ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.

domingo, 31 de janeiro de 2016

POR QUE FALTAM POLICIAIS



ZERO HORA 31 de janeiro de 2016 | N° 18431



MARCOS ROLIM*


O RS vive uma crise em seu sistema de segurança pública há muitos anos. O que estamos assistindo agora é um momento de paroxismo do processo de adoecimento institucional construído pela incompetência e pela irreflexão públicas. A vida das cidades gaúchas se degrada pela violência e pela sensação de insegurança. Vivemos constrangidos pelo medo, contabilizando o número de vezes em que fomos vítimas e tomando conhecimento de novos atos de banditismo sem a resposta adequada do Poder Público, o que contribui para a retração das atividades econômicas e para o afastamento da cidadania dos espaços públicos. A violação dos direitos daqueles que foram atingidos pelo crime tende, por seu turno, a criar um ambiente de desespero e ressentimento que é aproveitado pelos demagogos no mercado da venda de ilusões. As mesmas premissas que construíram o caos são, então, reforçadas. Este é o caminho que nos leva ao fundo do poço, e para além dele, porque nada é tão ruim que não possa piorar.

Para se enfrentar a crise na segurança, como para responder a qualquer questão complexa, é preciso ter a disposição de fazer perguntas. No Brasil, tudo se passa como se as respostas fossem sabidas e apenas não implementadas. Essa estupidez que produz certezas é a mesma que evita conhecer. Então, por exemplo, dizemos que é preciso contratar mais policiais. Muito bem. É óbvio que faltam policiais, mas por que faltam? Faltam policiais porque nosso modelo de polícia não lhes assegura carreira. Porque temos duas portas de entrada em cada polícia, uma para quem vai mandar e outra para quem vai obedecer; coisa que só no Brasil. Porque parte cada vez maior dos policiais apenas aguarda a chance de deixar sua corporação pela ausência de perspectivas. Assim, investimos na seleção e na formação de policiais que, sistemicamente, saem das polícias após alguns anos e só o que se demanda é que o governo dê mais velocidade a essa porta giratória. Deveríamos estar falando em carreira única em cada polícia, em ciclo completo, em diagnóstico e monitoramento de resultados, em áreas integradas de segurança, em prevenção, em georreferenciamento etc. Mas, no Brasil, isso é o mesmo que falar grego. Seguimos, assim, pedindo mais do mesmo. Mais prisões, ainda quando elas se tornam espaços ideais para a organização de facções e para ampliação do crime, e mais policiais, ainda que eles sejam recrutados para um dos mais ineficientes modelos de polícia do mundo.

*Jornalista e sociólogo



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Assim como os demais Estados do Brasil, o RS vive esta crise justamente pela visão míope de políticos, sociólogos e especialistas que tratam a segurança pública como SISTEMA e não como um DIREITO, que no Estado Democrático de Direito é garantido pela força de leis severas e de um sistema de justiça criminal ágil e coativo. Esta visão desvia das mazelas, centraliza a culpa nas forças policiais e tende a cobrar apenas do Poder Executivo as soluções.

É claro que efetivos policiais precisam ser contratados para ocupar o espaço preventivo e agilizar as investigações, bem como determinar o retorno de todos os cedidos e de usar a reserva da Brigada Militar para liberar a ativa para finalidade e razão de existir das instituições policiais. A falta de policiais tem causa nas cedências para cargos mais atrativos e menos perigosos, nos baixos salários, na perda da autoridade, na falta de reconhecimento da função essencial à justiça, no enfraquecimento por leis permissivas e na inutilização dos esforços causados por uma justiça leniente e execução penal branda e irresponsável.

O ciclo completo é essencial para aumentar a eficiência das forças policiais, mas não podem esquecer o a importância do segmento pericial que foi sequestrado dos quadros policiais em vários Estados pelo corporativismo e politicalhas. A carreira nas forças policiais segue o mesmo padrão dos demais poderes e instituições do sistema de justiça criminal onde TODOS podem concorrer desde que atendam os requisitos e a formação de chefia e comando. A tal "carreira única" como querem colocar é demagoga e sedimentada na experiência, esquecendo que esta não é suficiente para administrar e potencializar os recursos e estratégias que necessitam de formação especializada em liderança, gestão e legislação.


sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

PROTESTO POR MAIS POLICIAIS

 Concursados da BM, da Polícia Civil e do Corpo de Bombeiros protestam em Porto Alegre Adriana Franciosi/Agencia RBS

ZERO HORA 29 de janeiro de 2016 | N° 18429


JULIANA BUBLITZ


CRISE NA SEGURANÇA

FUTUROS POLICIAIS MILITARES, civis e bombeiros que aguardam para serem convocados fizeram manifestação



Cansados de esperar pelo governador José Ivo Sartori, um grupo de aprovados em concurso público para Polícia Civil, Brigada Militar e Corpo de Bombeiros se reuniu para protestar, ontem, na Capital. No total, 3 mil pessoas esperam convocação desde o fim de 2014.

A manifestação foi na Praça da Matriz, em frente ao Palácio Piratini, com churrasco coletivo. Em faixas e cartazes estendidos nas árvores, a indignação tinha frases com dizeres como “economizar na segurança custa vidas” e “enquanto Sartori navega no Caribe, a população fica à deriva”, em referência às férias do governador.

– O objetivo é chamar a atenção para efetivar os aprovados imediatamente. A situação é gravíssima. Nunca a segurança pública viveu crise tão grande no Estado – adverte o vice-presidente do Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores de Polícia, Fábio Castro.

O sindicalista diz que, para atuar como policiais civis, 661 pessoas esperam convoção – sendo que 72 delegacias de polícia do Estado, conforme a entidade, têm com apenas um escrivão ou inspetor e outras 144, dois. O número de aprovados é insuficiente para resolver a crise, mas, na avaliação dos manifestantes, ajudaria a amenizar a sensação de insegurança.

– Em 2015, tivemos 490 baixas, entre aposentadorias, mortes, exonerações e demissões. Só isso já comprova a necessidade de convocação – diz André Gonçalves, 30 anos, um dos selecionados.

Além dos 661 aprovados para atuar na Polícia Civil, há outros 2,5 mil na expectativa por vagas no Corpo de Bombeiros e na BM. Todos precisam passar por cursos preparatórios antes de começar a trabalhar, o que leva pelo menos seis meses.

O presidente da Associação de Bombeiros do Estado (Abergs), Ubirajara Ramos, afirma que 200 integrantes da corporação se aposentaram desde 2015 e não foram substituídos. Ele também reclama que, desde julho de 2014, após a separação formal da BM, três leis para regulamentar a atuação dos socorristas estão “paradas”.

