberdade provisória concedida de ofício pelo juízo, quando praticou o fato com a incidência de causa excludente da ilicitude, por exemplo, legítima defesa, persistindo, no entanto, sua obrigação de comparecer a todos os atos do processo, é a denominada liberdade provisória vinculada.

As medidas cautelares diversas da prisão, inclusive a fiança, não dependem do flagrante para o juiz decretá-las, podendo fazê-lo mediante requerimento durante a investigação criminal e no transcorrer da ação penal, inclusive de ofício, desde que presentes os seus requisitos.

São medidas cautelares diversas da prisão o comparecimento

periódico em juízo, suspensão do exercício de função pública, recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga, monitoração eletrônica, etc.

As cautelares diversas da prisão para serem aplicáveis, devem ser:

a) necessárias para garantir a aplicação da lei penal ou para efetivação da investigação criminal;

b) prestarem-se a evitar a prática de infrações penais;

c) impostas devido à gravidade do crime, suas circunstâncias e em virtude das condições pessoais do indiciado ou acusado. Quanto a este último ponto deve-se fazer um juízo de necessidade e adequabilidade da medida. Saliente-se que a lei explicita que as cautelares são somente decretáveis quando cominada pena de prisão ao fato praticado. Numa expedita análise, o tempo de cumprimento de medidas cautelares mais gravosas, como cumulação de monitoração eletrônica com recolhimento domiciliar, deverá ser descontado da pena fixada na sentença condenatória, em sede de juízo de execução da reprimenda, ante a maior restrição da liberdade do acusado. Também numa consideração de primeira ordem, o recurso cabível contra a decisão que defere ou denega medida cautelar seria o recurso em sentido estrito, ante o legislador tratar da fiança e prisão no inciso V, do art. 581, do CPP, cautelares de mesma classe das novas medidas.

Observa-se que algumas inovações trazidas pela Lei 12403 / 11 no tocante às medidas cautelares encontrarão empecilhos na sua aplicação prática. A implantação da monitoração eletrônica, por exemplo, necessitará ajustes técnicos, levando-se em conta a experiência com as tornozeleiras usadas por condenados beneficiados com saídas temporárias, em São Paulo. A medida de recolhimento noturno e nos dias de folga do autor do fato, com as disponibilidades atuais de fiscalização, seria impraticável, vislumbrando-se uma efetividade numa eventual cumulação com monitoração eletrônica imune a panes.

Outra novidade da lei é que requerida a medida cautelar diversa da prisão, o indiciado ou acusado terá oportunidade de se manifestar contrariamente, instalando-se contraditório. A ressalva feita pela lei é que se há urgência ou perigo de ineficácia da medida, dispensa-se a intimação do requerido. Como a lei possibilita a substituição pelo juízo da medida cautelar diversa da prisão não cumprida ou cumulação com outra, entendemos que vale o mesmo raciocínio, qual seja, de ouvir antecipadamente o acusado ou autuado, mesmo porque pode existir uma justa razão para o descumprimento. Entretanto, se houver motivos para a decretação da prisão preventiva, em caráter autônomo ou por descumprimento da cautelar, por evidente, o contraditório não se instalará sob pena de ineficácia da medida.

Algo que será muito debatido na doutrina é a não aplicação das medidas cautelares diversas da prisão aos crimes de menor potencial ofensivo. Para ser imposta uma medida cautelar só se exige inicialmente que ao crime de menor potencial ofensivo seja prevista pena privativa de liberdade, na estrita redação do art. 321, do CPP. O parágrafo único do art. 69, da Lei nº 9.099/95, que trata dos Juizados Especiais, prevê apenas o não cabimento da fiança. Indispensável um juízo de adequabilidade e de necessidade na hipótese, não se justificando, a priori, a aplicação de medidas mais gravosas, como recolhimento domiciliar noturno e nos dias de folga do autor do fato, nem a monitoração eletrônica. Deve ser afastada também a possibilidade de decretação da prisão preventiva ante medida descumprida, pois se estaria pervertendo o limite objetivo de 4 anos para caber o decreto da prisão provisória, sendo uma opção válida para o juízo cumular outra medida com a cautelar descumprida. Se a apresentação do autor do fato perante o juizado não é imediata, não vemos como afastado o aspecto conciliatório de tal jurisdição, muito pelo contrário, no caso de aplicação fundamentada de medida cautelar que impõe ao autor do fato, por hipótese, permanecer distante do ofendido. Por fim, homologada a transação penal ou operada a suspensão condicional do processo, por óbvio, inadmissível a manutenção de cautelar diversa da prisão.

Alerte-se que a Lei 12403 / 11 não alterou os pressupostos requisitos para a decretação da prisão preventiva, que pela nova sistemática será decretada em caráter autônomo, por conversão da prisão em flagrante e subsidiariamente, em caso de descumprimento de cautelar diversa da prisão.

Revogou-se o inciso IV, do art. 312, do CPP, que previa a Possibilidade de decretação de prisão preventiva por descumprimento de medida protetiva de urgência nos casos de violência doméstica contra a mulher, no termos da Lei nº 11.340/06, denominada Lei Maria da Penha.

Entretanto, a matéria do inciso revogado foi tratada no inciso III, do novo art. 313 do CPP e teve seu alcance ampliado, pois torna possível a decretação da prisão preventiva desde que a violência doméstica ou familiar seja perpetrada contra mulher e o crime envolva criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência. Sob pena de perda de efetividade, trata-se de exceção à regra que somente nos crimes dolosos punidos com penas superiores a 4 anos é possível a decretação da preventiva, pois há crimes compreendidos na previsão legal com penas muito aquém do referido limite máximo. A prisão preventiva poderá ser também decretada diante de dúvida sobre a identidade do autor do fato – que deve ser revogada quando superado o impasse – e caberá quando houver condenação do acusado ou indiciado por outro crime doloso, com configuração da reincidência.

Nas três hipóteses antes citadas, não se prescinde da presença dos pressupostos e requisitos da prisão preventiva do art. 312, do CPP. Assim, com as novas regras o juiz só poderá decretar a prisão preventiva em caráter autônomo:

a) diante da presença de seus pressupostos e requisitos;

b) se o autor do fato não o praticou sob a égide de uma excludente da ilicitude;

c) acaso as medidas cautelares, mesmo aplicadas cumulativamente, revelarem-se ineficazes ou inadequadas.