– Falta gente, estrutura e viaturas. A emissão e a fiscalização de alvarás está prejudicada, assim como o combate a incêndios. São 400 municípios que nem sequer têm bombeiros – alerta Ramos.

Na BM, não é diferente. O presidente da Associação dos Cabos e Soldados (Abamf), Leonel Lucas, lembra que, por lei, o efetivo da corporação deveria ser de 36 mil PMs. Hoje, segundo o Comando da BM, são 21 mil.

– Só em 2015, tivemos 2,1 mil aposentados. Sem recursos humanos, não temos como fazer frente à violência – diz Lucas.


A POSIÇÃO DO GOVERNO
Em entrevista a ZH no início do ano, o govenador José Ivo Sartori disse que avalia a possibilidade de convocação, embora a falta de recursos do Estado seja empecilho.
– Estamos estudando isso com tranquilidade e serenidade, avaliando o quadro. Mais cedo ou mais tarde, isso terá de ser feito. Agora, é evidente que isso precisa de condições. Como é que vou colocar alguém pra trabalhar aqui se eu não consigo pagar quem está em atividade? – questionou à época.
Na segunda, a ZH, José Paulo Cairoli, o governador em exercício seguiu o raciocínio:
– Não é simplesmente contratar novos ou mais policiais. Está na nossa meta. Teremos avanços nos próximos meses.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

INEFICIÊNCIA DO ESTADO FAVORECE O CRIME



Foto: Gilmar Fraga / Arte ZH


ZERO HORA 25/01/2016 - 06h03min




EDITORIAL



Pior do que a sensação de insegurança vivida diariamente pelos gaúchos é a sensação de desamparo. Cada vez que os cidadãos reclamam da violência de que são vítimas, as autoridades policiais alegam falta de efetivo e os governantes alegam falta de recursos — isso quando não acusam a mídia de hiperdimensionar o problema. Mas a realidade é insofismável: com ou sem notícia, homicídios, roubos, assaltos a bancos, estabelecimentos comerciais e residências continuam ocorrendo cada vez com maior frequência. São os cidadãos — as vítimas criminalidade — que atestam esse descalabro.

Ainda que se reconheça que os policiais fazem o que podem e que o governo realmente passa por uma crise financeira, a solução tem que vir do poder público. As pessoas pagam impostos para receber assistência e proteção do Estado. Se não recebem esse retorno, têm o direito de reclamar, de cobrar, de exigir providências efetivas por parte dos responsáveis pela segurança pública.

À autoridade cabe agir. Ou dar lugar a quem tem mais competência.

Ninguém suporta mais as desculpas esfarrapadas e a estratégia de transferir responsabilidade para os outros. A polícia diz que prende e a Justiça solta. O Judiciário reclama de inquéritos policiais malfeitos, garante que faz a sua parte e que só não manda mais gente para a cadeia porque os presídios estão superlotados. O governo alega falta de recursos, além da má vontade dos municípios em receber novos estabelecimentos prisionais. A tudo isso soma-se a carência de efetivo, de equipamentos e até de armas por parte das forças policiais. Justificativas não faltam. O que falta são lideranças fortes, soluções integradas, punição efetiva para os delinquentes e investimentos em educação, programas sociais e ocupação para as populações marginalizadas.

A falência do sistema prisional é inquestionável. Os presídios estão superlotados e uma parcela significativa da população carcerária, como lembra o comandante da Brigada Militar em entrevista publicada nesta edição (a reportagem completa está nas páginas 6 a 8), passa a maior parte do tempo sem fazer nada ou simplesmente planejando novos crimes. Ora, essa é uma realidade que pode ser alterada sem investimentos volumosos, desde que haja vontade política, mobilização das autoridades e empenho dos legisladores. Será tão difícil assim fazer o que outros países já fazem, colocando apenados a trabalhar? Evidentemente que estamos defendendo trabalho digno e possibilidade de recuperação, em contraponto à atual ociosidade que degrada e estimula a criminalidade.

Há muito mais a fazer. O caos da violência urbana não se resolve com medidas isoladas. Mas também não se resolve com omissão. O Estado — todos os poderes, todas as autoridades investidas para servir ao cidadão — está devendo uma resposta urgente e eficiente para os gaúchos.

AS POLÍCIAS PEDEM E O GOVERNO DIZ QUE NÃO TEM


DIÁRIO GAÚCHO 26/01/2016 | 02h01


Na edição de segunda-feira, ZH ouviu chefes da BM e Polícia Civil. Medidas apontadas por eles como ideais contra a insegurança não aparecem no horizonte



Posto policial na esquina das avenidas Ipiranga com Borges de Medeiros, em Porto Alegre, é retrato de falta de PMs no Estado Foto: Lauro Alves / Agencia RBS


Adriana Irion*





Para quem vê na ampliação de recursos e na contratação de policiais uma das saídas para melhorar o combate à criminalidade, o cenário na segurança pública é desanimador. Além de o governo ter reeditado em janeiro o decreto que congela nomeações e concursos públicos, os valores destinados, por exemplo, ao custeio mensal das corporações têm caído – sem falar na dificuldade de pagar salários em dia.

Só na Polícia Civil, por exemplo, o valor para custeio disponibilizado para este mês é 13,6% inferior ao de janeiro do ano passado. Se comparado com janeiro de 2014, a queda é ainda maior: foram 17% a menos no valor destinado a cobrir gastos com itens como luz, água e gasolina (sem levar em conta investimentos e vencimentos). Neste período, entre 2014 e 2016, só a conta de luz, dependendo da região, teve reajustes que variaram de 27,7% a 55,1%.

O custo com a água aumentou em 9,8%. E a gasolina, principal item para que o cidadão veja a polícia motorizada na rua, em policiamento ostensivo e preventivo, prendendo e atendendo ocorrências, teve aumento de 19,8%.

Enquanto as corporações fazem esforço para manter em dia a estrutura existente (e insuficiente), a possibilidade de ampliar efetivos segue distante. Em reportagem publicada na edição de segunda-feira de ZH, o comandante-geral da Brigada Militar (BM), coronel Alfeu Freitas, e o chefe da Polícia Civil, delegado Guilherme Wondracek, falaram da necessidade de contratar mais policiais, entre outras medidas (leia abaixo). As duas corporações têm candidatos aprovados em concurso esperando serem chamados para fazer a formação: são 2 mil na BM (1,6 mil policiais e 400 bombeiros) e 670 na Polícia Civil.

A Casa Civil tem dito que o "Estado tem dificuldades para contratar por ter superado no ano passado o limite prudencial de gasto com pessoal previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal Federal." Governador em exercício durante as férias de Sartori, o vice José Paulo Cairoli (PSD) disse nesta segunda-feira que a questão não é simplesmente contratar novos policiais:

— O governador Sartori já demonstrou neste ano que as coisas vão ocorrendo dentro de seu tempo democrático, de construção coletiva, e essa ansiedade que todos temos, e ele também tem, de resolver ou dar um encaminhamento melhor para a segurança. O que não é simplesmente contratar novos ou mais policiais. É muito mais do que isso. Está na nossa meta, no nosso projeto, fazer isso também. Teremos ainda alguns avanços nos próximos meses para depois caminharmos para a contratação.


O comandante da BM, coronel Alfeu Freitas, e o chefe da Polícia Civil no Estado, delegado Guilherme Wondracek, apontaram medidas para conter o avanço da criminalidade no RS em entrevistas a ZH publicadas na edição de segunda-feira. Confira a viabilidade de pontos principais.

1. Mudança da lei de progressão de regime e novos presídios e albergues

O que disse o coronel Alfeu Freitas, comandante da BM

Proposta
De que adianta enrijecer a legislação, encarcerar mais, se não há presídios ou albergues prisionais? Não adianta mudar a lei se não há presídio.

Realidade
Alterar a lei não compete a nenhuma das duas autoridades, mas ao Congresso Nacional. Há uma proposta de revisão e atualização da Lei de Execução Penal em tramitação no Senado desde 2013, porém, sem previsão de avanço.

O que disse o delegado Guilherme Wondracek, chefe da Polícia Civil

Proposta
Existem cerca de 5,3 mil detentos dos regimes semiaberto e aberto que foram enviados para casa ou usam tornozeleiras, por falta de vagas nos albergues. É claro que grande parte deles não fica em casa. Sai às ruas e comete crimes. Tem de mudar a lei.

Realidade
A abertura do complexo penitenciário de Canoas é a possibilidade mais concreta de abertura de espaço no sistema carcerário gaúcho. Anunciada há seis anos, a obra da nova cadeia com 2,8 mil vagas atrasou em função da demora de repasse de recursos ao município. A previsão mais recente indica inauguração de uma das quatro unidades do complexo em fevereiro.


2. Aumento do efetivo policial

O que disse o coronel Alfeu Freitas, comandante da BM

Proposta
Mais efetivo policial também seria bom.

O que disse o delegado Guilherme Wondracek, chefe da Polícia Civil

Proposta
Falta efetivo tanto na BM quanto na Civil. A saída é nomear mais policiais. Existem 670 aprovados em concursos para a Polícia Civil. Caso sejam nomeados, em seis meses, terão cursado a Academia e podem ir para as ruas. Substituiriam os 490 aposentados no ano passado.Realidade
Não há expectativa para convocação de policiais no RS. Em janeiro, o governo reeditou por mais seis meses o decreto que congela novas nomeações e realização de concurso público. Além disso, segundo a Casa Civil, o Estado superou no ano passado o limite prudencial de gastos com pessoal previsto pela Lei de Responsabilidade Fiscal. O secretário da Segurança Pública pediu ao governo o chamamento de todos os aprovados em concurso. O governador admitiu não ter condições financeiras para ampliar o efetivo, mas não descartou a possibilidade de convocar aprovados em concurso da BM ainda em 2016.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

QUAL É A SAÍDA CONTRA A VIOLÊNCIA, SEGUNDA BM E PC

Para comandante da Brigada, para mudar, só com educação e trabalho prisional. Para chefe de Polícia, a saída é nomear mais policiais

ZERO HORA 25/01/2016 - 02h02min



Coronel Alfeu Freitas (E) e o delegado Wondracek dão relatos sobre o que pode ser feito Foto: Montagem / Omar Freitas e Divulgação / Agência RBS


Entrevista com coronel Alfeu Freitas, comandante da Brigada Militar


"O telefone 190 não para de tocar"

Um dos mais experientes policiais gaúchos, o coronel Alfeu Freitas já comandou todos os principais batalhões da BM. Passou por fases em que o contingente de policiais era próximo do ideal e outras, como agora, quando a carência de efetivo é frequente. Nessa entrevista, ele comenta o que pode ser feito.

Já não há hora para acontecer assalto. O sujeito tem uma faca encostada no pescoço às 10h, ao meio-dia, com outras pessoas perto ou não... O que pode explicar isso?
As polícias fazem a parte delas, prendem gente todo dia. E a demanda é cada vez maior. O telefone 190 não para de tocar. Como não temos data para novas nomeações, o comandante de cada guarnição tem de gerenciar os recursos. A viatura só é liberada quando há efetiva missão, mesmo que seja para patrulhar. Tem de checar para evitar trote. E prever efetivo para eventos especiais, como a Operação Verão (patrulhamento do Litoral).

É um problema da lei?
Seria bom que o preso só ganhasse benefício após cumprir pelo menos um terço da pena. Mas a lei não é assim. E de que adianta enrijecer a legislação, encarcerar mais, se não há presídios ou albergues prisionais? Sem prisão, ele é enjaulado, fica por lá um tempo e volta para o crime. Não adianta mudar a lei se não há presídio.

A BM tem efetivo suficiente para enfrentar tanto crime?
Há uma defasagem histórica nas polícias. A BM está agora com cerca de 20 mil integrantes para cumprir todas as missões, bem menos que décadas atrás.

Os PMs fazem tudo o que podem? Algumas pessoas acham que a BM não se mexe o suficiente.
A fila de pessoas que cometem crimes não termina. Por quê? Porque em um presídio como o Central (em Porto Alegre), de 4 mil presos, apenas 500 ou 600 trabalham. Os demais fazem nada ou planejam crimes. Deveria existir pelo menos um presídio por município gaúcho. É muito? Só assim para garantir reeducação e poder cuidar de cada preso, como deve ser feito.

Qual a saída para enfrentar essa onda crescente de criminalidade?
Para mudar, só com educação e trabalho prisional. Mais efetivo policial também seria bom. É provável que a volta para a BM de alguns policiais cedidos ajude. Hoje, temos centenas emprestados a outros órgãos e até a outros poderes. Em alguns casos, como prefeituras e câmaras municipais, não renovei a cedência. Sugiro a volta, mas não tenho poder de exigir, a palavra final é do governador. Mas, veja, muitos desses PMs cedidos fazem atividades ligadas a policiamento: proteção de autoridades e força-tarefa do Ministério Público, por exemplo. Em troca, parte das multas arrecadadas volta em forma de equipamentos para a BM. Nesses casos, o empréstimo do policial é vantajoso para a BM.