Lembre-se que vigente uma ou mais medidas cautelares diversas da prisão, cabe o decreto da prisão preventiva ante o descumprimento pelo acusado ou indiciado. Temos que o descumprimento injustificado da cautelar, conjugado com a presença de indícios suficientes de autoria e materialidade do crime, já autoriza a decretação da prisão em caráter subsidiário, pois para que uma medida seja imposta exigem-se requisitos semelhantes aos da prisão preventiva, pois elas devem ser necessárias para garantir a aplicação da lei penal e para resguardar a idoneidade da investigação e da instrução criminal.

As regras da prisão temporária não foram alteradas pela Lei 12403 / 11. Entretanto, no curso da investigação, a pedido do Ministério Público ou da autoridade policial – o juiz nesta fase não pode decretá-las de ofício, privilegiando-se o sistema acusatório -, podem caber medidas cautelares, desde que eficazes na prática e restritas a delitos de menor gravidade elencados na lei respectiva, sem se recorrer à prisão temporária, como por hipótese, a medida do art. 319, III, da proibição de manter contato com pessoa determinada, quando devido às circunstâncias do fato praticado, deva o indiciado permanecer distante da vítima ou testemunha.

A Lei 12403 / 11 também trata da prisão domiciliar, que não é substituta genérica da prisão preventiva e aplica-se apenas diante de condições pessoais do autor do fato, pontadas em lei e devidamente comprovadas, como exemplo, ser ele portador de doença grave que cause debilidade extrema. Desnecessário comentar as dificuldades atuais de fiscalização de tal modalidade de cárcere cautelar.

Quanto à fiança, afora o delegado poder arbitrá-la nos crimes punidos com até 4 anos de prisão, é igualmente uma medida cautelar diversa do cárcere provisório e ressalvada as exceções delineadas na Constituição Federal e repetidas em dispositivos da nova lei – incabível em caso de tortura e racismo, entre outros -, passa a ter espectro amplo de incidência.

Por oportuno, se o crime é suscetível de fiança, ante a precária situação econômica do autuado, o juiz poderá conceder liberdade provisória sem fiança, sem prejuízo de aplicação de uma ou mais medidas cautelares diversas da prisão.

A determinação judicial de entrega do passaporte pelo indiciado ou acusado está prevista no novo art. 320, do CPP, que prevê a apresentação do documento em juízo no prazo máximo de 24 horas após a intimação, bem como a comunicação do juízo às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional. Trata-se também de uma medida de feição cautelar, embora não arrolada nos incisos do alterado art. 319, do CPP, submetendo-se, portanto, ao preenchimento dos mesmos requisitos exigidos para as outras medidas diversas da prisão.

A nova lei preceitua que o mandado de prisão será registrado num sistema nacional a cargo do Conselho Nacional de Justiça, o que permitirá o cumprimento do mandado registrado noutro estado da federação por qualquer agente policial. É uma inovação muito importante, pois previne entraves burocráticos e traz maior probabilidade de êxito no cumprimento de mandados de prisão fora do limite territorial do juízo que a decretou.

A novel lei revogou o artigo 319 do CPP que tratava da prisão administrativa, o dispositivo que previa a deserção da apelação em caso de fuga do acusado, bem como extraiu texto final do art. 439 da lei processual, que estatuía o direito do jurado à prisão especial. No entanto, não foi revogado expressamente o inciso X, do art. 295, do CPP que confere ao jurado o direito à prisão especial. Reconhecemos a tendência atual de restrição da tal modalidade de prisão, que em alguns casos corporifica-se como um contestável favor legal. Entretanto, nem deve ser cogitada a extinção deste direito do jurado, que é tanto juiz quanto o magistrado togado e está suscetível a eventuais represálias.

Só com a aplicação da lei se poderá dizer se a ampliação dos casos de fiança será benéfica, se a prisão preventiva será último recurso e se resumirá a casos pontuais. Diga-se o mesmo quanto às medidas cautelares, se substituirão com eficácia a prisão preventiva. A dificuldade de fiscalização das novas medidas, seja por falta de aparato pessoal do Estado, seja pelas próprias dificuldades técnicas de instrumentos de controle, como a monitoração eletrônica, ainda ensejarão a decretação da prisão preventiva, pois como a própria lei diz, o cárcere cautelar é medida cabível diante da ineficácia das cautelares diversas da prisão.

A Lei 12403 / 11 trouxe avanços, sem dúvida, principalmente no aspecto de se evitar prática de nova infração penal pelo autor do fato, bem como garantir a aplicação da lei penal, sem se recorrer à prisão preventiva.

No entanto, mostra-se urgente que o Estado envide esforços para tornar eficazes as medidas cautelares diversas da prisão, com maior dedicação, por óbvio, da que lida com a interrupção de sinal de celulares nos presídios.

Aliás, em matéria de combate ao crime organizado, parece-nos claro que mesmo com a cumulação de medidas diversas da prisão, a princípio, elas serão ineficazes, cabendo à decretação da prisão preventiva pela harmonização entre normas constitucionais de resguardo de garantias e direitos individuais com as de salvaguarda da ordem pública.













Autor: Doutor Paulo Sergio Markowicz De Lima, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Paraná e do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais, do Júri e de Execuções Penais.

FONTE: http://www.policial-militar.net/lei-12403-apontamentos-prisao-medidas-cautelares/#ixzz2CgvzdVw9

BRAÇO POLICIAL DOS BICHEIROS


ZERO HORA ESPECIAL 19 de novembro de 2012 | N° 17258

JOGO DO BICHO

PARA QUE A RODA DE APOSTAS SIGA GIRANDO, É NECESSÁRIO QUE OS HOMENS DA LEI FECHEM OS OLHOS PARA A CONTRAVENÇÃO. É O QUE REVELA A REPORTAGEM DE HOJE DA SÉRIE QUE MOSTRA COMO O JOGO ILEGAL PROSPERA NO ESTADO



Banqueiros do jogo do bicho são os maiores corruptores de policiais no Rio Grande do Sul. Compram informações em DPs, recrutam PMs em quartéis para executar desafetos, associam-se com investigadores fora da lei, manipulam inquéritos, transformam oficiais em capangas privados.

Nos últimos anos, dezenas de policiais civis e militares foram indiciados pelas respectivas corregedorias por envolvimento com jogatina. Na Polícia Civil, a maior parte dos cem inquéritos em andamento diz respeito à corrupção policial – envolvimento com a contravenção, com o tráfico de drogas e com o roubo e o furto de veículos. No Rio, onde o bicho nasceu 120 anos atrás e se consolidou como um poder paralelo, a força de sedução dos bicheiros corrói corporações, enfraquece o moral de batalhões, abala a credibilidade de delegacias.