Entrevista com o delegado Guilherme Wondracek
"A saída é nomear mais policiais"

O chefe de Polícia, Guilherme Wondracek, é um delegado "linha-de-frente". Esteve no comando da captura dos mais notórios assaltantes de banco do Estado e ajudou a esclarecer desvios de dinheiro público. A experiência o autoriza a comentar a carência de policiais e o liberalismo de leis.

Já não há hora para acontecer assalto. O sujeito tem uma faca encostada no pescoço às 10h, ao meio-dia, com outras pessoas perto ou não... O que pode explicar isso?
Existem cerca de 5,3 mil detentos dos regimes semiaberto e aberto que foram enviados para casa (prisão domiciliar) ou usam tornozeleiras, por falta de vagas nos albergues. É claro que grande parte deles não fica em casa. Sai às ruas e comete crimes. Não há como fiscalizar se eles estão realmente no domicílio, saber onde eles estão.

É um problema da lei?
Prendi um assaltante de bancos, com fuzil checo, há uns três anos. Tinha seis assaltos grandes no currículo. Já está solto, na rua, cometendo crimes. Tem de mudar a lei. O ladrão deveria cumprir dois terços da pena antes de conseguir liberdade condicional. Ou, pelo menos, deveria ser como na Lei dos Crimes Hediondos: exigência de um terço da pena para receber benefício de mudança de regime. Hoje, o assaltante cumpre um sexto da pena e tem direito a ir para o semiaberto (albergue).

A Polícia Civil tem efetivo suficiente para enfrentar tanto crime?
Falta efetivo tanto na BM quanto na Civil. A Civil tinha, em 1980, 27 policiais por delegacia. Hoje, tem nove. A população era de 7,5 milhões em 1980. Hoje, é de 11,5 milhões. Existiam 244 municípios em 1980. Hoje, são 497. Mas o efetivo da Civil é o mesmo: 5,5 mil agentes. Estamos apagando incêndio, focados em crimes graves.

Os agentes fazem tudo o que podem? Algumas pessoas acham que a polícia não se mexe o suficiente.
Não falta esforço dos agentes. O Rio de Janeiro enviou 70 mil inquéritos para a Justiça, em 2014. O RS remeteu 173 mil no mesmo ano, e outros 195 mil em 2015. E o Rio tem 11 mil policiais civis, nós temos 5,5 mil. O Instituto Falconi fez uma análise do trabalho cotidiano da Polícia Civil gaúcha, a pedido do governo. A conclusão é de que precisaríamos de 11,7 mil agentes no plano operacional, na linha de frente. Sem contar os que atuam em telefonia e informática.

Qual a saída para enfrentar essa onda crescente de criminalidade?

A saída é nomear mais policiais. Existem 670 aprovados em concursos para a Polícia Civil. Caso sejam nomeados, em seis meses, terão cursado a Academia e podem ir para as ruas. Substituiriam os 490 aposentados no ano passado. Outra alternativa é parar com as cedências de servidores. A Polícia Civil tem 129 cedidos para outros órgãos. A BM, me informaram, tem 700 cedidos.

sábado, 16 de janeiro de 2016

É NOSSA OBRIGAÇÃO SERMOS VISTOS

O PIONEIRO. Entrevista16/01/2016 | 09h07


"É nossa obrigação promover a sensação de segurança", afirma comandante do 12º BPM, de Caxias do Sul. Falta de efetivo é o principal problema da Brigada de Caxias



Buss reforça a necessidade de revisar processos Foto: Diogo Sallaberry / Agencia RBS


Manuela Teixeira


Quando assumiu o comando do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM) de Caxias do Sul, em 2015, o tenente-coronel Ronaldo Buss teve de enfrentar mais do que as estatísticas criminais de uma cidade que beira os 500 mil habitantes. Além da falta de efetivo, do corte de horas extras e do parcelamento salarial dos servidores por parte do governo estadual, foi preciso se explicar a uma população que pedia mais policiais nas ruas.


— O governo tem dito que o Estado está quebrado e não vai contratar. Ele não consegue nem pagar o salário em dia. Por conta disso, temos que motivar os nossos policiais, fazer com que o servidor tenha orgulho de fazer o que faz, para que ele se sinta o que é: um indivíduo importante para a sociedade — afirma.

Nascido em Porto Alegre, foi lá que iniciou a carreira na Brigada Militar, atuando por seis anos no policiamento ostensivo. Seguiu os passos do pai e do irmão, também policiais militares. Reúne experiências no comando da Escola de Especialização e Formação de Soldados de Montenegro, no comando da companhia de policiamento ostensivo da mesma cidade e na Força Nacional, atuando na capacitação e implementação de especializações no país.

É em Montenegro, cidade de 68 mil habitantes e distante 70 km de Caxias, que residem a esposa, professora municipal, e as filhas de 14 e 17 anos.

— Com 20 anos, eu atuava nas ruas de Porto Alegre. Não era qualquer missão que iria me contentar. Vir para Caxias era um desafio. A cidade exige muito — justifica, aos 50 anos.


Na entrevista a seguir, Buss reforça a necessidade de se revisar processos, como o código penal, refletir sobre a violência e debater políticas de prevenção eficazes no combate ao crime.

Pioneiro: Em 2015, pelo menos 10 casos de desavenças ou brigas resultaram em assassinatos. A sociedade está mais violenta?
Ronaldo Buss: Com certeza. Essa sociedade mais violenta está calcada na depreciação do valor da vida. Está carente de exemplos, de lideranças. Não tem vínculos. Tu se apega ao quê? O indivíduo se cria em um local marginalizado, sob a influência do tráfico e dos criminosos, aliado à falta de vínculo familiar. Os pais estão terceirizando a educação, acham que a escola é quem tem que educar. A criança cresce em um ambiente violento, isso gera traumas, reflexos psicológicos imensos. Tu transmites aquilo que recebes.

Quanto mais se debate sobre a violência e suas causas, mais as pessoas querem punição. Esse é o caminho?
As pessoas quem pensam dessa forma não estão vendo os outros. Elas não se colocam no lugar dos outros, da vítima do sistema. É um pensamento imediatista, assim como acreditar que a solução para o aumento da criminalidade está na mão da polícia. A polícia estabelece controle. Políticas de redução quem tem de fazer é o Estado, através da educação, de programas. As pessoas querem punição, querem ver o bandido morto, mas e se for teu irmão? E se ele (o bandido) foi confundido? Todo o sistema tem que ser encarado de forma muito séria.

Este ano, tivemos 11 mortes por conta de confrontos com a polícia. A Brigada Militar está matando mais? Essas mortes são comemoradas?
Toda morte é lamentada. Não é saudável para ninguém matar alguém. O indivíduo não pode ter o prazer de matar, e nós não temos esse prazer. O que comemoramos é uma sobrevida do policial no confronto. Se o indivíduo morreu em um confronto,
foi por quê? Porque ele imprimiu contra o policial uma violência que precisava de resposta. O policial é muito treinado para decidir e, quando decidir, usar a arma da melhor forma possível, porque pode atingir pessoas que não têm nada a ver com a cena. O aumento do número de confrontos tem a ver com o aumento da demanda. O número de delinquentes que tem coragem de enfrentar a polícia aumentou.

Como não ser corrompido pela violência? No caso do policial, como não perder os valores em uma profissão que vê o pior lado do ser humano?
O exercício dessa profissão (policial) exige vocação e que tu compreendas esse contexto do crime. O nosso ambiente de trabalho é conflituoso, mas temos que entender o papel que desempenhamos. Para nós não nos tornarmos violentos, temos um treinamento muito sério e uma manutenção do papel do policial. Eu tenho vontades, mas tenho obrigações. Nesse contexto, vale a obrigação. A lei inibe a violência do policial. A pessoa que não está treinada para isso vê um estuprador e se junta com outros 10 para linchá-lo. Agem por impulso. Se a gente não entende isso, comete abuso.

Nas redes sociais, inclusive nas páginas oficiais da Brigada, cada vez que um bandido morre a sociedade comemora, seguindo a linha “bandido bom é bandido morto”.
É o sentimento das pessoas de imediatismo, de ver uma solução. É impulsivo.

Qual a maior dificuldade da Brigada hoje?
Em Caxias, é a falta de efetivo. Tivemos no ano passado, entre a aposentadorias e transferências, a redução de 80 homens e mulheres. Isso não foi reposto. Tivemos redução de 9 mil horas extras por mês. Quando não tem gente, compensa com hora extra. Quando tu não tem gente e não tem hora extra, tu vai ter que trabalhar com mais qualidade, dar mais inteligência. O policial tem que ter uma razão para estar ali e entender isso.

Quando aumentam os índices de violência, quando a sociedade quer respostas, a primeira instância a ser questionada é a Brigada. As pessoas se queixam de não verem policiais na rua.
A Brigada é a única parte que é visível. É a nossa obrigação sermos vistos, promover a sensação de segurança. A sociedade tem que ver se é suficiente ou não. Nossa atuação hoje temmais inteligência. Temos que fazer mais com menos, estamos fazendo isso, e os números estão aí. Com a redução no número de policiais e de horas extras, é natural que a população veja menos policiais. E há um contexto interessante: o policial está ali, mas as pessoas não o veem. E não é só o policial, às vezes o bandido está ali e a pessoa não enxerga, está no celular, na internet. Tu vai ver o policial quando tu precisa.

Este ano, sete assassinatos foram registrados no Santa Fé, cinco no Desvio Rizzo, no Reolon e no Euzébio Beltrão de Queiróz (onde se comprovou que as mortes estavam ligadas por um confronto de tráfico de drogas). Por que não há uma presença mais forte da Brigada nesses locais?
Porque precisamos de mais gente. Mas não é só a Brigada que precisa estar ali. O problema da droga é um problema de saúde. Por que isso vai pra conta da polícia? Eu tenho solução fácil pra droga. É acabar com o consumidor. Por conta disso, temos programas para as crianças, como o Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd). Se tu acabar com o consumidor, acaba com o traficante. É problema de polícia? Viciado não tem que ir pra prisão, tem que ter tratamento. Na prisão ele vai consumir mais. Quanto a esses pontos, parece que a gente não faz nada, mas a gente faz. Fizemos várias operações, só que não temos condições de ser constantes em nenhum lugar da cidade. Todos esses bairros têm operações regulares. Atendemos a 1,9 mil chamados por mês.

Por que não são feitas ações mais contundentes nesses locais até que os crimes diminuam?
Aí se resolve momentaneamente aquele problema e quando sair de lá pode ser pior. As pessoas vão reclamar mais. Vamos acostumar a comunidade com um serviço que não temos condições de fazer todo dia, de manter. A partir do histórico de incidências, fazemos uma análise criminal e vamos atendendo as demandas. Não é resolver o problema da criminalidade, é manter um controle social. Nosso objetivo é manter esse controle, não diminuir a zero.

Em julho, agosto e setembro, vários crimes aumentaram em Caxias, como os homicídios e os assaltos a ônibus. Naquele período, houve o parcelamento salarial e greve. O que aconteceu? Foi difícil manter a motivação dos policiais?
Foi muito difícil. Humanamente, isso trouxe reflexo direto no nosso servidor. Se passou uma ideia que se estava à vontade (que havia menos policiais por conta da greve de parte dos funcionários) e não se estava. Só que o indivíduo foi para o trabalho desmotivado, e alguém que está desmotivado não produz. O enfoque tem sido motivação, somos nossos psicólogos.

O sistema penal vem sofrendo críticas sobre as progressões de regime, a falta da ressocialização, o prende e solta. O sistema está falido?
Pessoalmente, eu acho que o sistema está ruim. Se tu visitar um presídio, vai ver que é um inferno. Ele contém um indivíduo violento e o torna mais violento. Temos dentro do sistema prisional presos que se institucionalizam presos. Ou seja, o indivíduo chega lá jovem, cometeu um delito, um roubo a pedestre, ele é preso e condenado a cumprir sua pena no presídio. O que acontece? Recebe visita, visita íntima, vai ter filhos. Ali, a família dele ainda é assistida. Eu não estou defendendo o preso. Ele sai mais violento, o sistema é cruel. Ele já tem mulher, filhos, que vai ter que sustentar. Ele não vai conseguir emprego, se ele já tem uma índole ruim, o que ele vai fazer? Por isso a reincidência é grande, 70% dos crimes são cometidos por reincidentes.

A redução da maioridade penal seria alternativa eficaz?

Se eu tivesse um sistema carcerário organizado, e que atingisse o seus objetivos pelo menos em parte, eu seria a favor da redução. Até porque os delitos, quando têm algumas figuras carimbadas soltas, aumentam. Quando prendemos, eles reduzem. O indivíduo contido não comete crime. Mas o sistema não permite essa solução porque tu prende um e tem mais 10 soltos. Eu sou a favor da redução porque vou contê-lo (o adolescente infrator), mas entendo que não vai resolver. Não é reduzindo a maioridade que tu vai conseguir resolver o problema da assistência básica.