– É o único crime que realmente é organizado no Brasil. Praticamente todos os bicheiros fazem a descarga (espécie de seguro de apostas altas) com contraventores do Rio. Quando eu era chefe de Polícia, 90% da polícia mordia (cobrava propina). Não há jogo sem envolvimento da polícia – diz Hélio Luz, chefe de Polícia no Rio entre 1995 e 1997 e o primeiro delegado a denunciar a “banda podre”.

ZH constatou como a contravenção se beneficia da parceria informal de policiais. Imaginando conversar com um fora da lei, o apontador do jogo do bicho José Fraga, 50 anos, travou o seguinte diálogo com a reportagem:

REPÓRTER Se der algum problema com o bicheiro responsável, quem cobre uma aposta alta?

APONTADOR Aqui não tem problema. A gente tem um grupo.

REPÓRTER Que grupo?

APONTADOR Estamos em todo o Litoral: Tramandaí, Osório, Santo Antônio, Torres, Terra de Areia. É tudo um grupo nosso, entendeu? Vem tudo para este homem aqui.

REPÓRTER Para quem?

APONTADOR Para o seu Mateus.

REPÓRTER O velho?

APONTADOR O velho Mateus.

REPÓRTER E os policiais não incomodam?

APONTADOR Não. No nosso grupo não tem perigo.

REPÓRTER Quanto os maquineiros estão pagando para a polícia?

APONTADOR R$ 150 por loja.

REPÓRTER Mas dá dinheiro.

APONTADOR Claro que dá. Abre uma loja (com máquinas caça-níqueis) hoje e, em 40 dias, dá para tirar o investimento e investir em outra.

O que o incauto revelou ao repórter, a Corregedoria da Polícia Civil havia detectado, quatro anos atrás: Mateus Josué Sassi, 69 anos, um dos principais bicheiros do Litoral Norte, pagava “salários” mensais para escrivães e investigadores não o molestarem.

Pelas palavras de Seu Zé, como Fraga é conhecido, a parceria com policiais não se encerrou após a investigação da Cogepol, cujo resultado é o processo que tramita na Vara Criminal de Capão da Canoa sob o número 141/2.08.0006216-4. Pela apuração, os policiais Fabio Vivaldino dos Santos Lopes, 42 anos (Capão da Canoa), Gerson Luís da Silva Santos, 50 anos (Tramandaí), Edmilson Luís de Lima, 46 anos (Arroio do Sal), Silvio Roberto da Silva, 55 anos, Telvino Araújo Monti, 53 anos (ambos de Xangri-lá) e Alexandre José Falkenbach (Cidreira), recebiam mensalmente do grupo liderado por Mateus entre R$ 500 e R$ 1,5 mil. Hoje, quatro estão afastados e dois se aposentaram.

Conforme denúncia à Justiça, agentes da lei e contraventores eram explícitos ao telefone. Em uma conversa, o investigador Gerson alerta o contraventor Dejalmo sobre uma blitz:

– Sabes aquela tua lancheria antiga, que era do Baixinho?... Parece que vão bater lá hoje...

Na época lotado em Capão da Canoa, Fábio Vivaldino é outro enredado pelos grampos. Para conversar com Mateus, ele usava um aparelho celular com prefixo de outro Estado, trancava o nariz e fazia voz de pato ao telefone.

– Virou motivo de piada na corregedoria – confidencia o corregedor da Polícia Civil Paulo Grillo.

Em abril de 2008, um dos contraventores reclamou ao telefone:

“Eu vou tirar as máquinas e não molho mais as mãos de ninguém. Tenho nojo de lidar com esses ratos.”

Recentemente, chefes de investigação de metade das delegacias distritais de Porto Alegre foram condenados por cobrar propina de bicheiros.


PROTEÇÃO PARA O JOGO EM DELEGACIA DE GRAVATAÍ

Um homem temido pelos colegas de corporação. Assim pode ser descrito Miguel de Oliveira, o Peixe, 65 anos, ex-chefe da investigações da 2ª DP de Gravataí. Indiciado em oito inquéritos que resultaram em sete processos, Miguel está condenado a 104 anos de prisão. O principal deles, por proteger o bicheiro Jorge Ivan Fontela Liscano, o Mão Branca, de quem é compadre e amigo há três décadas. Miguel permanece em liberdade, aguardando o desfecho de recursos na Justiça.

No ano passado, enquanto esteve preso na sede do Grupo de Operações Especiais (GOE), Miguel negou a ZH envolvimento com crimes.

Entre os crimes atribuídos a Miguel, que ingressou na polícia em 1974, um está ligado à contravenção. Em 2007, quando traficantes eram investigados pela venda de drogas nas imediações da Escola Antônio José de Alencastro, em Gravataí, grampos telefônicos trouxeram à tona a relação de Miguel com o bicheiro.

– A ligação dele com o Mão Branca era o seu maior orgulho. Sempre dizia: este aí é gente da gente. Ninguém toca – comenta um ex-colega.

Além de informar Mão Branca sobre as batidas policiais, Miguel usava seu distintivo para fechar as casas dos concorrentes do bicheiro. E também para intimidar as pessoas que deviam dinheiro nas casas de jogos clandestinos de Mão Branca. No processo 015/2.07.0005640-0, Miguel se declara amigo do contraventor. Mas nega ter prestado serviços a ele. No documento, Mão Branca também nega ter usado os serviços do seu compadre para proteger os seus negócios com máquinas caça-níqueis.



TENENTE-CORONEL ENTRE OS SUSPEITOS

Um tenente-coronel, cinco sargentos e 13 soldados de dois batalhões da Capital são suspeitos de garantir a segurança de contraventores mediante pagamento de propina.

Durante o horário de serviço, PMs teriam atuado como capangas de donos de caça-níqueis. Um dos suspeitos, o tenente-coronel Nelson Alexandre de Moura Menuzzi, 50 anos, pertencia ao comando do 11º Batalhão de Polícia Militar quando sua mulher e sogro teriam explorado máquinas na região.

O processo no qual o oficial e 18 praças são réus soma 3 mil páginas. Entre os beneficiados pela suposta proteção de PMs estão Tanise Menuzzi, mulher de Menuzzi, e o pai dela, Cledi Clementino Assis Machado. Conforme denúncia à Justiça, Tanise e Cledi “seriam sócios de casas de jogo” clandestino na área de atuação do 11º BPM. Entre dezembro de 2008 e abril de 2010, diz o documento, Menuzzi, que hoje comanda o presídio da PM, “deixou de determinar diligências necessárias a fim de fechar a casa de jogos ilegais de Cledi”.