Mas reduzir a maioridade e colocar esse adolescente junto com outros presos não é pior?
Com certeza, e é esse debate que tem que ser feito. A sociedade tem que pensar, vamos dar solução ou amenizar? Eu entendo que a gente precisa resolver a longo prazo. Mas hoje sou a favor da contenção mais rápida. Temos menores infratores com histórico criminal terrível.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

GATILHO FÁCIL


PMs gaúchos parecem estar com uma síndrome: na dúvida, atiram, quando poderiam tentar um bloqueio de veículo, o uso do megafone, as sirenes, qualquer técnica dissuasória que não uma arma

Por: Humberto Trezzi
ZERO HORA 14/01/2016 - 23h57min



Veículo foi alvejado três vezes Foto: JOSÉ LUIS COSTA / Divulgação

Você, que costuma tomar uns goles por aí e zanzar de carro, cuidado: mais do que multado e ter o carro apreendido, você pode ser morto. É isso que se depreende do lamentável episódio envolvendo o engenheiro Vilmar Mattiello. Ele errou ao passar o sinal fechado diante de uma viatura. E errou de novo ao passar correndo, sem parar, por outros PMs que tentavam detê-lo. Mas era motivo para pagar com sua vida?


Não. O simples fato de uma pessoa evitar a abordagem da polícia não significa que ela é foragida da Justiça ou sequer que é criminosa contumaz. Pode ser apenas um cidadão assustado e com temor de levar uma multa, como parece ser o caso de Mattiello. O problema é que muitos PMs gaúchos parecem estar com uma síndrome do gatilho fácil. Na dúvida, atiram, usando pistolas e espingardas, quando poderiam tentar um bloqueio de veículo, o uso do megafone, as sirenes, qualquer técnica dissuasória que não uma arma, capaz de exterminar uma vida e uma história, instantaneamente.


É um problema histórico. Lembro bem de um episódio em São Leopoldo no qual um tenista foi morto com tiro de espingarda porque, ao ser revistado por um PM, se mexeu. Outro episódio em Passo Fundo em que um motoqueiro morreu ao não parar numa barreira da BM. Fossem criminosos tiroteando com os policiais, o disparo dos PMs estaria plenamente justificado. Não eram. Será mesmo que furar um sinal vermelho ou se mexer durante uma abordagem justifica tiros pelas costas?




Especialistas reprovam abordagem da Brigada Militar que resultou na morte de engenheiro na Capital. "A polícia nunca pode atirar em alguém simplesmente porque a pessoa está fugindo", diz consultor em segurança

Por: Juliano Rodrigues
ZERO HORA 14/01/2016 - 17h47min |

A conduta do soldado que disparou três vezes contra o veículo conduzido pelo engenheiro Vilmar Mattiello, 58 anos, na madrugada desta quinta-feira, é criticada por especialistas em segurança pública consultados por ZH.

Segundo a Brigada Militar, Mattiello teria se recusado a parar em abordagem na Avenida Wenceslau Escobar, na Zona Sul. O engenheiro foi morto com um tiro no tórax. O consultor em segurança José Vicente da Silva diz que o PM errou ao atirar contra o veículo.


— Independente das condições, não se atira em carro que está em fuga. As pessoas dizem: "ah, então deixa fugir?". Sim. É preferível deixar fugir do que atirar e matar um inocente. O policial que está do lado de fora não tem como saber por que o veículo está em fuga. Pode ter um inocente dentro, uma pessoa sequestrada — afirma Vicente.


O consultor, que também é coronel e já comandou batalhões da Polícia Militar, conta que, anos atrás, um soldado e um cabo que estavam sob suas ordens envolveram-se em situação parecida.

— Um rapaz estava em uma motocicleta e fugiu de uma abordagem. Na hora, o soldado atirou e matou ele. Imediatamente, o cabo, que era o mais graduado naquele momento, prendeu o colega em flagrante. Era isso que deveria ter ocorrido — explica.

O tenente-coronel Diógenes Lucca, ex-comandante do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) da Polícia Militar de São Paulo e especialista em segurança, ressalva que não pode julgar a conduta dos brigadianos que participaram da ocorrência por não dispor de mais detalhes, mas lembra que os protocolos indicam atitudes diferentes das adotadas por eles.

— Quando você persegue um veículo suspeito em fuga, a própria presença da polícia faz o sujeito acelerar mais. Portanto, a perseguição policial é uma prática em desuso. Você tem de tentar acompanhar o veículo sem fustigá-lo e tentar coordenar um cerco para bloqueá-lo.

Lucca reforça que não se deve atirar contra um veículo que fura cerco policial:

— O tiro tem de ter um objetivo determinado, tem de ter endereço certo. Em uma situação de perseguição, é muito arriscado atirar. No limite, é melhor deixar fugir do que colocar pessoas em risco.


Vilmar Mattiello, 58 anos, não resistiu aos ferimentos Foto: Reprodução / Arquivo Pessoal

Natural de Xaxim, em Santa Catarina, o motorista, Vilmar Mattiello, era sócio da Construtora Epplan, com sede no bairro Azenha, na Capital. De acordo com relato do amigo do engenheiro a PMs, eles haviam bebido e o motorista, dono do carro, não quis parar o veículo.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - As forças policiais não podem se descuidar de duas técnicas importantes que necessitam os policiais - prática de tiro defensivo e imobilização pessoal. Aprimoradas estas duas técnica, fortalece a segurança necessária ao policial na hora da decisão de inopino e da ação imediata no enfrentamento de uma situação de crime. São técnicas permanentes e caras que o Estado NÃO coloca à disposição dos policiais e nem avalia a preparação deles. É por casos como este que os policiais precisam de uma formação de excelência, sem atropelos e com avaliações periódicas, especialmente em técnicas de tiro e de imobilização. Uma polícia preparada, eficiente e capacitada é cara, mas é um investimento social vital para o cidadão e para a população, e essencial para a justiça. Não é fácil ser policial onde as decisões são rápidas e envolvem risco de morte, aliadas ao estresse de um guerra diária contra o crime que fomenta erros de interpretação de casos e de decisão de tiro.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

QUAL É O VALOR DA SEGURANÇA PÚBLICA?