A promotoria estima o suposto dano causado à tropa: “O mal-estar provocado pela conduta prevaricadora do denunciado incentivou praças a cometer ilícitos com o submundo dos caça-níqueis, na área do 11º BPM, vários deles cobrando propina para não atuar. Outros, atuando como seguranças em casas de jogo”.

Menuzzi tornou-se réu em processo na Justiça Militar porque PMs denunciados na mesma ação penal – por fazer a segurança de casas clandestinas – apontaram o oficial. Conforme a investigação, o sargento Ricardo Arraché Gonçalves e o soldados Mauro da Silva Santos, com outros colegas de farda, “exigiam R$ 2 mil por semana do proprietário do Bingo Fortuna para mantê-lo em funcionamento”.

De outros estabelecimentos na Zona Norte, PMs cobravam valores distintos. Os soldados Peterson Werner Borges e Marcelo Neves de Almeida teriam extorquido R$ 1,5 mil de Carlos Rayan Filho e Rodrigo da Silva Slaski, responsáveis por uma casa de jogos na Rua Itararé. Já o soldado Samir Parreira teria, com dois praças, repassado a localização de viaturas, vazado operações e realizado a segurança de casas. Um relatório do 11º BPM descreve o sogro de Menuzzi:

“Considerado um dos mais ferozes donos de casas de jogo, é temido por suas supostas ligações e indicado pelos demais proprietários de casas de jogos como responsável pela queda dos concorrentes, pois, segundo suas palavras, tem as costas quentes e o comando está ao seu lado”.

CONTRAPONTOS

O QUE DIZ JAIRO LUÍS CUTINSKI, ADVOGADO DOS PMS RICARDO ARRACHÉ GONCALVES, PETERSON WERNER BORGES, MAURO DA SILVA SANTOS E MARCELO NEVES DE ALMEIDA: Nenhum deles recebe dinheiro de contraventores. Muitas pessoas entraram no processo sem que tivessem envolvimento com bingos. Há inclusive escutas telefônicas questionadas na Justiça. Há furos na investigação. O processo, ainda em fase de instrução, foi desencadeado de forma precária e as provas são frágeis.

O QUE DIZ ANDRÉA FERRARI, ADVOGADA DE SAMIR PARREIRA: Ele não tinha envolvimento com a exploração de caça-níqueis. Meu cliente fez, algumas vezes, a segurança de uma garagem sem saber que, próximo do local, funcionava um estabelecimento com caça-níqueis.

O QUE DIZ O TENENTE-CORONEL NELSON ALEXANDRE DE MOURA MENUZZI: Não tenho nada a declarar. Quem pode se manifestar é o meu advogado. O QUE DIZ O ADVOGADO LUIZ CARLOS FERREIRA: ZH ligou para Ferreira, deixou mensagem de voz, enviou mensagem de texto e e-mail, mas ele não retornou aos chamados.


ESQUEMA NA SERRA TERIA 14 POLICIAIS

Caxias do Sul transformou-se no paraíso dos contraventores. Criminosos que atuavam em grupos independentes e exploravam 60 mil caça-níqueis contariam com proteção de 14 policiais – policiais civis, PMs e um agente federal aposentado. Denominada Oitava Praga, a operação da Polícia Federal desbaratou, a partir de grampos policiais e documentos apreendidos, quatro facções criminosas. A investigação detalhou a ligação entre agentes da lei e donos de máquinas programadas para nunca perder.

– O esquema de caça-níqueis estava ficando violento como no Rio – diz o delegado Noerci da Silva Melo.

Desmembrado em seis processos, que tramitam em segredo de Justiça, as ações penais documentam parcerias entre contraventores e policiais. Disnei Artur Ribeiro integrava um dos grupos que fornecia caça-níqueis para o Vale do Sinos, a Serra, a Capital e a Fronteira. Em um dos depoimentos, Disnei detalhou uma suposta transação ocorrida numa DP da Capital: “Em agosto de 2007, dia 14, foi até a 4ª DP, encaminhado até a sala de investigação por um policial de cor negra. Havia mais dois policiais. Um deles pediu R$ 50 mil para que não levassem Leocir Montovani para o presídio... Os policiais aceitariam R$ 35 mil e, após, admitiram R$ 30 mil. Ele disse que conseguiria R$ 20 mil até as 18h. Entregou o resto na outra semana”.

Em outro trecho, Disnei identifica os autores da suposta extorsão:

“Olhando a foto de Carlos Carvalho (Carlos Ezael Alfaro Carvalho), reconheceu como sendo o policial para quem entregou R$ 20 mil. Olhando para a fotografia de Leandro Laquini dos Santos reconheceu como sendo o policial para quem entregou R$ 10 mil. Olhando a fotografia de Sidinei Oliveira, reconhece como sendo o policial de cor negra”. Na Justiça, Disnei voltou atrás e negou a corrupção. Lotado na Capital, o investigador Luiz Henrique Reis Jacques também é réu no processo. A PF flagrou 145 ligações entre Jacques e o contraventor Marco Antonio Mariano, um dos sócios do Bingo Real Palace. Reis foi condenado em primeira instância a três anos e oito meses por formação de quadrilha e corrupção passiva. Ele recorreu. Conforme a Corregedoria da Polícia Civil, está afastado das funções.

CONTRAPONTOS

CARLOS EZAEL ALFARO CARVALHO (À JUSTIÇA): diz que nunca deu proteção a pessoa envolvida com crime.

LEANDRO LAQUINI DOS SANTOS (À JUSTIÇA): Negou envolvimento com contraventores.

SIDNEI GALEÃO OLIVEIRA (À JUSTIÇA): Nunca passei informações privilegiadas a qualquer um dos citados membros da organização criminosa investigada, nunca recebi vantagem indevida por informações privilegiadas nem por liberação ou apreensão de máquinas apreendidas ou a não apreensão delas.

LUIZ HENRIQUE REIS JACQUES (À JUSTIÇA): Nunca instruí membros de organizações criminosas ou proprietários de bingos de como proceder diante de operações policiais. Nunca recebi qualquer quantia a título de contrapartida de informação.

O QUE DIZ ALBERTO IVÁN ZAKIDALSKI, ADVOGADO DE DISNEI ARTUR RIBEIRO: Meu cliente não ofereceu dinheiro à polícia. Ele voltou atrás no depoimento à Justiça. O primeiro depoimento, em que havia dito que deu dinheiro a policiais, foi realizado sem acompanhamento de um advogado.