Brigada gastaria R$ 9 milhões a mais por mês para chamar concursados. Ingresso de 2,5 mil policiais militares aumentaria em 7,9% a folha de pagamento da corporação

Por: José Luís Costa
ZERO HORA 11/01/2016 - 03h03min



Menor efetivo em 33 anos faz Brigada carecer de 15,6 mil PMs Foto: Diego Vara / Agencia RBS

A convocação de 2,5 mil aprovados em concurso para a Brigada Militar (BM) elevaria em R$ 9,2 milhões mensais os gastos com salários de soldados, aumento de 7,9% na folha de pagamento da corporação, que é de R$ 116 milhões, considerando apenas os servidores da ativa e sem levar em conta horas extras e outras vantagens. Para este cálculo, ZH considerou o valor de R$ 3.680, incluindo salário inicial de R$ 2.828, mais parte de encargos sociais.

A possível chamada dos candidatos, em estudo pelo governo de José Ivo Sartori, amenizaria a crise na segurança, mas ainda está longe do ideal. O déficit é de 15,6 mil Policiais Militares (PMs), e, se fosse possível zerá-lo, os custos com salários cresceriam em R$ 57,3 milhões (49,4%). A defasagem no efetivo é a maior em 33 anos, e configura uma das causas da escalada da criminalidade, conforme reportagem publicada neste domingo em ZH.

Sartori sempre teve cautela ao falar sobre sua estratégia para reforçar a BM. Durante a campanha ao Piratini, em 2014, disse: "Os recursos têm de ter alocação orçamentária, evidenciando a prioridade que daremos à segurança". Mas, com contas no vermelho, nenhum PM foi contratado em 2015.

Agora, além de acenar com a possibilidade de chamar 2,5 mil PMs, Sartori retoma promessa feita por antecessores, de tirar policiais de áreas administrativas e colocá-los nas ruas, assim como aqueles cedidos a outros poderes.

– A pessoa mais interessada em ampliar o efetivo da BM é o governador, e a segunda, sou eu. São necessárias inclusões o mais rápido possível, mas enquanto isso não acontece, temos de aprimorar a gestão – afirma o coronel Alfeu Freitas, comandante-geral da BM.

Projeções da Secretaria da Fazenda apontam dificuldades para contratar os 2,5 mil soldados. Mesmo com aumento do ICMS, o orçamento de 2016 está comprometido – deve fechar com déficit de R$ 4,6 bilhões –, e o Estado atingiu 47,09% de gastos da receita corrente líquida com pagamento de pessoal, superando os 46,55% estabelecidos como limite pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Quando isso ocorre, ficam proibidos reajustes salariais, criação de cargos e contratações – a lei permite substituições de servidores em caso de morte ou aposentadoria nas áreas de segurança, saúde e educação. A Secretaria da Segurança Pública informa que já existe um plano para emprego dos aprovados em concurso caso venham a ser chamados.



Aposentadorias ampliam déficit

Se é difícil contratar 2,5 mil policiais militares, imagina 15,6 mil para completar o quadro da Brigada Militar (BM), cuja previsão é de 37.050. Não há registro de inclusões desse porte na BM.

As mais expressivas ocorreram entre 1990 e 1991 (somaram 7,9 mil homens). Foi em 1991, no primeiro ano do governo de Alceu Collares, o período no qual a BM alcançou o maior contingente – 29,9 mil para uma previsão de 30,6 mil.

São justamente PMs das turmas de 1990 e 1991, com 25 anos de serviços, que estão indo embora em massa. Só em 2015, saíram 2,1 mil policiais. Assim, a contratação de 2,5 mil concursados seria apenas medida paliativa de reposição.

A razão principal da debandada é a suspensão temporária de gratificação de permanência para quem tem direito à aposentadoria, provocada pelo corte de custos. Conforme o comando-geral da BM, o incentivo pago a 1,6 mil PMs engorda em até R$ 1,9 mil os salários.


A corrida para a reserva também se intensificou por causa do receio de mudança na legislação. Projeto do governo na Assembleia quer elevar o tempo de serviço exclusivo na BM de 25 para 30 anos.

– Se a proposta andar, serei o primeiro a incentivar colegas a irem embora. Seria mais um prejuízo para a categoria – afirma Leonel Lucas, presidente da Associação de Cabos e Soldados da BM.

O comandante-geral da BM, coronel Alfeu Freitas, reconhece que o fluxo de saídas pode crescer, mas assegura que trabalha pela criação de mais incentivos para manter os PMs nos quartéis.

Escassez de soldados

Considerando somente o quadro de soldados, a defasagem é superior aos 42% de toda a tropa. A BM deveria ter 22.041 soldados, mas conta com apenas 11.223, déficit de 49%.

Em 2015, nenhum PM foi contratado e 2,1 mil deixaram a BM, quase o dobro do ano anterior, que somou 1.264 aposentadorias.

Os gastos


Dos R$ 1,2 bilhão pagos mensalmente ao funcionalismo, o Rio Grande do Sul gasta R$ 451,1 milhões com servidores da segurança. Mais da metade, R$ 234,5 milhões (52%), é para pagamento de policiais e agentes inativos.

Para a BM, o Estado desembolsa R$ 278 milhões mensais, sendo R$ 162 milhões (58,3%) gastos com os servidores aposentados e R$ 116 milhões (41,7%) com policiais da ativa.

Dos R$ 116 milhões gastos com PMs em serviço, R$ 46,3 milhões, ou 40%, são destinados a pagar soldados, que representam 52,3% da tropa.

A contratação de 2,5 mil novos soldados elevaria os gastos mensais com salários em R$ 9,2 milhões, passando de R$ 116 milhões para R$ 125,2 milhões, aumento de 7,9% (sem considerar horas extras e outros benefícios variáveis)

Se fosse possível zerar o déficit e contratar 15.590 novos soldados, o custo com salários subiria R$ 57,3 milhões, passando de R$ 116 milhões para R$ 173,3 milhões, aumento de 49,4% (sem considerar horas extras e outros benefícios variáveis)


 


























































FALTA DE TUDO UM POUCO, ADMITEM AUTORIDADES


HUMBERTO TREZZI


Só com investimentos maciços em pessoal e tecnologia o RS escapará do círculo vicioso em que se transformou a questão da criminalidade. A opinião é de autoridades consultadas por ZH após a leitura da reportagem A Fórmula do Caos na Segurança, publicada domingo. Defensores, promotores e policiais são unânimes em constatar que falta tudo no setor da segurança, principalmente servidores e vagas penitenciárias. A seguir, as sugestões deles sobre como driblar as carências.

DEFENSORIA PÚBLICA

Ana Paula Pozzan, do Núcleo de Defesa em Execução Penal da Defensoria Pública Estadual, afirma que, em resumo, falta tudo no setor da segurança: servidores, prédios e vagas no semiaberto e no fechado.