O QUE DIZ DANIEL GERBER, ADVOGADO DE MARCO ANTONIO MARIANO: O meu cliente foi condenado em primeira instância por contrabando e corrupção policial. Estamos recorrendo. No caso da corrupção policial: vários policiais jogavam na casa, mas jamais meu cliente comprou informação ou qualquer coisa semelhante.

SOBRE ZERO HORA, 06/12/2012

Em relação ao texto “Tenente-coronel entre os suspeitos”, publicado na página 5 do dia 19 de novembro, esclareço: o tenente-coronel da BM Nelson Menuzzi, na corporação há 30 anos, construiu na carreira um patrimônio moral e funcional inabalável, sem mácula disciplinar. Desde 2010, comanda o Batalhão de Polícia de Guardas (BPG), órgão encarregado da segurança dos presídios (menos o Central) e escoltas de militares em Porto Alegre. Em decorrência da avassaladora notícia divulgada em ZH, postulou junto ao comando a imediata instauração de Conselho de Justificação visando comprovar, no devido processo legal, a sua mais completa isenção em relação às graves acusações contidas na publicação.
No processo da Justiça Militar, responde pelos fatos noticiados onde provará a sua inocência no devido tempo, inclusive postulou pelo desmembramento do processo com o propósito de enfrentar com mais celeridade o julgamento do Conselho Especial de Justiça. O motivo de ter sido denunciado se deve a uma estratégia da defesa dos acusados, do tipo “colocar o bode na sala, ou um tubarão no aquário ornamental caseiro”.

Luiz Carlos Ferreira, Advogado da parte



sábado, 17 de novembro de 2012

DESCUIDO INCOMPREENSÍVEL

 

zero hora 17 de novembro de 2012 | N° 17256


EDITORIAIS



A indignação da sociedade com a violência e com os criminosos explica em parte o apoio de muitas pessoas ao gesto de vingança do pai que esfaqueou o assaltante da filha em Passo Fundo, mas – descontado o passionalismo – é inconcebível que um prisioneiro sob a proteção do Estado seja agredido no interior da delegacia, quando já estava imobilizado e preso. Mesmo que o agressor estivesse movido por natural emoção, pois recém havia tomado conhecimento do episódio, ele devia ter sido contido pelos policiais que acompanhavam o preso até a sala de triagem. E se o invasor fosse outro bandido com a intenção de resgatá-lo?

Cabe reconhecer que a polícia foi eficiente na ação de prisão do criminoso, mas falhou na hora de encarcerá-lo. Um prisioneiro sob a guarda do Estado, independentemente do crime que tenha cometido, deve ser protegido pelos agentes públicos. É a Constituição Federal que diz isso com todas as letras, em seu artigo 5º: “É assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. Esse é um dos princípios que distingue o Estado democrático de direito da barbárie, que permite linchamentos e execuções sumárias, inclusive de inocentes.

Quando o Estado falha, como falhou no caso específico, o conceito de ordem se desestrutura. As pessoas mais passionais, que aprovam cegamente a vingança, sob o pretexto de que os delinquentes quase sempre ficam impunes, esquecem-se de que no lugar dele poderia estar qualquer cidadão, detido para simples averiguação policial ou por envolvimento em algum incidente, do que ninguém está livre. Esquecem-se, também, que os familiares do preso executado poderão acionar judicialmente o Estado e uma possível indenização recairá sobre os contribuintes. Esquecem-se, ainda, do célebre ensinamento de Mahatma Gandhi: “Olho por olho, e o mundo acabará cego”.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

MANIFESTO DOS CABOS E SOLDADOS PM E BM DO BRASIL


Manifesto das entidades representativas dos Policiais e Bombeiros Militares Brasileiros

Abaixo, o manifesto feito pelos representantes dos policiais e bombeiros militares no final do 3º Fórum das Entidades Representativas dos Policiais e Bombeiros Militares, em Belo Horizonte(MG)



ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS ENTIDADES REPRESENTATIVAS
DE CABOS E SOLDADOS POLICIAIS MILITARES E
BOMBEIROS MILITARES DO BRASIL – ANERCS – PM/BM – B
FUNDADA EM 27/04/95 – REG. Nº 3171 – BRASÍLIA – DOU. Nº 87 DE 09.05.95
Belo Horizonte, MG, 05 de novembro de 2012.

O BRASIL ESTA DE LUTO E O GOVERNO DE SP E FEDERAL DE BRAÇOS CRUZADOS.

No dia 05 de Novembro de 2012 na cidade de Belo Horizonte MG, reúnem-se, representantes das entidades dos Cabos, Soldados, Subtenentes, Sargentos, Oficiais e Pensionistas das polícias e bombeiros militares dos estados brasileiros.

Nós representantes das Associações do país, revoltados com a situação caótica a que estão acometidos os Policiais e Bombeiros Militares do Brasil principalmente do Estado de São Paulo, que vêm sendo literalmente caçados e exterminados por marginais, estamos enlutados.

Em pleno ano de 2012, a grande discussão em todo o mundo são os “DIREITOS HUMANOS”, no entanto os governos de SP e o Governo Federal parecem rasgar a cartilha em prol de seus egos políticos, onde há um flagrante protecionismo exagerado quanto aos direitos dos marginais, usando de mentiras, de falácias para se eximirem de suas verdadeiras responsabilidades enquanto representantes do povo. Vamos mais longe, omitem-se de suas responsabilidades, sendo a nosso ver, co-responsáveis por este massacre, onde quem sofre ao final é o povo brasileiro.

É inadmissível que a criminalidade tome conta do Estado, é incompreensível que o “Estado Democrático de Direito” esteja perdendo espaço para a criminalidade.

Nós nos sentimos abandonados. Abandonados por conta da inércia, impotência, incapacidade destes governos, que se dizem representantes do povo. Como representar o povo? Se neste momento não preservam a vida daqueles que são tão mau remunerados para salvaguardar a vida dos seus? Não compreendemos. Nos sentimos como filhos abandonados.

Onde esta a Força Nacional? Onde estão aqueles que fazem discursos inflamados nos períodos eleitorais? Aqueles mesmos que dizem se preocupar com o povo? Aqueles mesmos que pagam míseros salários a nossos heróis, e que agora covardemente nos abandonam? Aqueles que discursam na pauta da Segurança Pública?

Não temos medo da morte, assim como se necessário for, para salvar a vida do inocente ou para nos defender não hesitaremos em reagir. Hoje no Brasil, lamentavelmente, a cada 32 horas perdemos um companheiro, isso sem levar em consideração aqueles que convalescem nos hospitais, residências e centros de recuperação, vítimas do mesmo mal, sem quaisquer auxílio ou ações desses que se dizem governantes.

Ora senhores, chega de conversa, exigimos ações concretas dos governos, a nós não importa de quem é a culpa, a nós não importa quem o faça, a nós o que importa são ações concretas para que possamos defender os nossos. E em conseqüência possamos cumprir a nossa missão que é salvaguardar a população brasileira.

Atenciosamente,

Leonel Lucas
Presidente da ANERCS

ADM.: SOLDADO LEONEL LUCAS

ALERTA NA POLÍCIA GAÚCHA


ZERO HORA 15 de novembro de 2012 | N° 17254

PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA


Embora a Polícia Civil não acredite na possibilidade de ocorrerem ataques semelhantes aos que aterrorizam Santa Catarina e São Paulo nos últimos dias, o Rio Grande do Sul está em estado de alerta. O chefe de Polícia, Ranolfo Vieira Jr., não quer semear pânico entre a população, mas o fato de um dos atentados ter ocorrido em Criciúma, a cerca de cem quilômetros da divisa com o Rio Grande do Sul, deixou os órgãos de segurança atentos a qualquer sinal diferente captado por seus agentes ou denunciado pela população.

As autoridades daqui não querem desprezar indícios, como fez a polícia de São Paulo ao receber o primeiro alerta de que o PCC preparava uma série de atentados. Ontem, a polícia gaúcha foi atrás de duas informações que se revelaram infundadas sobre preparação de atentados. Mesmo correndo o risco de perder tempo com pistas falsas, o delegado Emerson Wendt, especialista em inteligência, pede à população que denuncie qualquer movimento suspeito pelo telefone 181 ou pelo site da Polícia Civil (www.pc.rs.gov.br).

– Em princípio, acreditamos que não há risco de o Estado sofrer esse tipo de atentado, porque aqui não existe uma facção dominante nos presídios. Como não se pode descartar totalmente essa possibilidade, a polícia tem de estar atenta, e a comunidade pode colaborar – diz Wendt.

No Rio Grande do Sul, são três facções atuando nos presídios, o que dilui o seu poder. Wendt considera mais provável a ocorrência de ataques semelhantes aos de São Paulo e Santa Catarina no Paraná, em Mato Grosso do Sul e Pernambuco.

Ontem, ao longo do dia, delegados gaúchos trocaram informações com policiais de Santa Catarina e do Paraná. O otimismo das autoridades catarinenses, que ao longo do dia imaginavam ter estancado a onda de violência com a prisão de 21 suspeitos, se desfez à noite, com o incêndio de mais um ônibus na praia dos Ingleses.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

QUEIJO E GOIABADA



Para liberar veículos, policiais presos aceitavam queijo e goiabada, diz MP. Seis agentes do Batalhão de Polícia Rodoviária (BPRv) foram presos e três são procurados


O Globo e Extra
Atualizado: 14/11/12 - 12h09

RIO — Os agentes do Batalhão de Polícia Rodoviária (BPRv) presos em uma operação da Corregedoria da PM realizada com o apoio do Ministério Público estadual nesta quarta-feira chegavam a aceitar queijo, goiabada e até pares de sapato como pagamento para liberação de veículos irregulares. Segundo o MP, o valor da propina variava de R$ 20 a R$ 200, que era cobrada preferencialmente de veículos de motoristas de veículos de carga. Em troca, os agentes isentavam os motoristas de multa ou da apreensão dos veículos.

Até o momento, seis agentes suspeitos de fazer parte do esquema foram presos. Foram expedidos nove mandados de prisão, contra os segundos-sargentos Nelsin Vieira Serpa, de 47 anos; Carlos José Estevam, de 44; Jefferson Barcelos Castro, de 42 anos; Marcelo Lourenço Brandão, de 41; Carlos Eduardo Rocha Aguiar, de 42 anos; além dos cabos Edenilson Borges da Silva, de 39 anos; Josley Sebastian Sardela Antunes, , de 35; Alex Wermelinger; e o soldado André Luiz Brayner, de 34 anos.

De acordo o corregedor da PM, Waldyr Soares Filho, os agentes, que foram denunciados pelo PM pelas práticas de concussão (extorsão praticada por agente público) e de corrupção, tiveram a prisão preventiva decretada pela Justiça Militar. O corregedor informou ainda que todos foram presos em casa. Um deles estava em Minas Gerais.

As investigações da “Operação Mercúrio”, como foi denominada, foram realizadas pela própria Corregedoria da PM em conjunto com as Promotorias de Justiça de Auditoria Militar do MP, que teve o apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). De acordo com a denúncia do Ministério Público, as irregularidades foram praticadas entre os dias 30 de julho e 28 de agosto no Posto de Controle de Trânsito Rodoviário 16, em Nova Friburgo, localizado no quilômetro 65 da Rodovia RJ-116.

Uma das ações descritas pelo MP se refere à abordagem de um caminhão basculante Mercedes-Benz, por volta das 15h40m do dia 22 de agosto. O cabo Wermelinger e o soldado André Brayner ameaçaram rebocar o veículo alegando que o motorista não portava o Certificado de Verificação do Tacógrafo (equipamento que registra a velocidade). Eles exigiram R$ 50 para a liberação do caminhão, e o dinheiro foi pago.

Os policiais militares detidos estão sendo levados para a sede do órgão, em São Gonçalo, onde serão submetidos a exame de corpo de delito. Em seguida, serão encaminhados para o Batalhão Especial Prisional (BEP), em Benfica, na Zona Norte.

ATAQUES À POLÍCIA CONFIGURAM TERRORISMO



Revista Consultor Jurídico, 13 de novembro de 2012

Violência em SP. Ataques à polícia configuram terrorismo, diz ministro

Por Débora Pinho


O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes classifica a morte de policiais militares em São Paulo como atos de terrorismo. "Em alguns casos está claro que o alvo dos ataques não são as vítimas, mas o Estado", afirma o ministro. Em 2012, houve um aumento de quase 45% de mortes de PMs no estado. Este mês, o governador Geraldo Alckmin e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, definiram medidas para combater a onda de violência que tomou conta de São Paulo nas últimas semanas. A comunidade jurídica cogitou alguns caminhos: a criação de leis mais duras para conter a violência e a aplicação da Lei de Segurança Nacional. Mas também apontou, com números, um exagero da imprensa nas notícias sobre ações de criminosos.

O advogado Arnaldo Malheiros Filho concorda com o ministro Gilmar Mendes e considera que o momento exige uma atitude especial. “A situação é gravíssima e está sob relativo controle dos órgãos públicos, que, lamentavelmente, pensam que não devem contas a ninguém”, avalia. Segundo o criminalista, “é preciso ter em mente que toda postura de combate ao crime — própria do Poder Executivo, ainda que, em parte, por um braço independente, que é o Ministério Público —, é limitada pela legalidade”. Para ele, o foco do debate é a tortura e o “estado de necessidade”. O caso, diz, deve ser resolvido dentro da “estrita legalidade”.

O desembargador Ivan Sartori aponta números que mostram que, em São Paulo, a situação é menos crítica que a média nacional. Ele lembra que o estado está com 10,26 homicídios por dia por 100 mil habitantes, quando o nível aceitável pela Organização Mundial de Saúde é de 10 homicídios. No Brasil, são 22 homicídios por 100 mil habitantes. Em São Paulo, são quase 43 milhões de habitantes. “Nesse contexto, não parece ser coisa generalizada. Agora, todos os homicídios que ocorrem são referentes à crise, quando já tínhamos esses dados normalmente. A situação é grave, mas não tem tamanha proporção quando consideramos o número habitantes”, afirma ele.

O coronel aposentado José Vicente da Silva Filho, mestre em Psicologia Social e professor do doutorado profissional do Centro de Altos Estudos de Segurança da PM de São Paulo, concorda com Sartori. “A intensa focalização dos problemas de São Paulo, principalmente pelos jornais da TV Globo, geram a impressão de que o estado e sua capital estão com os maiores níveis de violência do país, além de infundir o pânico na população”. Ele afirma que a média de homicídios da capital, de janeiro a setembro, é de 102 ao mês. A média mensal do Rio de Janeiro é 187. Curitiba fica com 250, Salvador com 540 e Fortaleza com 620. “Todos os estados e Brasília têm resultados piores que São Paulo, mas o governo ofereceu ‘ajuda’ ao estado”, diz. Segundo José Vicente, “não há nenhuma evidência de que o incremento das mortes se deva a qualquer coordenação centralizada de alguma facção criminosa”.

Para ele, “a mídia, principalmente a televisão, vem fazendo um desserviço monumental à causa da segurança: divulga ‘ordens’ de ataque de criminosos, ampliando seu alcance no meio criminoso; mostra o ‘sucesso’ das ações criminosas, motivando outras novas e infunde o medo na população”. Segundo José Vicente, a força que os criminosos estão descobrindo na capacidade de afrontar o Estado por meio de ataques pode ganhar avanços. “Nesta última semana, o sistema de inteligência da segurança do Rio de Janeiro constatou plano do Comando Vermelho para copiar os ‘colegas paulistas’ e atacar policiais, agentes penitenciários e policiais das UPP. Dois ataques que feriram um agente penitenciário e um sargento podem estar ligados”, afirma.

A insegurança pública e a lente de aumento da violência
O advogado Celso Cintra Mori avalia que a situação da insegurança pública em São Paulo exige cuidados no diagnóstico. “É preciso cautela para analisar os fatos segundo o seu próprio significado, e não segundo conveniências e estratégias político partidárias. E coragem para encarar os fatos como efetivamente são. Erram o governador e seu secretário de Segurança Pública quando, contra todas as evidências, vêm a público declarar que está tudo sob controle e que os assassinatos estão diminuindo. Com essa afirmação perdem credibilidade”, analisa ele, em artigo publicado na revista Consultor Jurídico.

Por outro lado, segundo Mori, percepções alarmistas também não se justificam. “Não creio que se deva fazer analogia com os movimentos terroristas. Não há o substrato ideológico nem o objetivo de poder que caracterizam aqueles movimentos”. Ele diz que “é evidente que não há uma guerra convencional, como também é evidente que há um confronto caótico entre vários grupos criminosos, não necessariamente articulados entre si, e a polícia”.

Segundo ele, a legislação deve evoluir sempre, mas de forma maturada. “Propostas legislativas improvisadas não podem ser uma alternativa para justificar a falta de vontade política e de determinação para fazer o que tem que ser feito. O que tem que ser feito, sem necessariamente mudar radicalmente a lei, é corrigir pelo menos alguns erros crassos que vêm sendo cometidos pelas autoridades e pela sociedade. Alguns desses erros exigem atuação em curto prazo”.

O advogado criminalista Luiz Flávio Gomes não acredita que haja um movimento terrorista “porque ninguém está querendo derrubar o governo eleito democraticamente”. Além disso, segundo ele, “não temos o conceito jurídico de terrorismo no Brasil”. Ele levanta, ainda, a hipótese de se admitir a invasão do Exército. O criminalista considera que “a violência é grande, mas não se trata de uma guerra, no sentido estrito da palavra. Logo, sua presença tenderia a migrar o crime ou até agravar a situação com mais mortes”.

Ele lembra que “não é de hoje que vivemos um massacre generalizado e a mídia nunca se escandalizou com isso sistematicamente”. E cita números: A cada 9 minutos uma pessoa é assassinada no Brasil, o equivalente a 6 mortes por hora, 147 vidas por dia e 4.485 homicídios por mês. “Não concordamos com nenhuma morte ilegal. Não apoiamos a violência. Ao contrário, sempre nos posicionamos criticamente em relação a ela. Mas convenhamos: se as dez mortes diárias em São Paulo estão merecendo toda a escandalização que estamos vendo, por que não dramatizar efusivamente dos outros 137 óbitos diários no país?”, questiona.

Os caminhos da Lei de Segurança Nacional
Luiz Flávio Gomes questiona se seria o caso de se aplicar a Lei de Segurança Nacional. Ele mesmo responde: “Penso que não, porque ela se destina aos crimes políticos. Não consta estar havendo qualquer pretensão política em toda a estapafúrdia e grotesca violência paulista e paulistana”.

O procurador de Justiça do Rio Grande do Sul, Lênio Streck, lembra que a Lei de Segurança Nacional não foi recepcionada pela Constituição. Questionado se é preciso fazer leis para combater a onda de violência, ele considera que agir dessa forma é reconhecer o poder paralelo. Já o promotor de Minas Gerais, André Melo, entende que a Lei de Segurança Nacional pode ser sim aplicada. E defende no novo Código Penal e uma nova Lei de Execução Penal. “Se o governo federal não revisar o Código Penal e a Lei de Execução Penal rapidamente, vamos para o colapso, pois prendemos muito, mas prendemos mal”, avalia.

O problema do Ministério da Justiça, segundo ele, é que apenas aplica a ótica dos advogados criminalistas. “Somente apoia leis que amenizam o sistema prisional”, diz. Ele lembra que o governo federal não apoia nenhuma lei para proteger a vítima. “A situação é de caos e desesperadora em face da impunidade para delitos mais graves. A solução é o princípio da oportunidade da ação penal, seletividade para prioridades de investigação, investimento em perícia e investigação, uma polícia com concurso que cobre noções mais de perícia e raciocínio investigativo do que decorar leis e prazos processuais, além de uma nova lei penal e de execução penal”, ressalta.

Em artigo publicado na ConJur, o advogado criminalista Thiago Gomes Anastácio afirma que a Lei de Segurança Nacional não pode ser aplicada no caso de São Paulo. Segundo ele, “a lei é suficientemente óbvia nesse sentido: sua aplicação só deve incidir em casos de revoluções contra o país, sempre valendo lembrar que a contestação pacífica, dialética e política também não podem sofrer sua incidência”. E mais: “A Lei de Segurança Nacional, como o próprio nome já diz, é a lei que protege o Estado brasileiro contra atentados ao seu regime e forma de governo, ou seja, contra atos que ousem usurpar o Poder Constituinte (originário) ao impor nova estruturação ou impor agentes públicos por outra forma que não estabelecida pela Carta Política”.

O juiz Ali Mazloum pensa o contrário. Ele considera que a Lei de Segurança Nacional pode ser aplicada. Porém, com o deslocamento de competência da Justiça Militar para a Justiça Federal para analisar os casos em questão. “Estaria na hora de o procurador-Geral da República suscitar o incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal, pois não há dúvida de que a ação da organização criminosa atenta contra o Estado de Direito e demais direitos humanos previstos no artigo 5º da Constituição”. Segundo ele, com o deslocamento de competência, cai o viés ditatorial que poderia ser suscitado. “Trata-se de Lei, a única, que tem o objetivo de defender a integridade nacional ou parcela (SP) dele e diversos direitos humanos que estão implicitamente nela embutidos”, afirma.

Mazloum diz que na Justiça Federal poderia ser imediatamente criada uma Secretaria Criminal Extraordinária (Secretaria Especial), com um corpo de funcionários “sem rosto”, para cuidar apenas destes casos, o que implicaria celeridade, economicidade e eficiência na tramitação dos processos. “Uma comissão de três juízes federais poderia ser responsável pela coordenação dessa Secretaria Especial e pelas estratégias para o processamento destas causas."

De acordo com ele, as causas seriam distribuídas normalmente para os juízes federais da capital, cuja competência seria especilizada para esses delitos. A tramitação se daria exclusivamente na “Secretaria Especial”, onde advogados e outros não teriam acesso. Os advogados teriam de tratar de suas causas exclusivamente perante os juízes federais da capital, sem intermediação dos funcionários, de acordo com ele.

Mazloum afirma que presos, chefes e líderes do PCC poderiam ser processados pelo crime do artigo 17 da Lei de Segurança Nacional, além de outros do Código Penal, cuja pena pode chegar a 30 anos.

“Ao lado dessas medidas, os líderes das organizações criminosas seriam objeto de transferências constantes de presídios (território nacional), nunca permanecendo mais de três meses no mesmo local, de modo a desarticular seu poder de comando. Paralelamente, a comissão de juízes federais e outros agentes formariam uma grande Comissão de Diálogo, para desenvolver e monitorar um intenso trabalho de diálogo com referidos presos (e familiares) e policiais envolvidos, buscando em curto prazo estabelecer regras para uma trégua e um diálogo e paz mais duradouros.”

Um advogado criminalista ouvido pela ConJur que preferiu não se identificar considera que a criação de leis mais duras não adiantaria. “O sujeito que resolve matar um parente de policial, sabe que se for pego pode ser morto. Se alguém, diante da possibilidade da morte, não se assusta, não vai se assustar com uma lei mais dura, ou com uma polícia mais violenta”, afirma.

O criminalista considera que o Rio é um exemplo do que pode funcionar na seara da Segurança Pública. “Centrais de inteligência, escutas telefônicas, identificação dos lideres, prisão e colocação em presídios fora do estado — algo que o governo de São Paulo nunca fez. E, depois, ocupação das regiões mais complicadas com serviços do estado como UPPs). A declaração de guerra já existe e o aprofundamento dela causará mais mortes”, conclui.

O advogado criminalista Luciano Feldens diz que é necessária “uma intervenção ativa em favor do bem jurídico a ser protegido. No caso, a própria Constituição — que prevê o regime democrático constitucional”. Segundo ele, “ações criminosas dessa natureza parecem se encontrar sob o alvo do artigo 5º, inciso XLIV, da Constituição de 1988 — Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”. De acordo com Feldens, sob a perspectiva de enquadramento jurídico-penal, o caminho parece estar no Projeto de Lei 6.674, encaminhado pelo Poder Executivo, em 2002, à Câmara dos Deputados. “O projeto buscava acrescentar ao Código Penal o Título XII, sob a rubrica “dos crimes contra o Estado Democrático de Direito”, sugerindo a revogação da Lei 7.170/83 [Lei de Segurança Nacional] e propondo a criação de um tipo penal com inquestionável espelhamento no mandado constitucional que se comenta e nos fatos que atualmente atormentam as forças de segurança e a sociedade em geral."

O coronel José Vicente, que já visitou mais de 15 polícias no exterior e tem quase uma centena de trabalhos publicados na área de segurança, aponta alguns caminhos: “A legislação de exceção e os mecanismos policiais e judiciários criados para enfrentamento das brigadas vermelhas italianas e do grupo do Baader Meinhoff, da Alemanha, foram decisivos para seu enfrentamento. Em 38 estados dos Estados Unidos, crimes contra policiais e juízes têm sua pena fortemente agravada, podendo ser dobrada. Onde há pena de morte nunca ocorre perdão ou conversão de pena quando a vítima for uma dessas autoridades”, explica.

Segundo ele, as autoridades do setor precisam criar condições para enfrentar o pior cenário. “Tomara que nunca sejam usadas, mas não há justificativa para não tê-las numa crise. Napoleão ensinou que um comandante pode até perder a batalha, mas nada justifica que ele seja surpreendido”, finaliza.

Débora Pinho é editora da revista Consultor Jurídico e colunista da revista Exame PME.


Matéria indicada por  Rogério Brodbeck