– Há pouco, ingressei com habeas corpus coletivo contra o uso de delegacias como prisões. O policial civil não é carcereiro. Não há condições mínimas nas DPs para o preso ficar lá, comer lá, receber visitas, nada – avalia.

A defensora é a favor do uso da tornozeleira eletrônica em detentos condenados. Ela mudou de posição: era contra, por achar que constrangia os presos e também pelas falhas nos equipamentos.

Ana Paula diz que o número de defensores na área de execução penal na Grande Porto Alegre dá conta do recado, mas acredita que no Interior falte gente. Ela sugere uma providência ao poder público: que utilize todos os espaços nas prisões destinados à educação e ao trabalho de presos.

– Seja por falta de agentes ou de verba de custeio, muitas vagas escolares e de serviço não estão preenchidas. É o que acontece na Penitenciária Modulada de Montenegro, por exemplo. Como querem que o preso seja reeducado? Sairá pior. E as vagas estão aí, não custa muito prevenir – adverte.

SECRETARIA DA SEGURANÇA PÚBLICA

O secretário estadual da Segurança Pública, Wantuir Jacini (policial federal de carreira), preferiu não fazer novos comentários após ler a reportagem. Ele considera suficientes as novidades que informou antes da reportagem ser publicada: 2016 será marcado por abertura de novas vagas em presídios e mais uso de tornozeleira eletrônica.

A secretaria trabalha com a previsão de 1.246 novas vagas em cadeias públicas, a maior parte neste ano, além de 3 mil vagas em penitenciárias de Canoas e Guaíba (400 no início do ano, as demais quando houver nomeações suficientes de agentes). O secretário aguarda também confirmação, do governador José Ivo Sartori, para nomeação de PMs (não há data).

O número de tornozeleiras deve saltar de 1,1 mil para 2,6 mil este ano, conforme Jacini. Ele afirma preferir esse tipo de controle do que a flexibilização de progressão de regimes e a libertação de presos antes do cumprimento previsto da pena, como vem ocorrendo.

“Essa flexibilização leva para regimes mais brandos criminosos de maior potencial ofensivo, que não raramente voltam a delinquir. E gera retrabalho para as polícias, Ministério Público e Poder Judiciário, além de aumento na criminalidade”, resume Jacini, em nota enviada pela Secretaria da Segurança Pública.

MINISTÉRIO PÚBLICO

O promotor de Justiça Fabiano Dallazen considera a reportagem de Zero Hora um trabalho exemplar de investigação dos males do sistema de segurança no Rio Grande do Sul. Como saída, ele recomenda mais nomeações de servidores da segurança, sobretudo PMs. E investir em tecnologia, como as tornozeleiras, para todos os casos previstos em lei – em condenados, só exceções e não como regra.

Dallazen considera reprovável a prática de mandar para casa presos quando não há tornozeleiras suficientes.

– Cada vez mais interpretam tornozeleiras, saídas temporárias e indultos como uma maneira de resolver o problema de falta de vagas nos cárceres. Está errado esse excesso de benevolência. Tem de prender quem deve, soltar só quem já cumpriu o que deve – afirma o promotor.



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA -  QUAL É O VALOR DA SEGURANÇA PÚBLICA? Qual é o valor da liberdade, dos direitos fundamentais e da preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio? Infelizmente, vivemos num país em que a segurança, a vida, a saúde e a educação das pessoas não são prioridades para o Estado. As prioridades no Brasil são os partidos políticos, os privilégios dos altos cargos do poder e a ganância por impostos. Aqui os senadores e deputados gastaram em serviços postais  mais de 22 milhões de reais em 2015 e o só de auxílio moradia foram mais de 100 milhões de reais para a justiça. Isto sem falar no efeito cascata dos supersalários, nas demais verbas indenizatórias e nas emendas parlamentares usadas para trocas de favores no poder político tiradas das arrecadações recordes em impostos exorbitantes cobrados do povo, sem retorno em direitos fundamentais. 

Nesta hora, lembro daquele prefeito de NY que tinha como prioridade a segurança da população, investindo em mais de 15 mil policiais e suporte tecnológico. Ele dizia que podia faltar dinheiro para outros setores, mas não podia faltar para segurança. E NY se tornou um exemplo nos EUA e no mundo em segurança pública, transformando o prefeito e os chefes de polícia em personagens admirados e seguidos até pelo resto do mundo.

domingo, 10 de janeiro de 2016

RITUAIS DE SOFRIMENTO NA FORMAÇÃO PM




Por BBC | 05/01/2016 07:19

Rituais de sofrimento em treino alimentam violência policial, diz capitão da PM. Oficial que investiga formação educacional das PMs no Brasil questiona modelo militarista e identifica abusos em cursos e privação de sono, pauladas, tarefas em salas impregnadas de gás lacrimogêneo e pimenta, almoço misturado com água e consumido com as mãos imundas de terra e pus, humilhação e assédio moral praticados por superiores.


As cenas, registradas em um curso recente de formação policial no Brasil, se repetem pelo país. Expõem ainda o predomínio, no treinamento das PMs, de uma "pedagogia do sofrimento" que acaba por alimentar a violência de seus agentes nas ruas.

A conclusão é do capitão da PM da Paraíba Fábio França, que colheu relatos de participantes de um estágio de aperfeiçoamento realizado em agosto de 2014 em uma Polícia Militar do país - o Estado não é revelado na pesquisa porque os chefes da corporação pediram para "resguardar a imagem da instituição".Divulgação/Governo do Maranhão
Curso de formação de policiais no Maranhão em 2015: treinamento reforça ideal bélico e reproduz violência, avalia pesquisador e capitão da PM

Mestre e doutor em sociologia, França especializou-se no estudo da formação dos profissionais de segurança pública no Brasil.

Com 35 anos de idade e 13 de PM, o capitão cunhou a expressão "pedagogia do sofrimento" para caracterizar o modelo de cunho militarista que, segundo ele, predomina na educação policial no país, baseado em valores como masculinidade, virilidade e exaltação ao combate bélico.

Para ele, essa pedagogia está ligada a um "ethos (conjunto de costumes e hábitos) guerreiro", que legitima a "construção de uma vontade bélica de proteger a sociedade".

"A crença geral é que o treinamento baseado em violência psicológica, moral e até física é necessário para condicionar o corpo e a mente dos soldados para vencer o medo e o perigo, e ter coragem para o embate no que seria uma guerra urbana", afirma França, que relaciona o fenômeno ao que aponta como "herança ditatorial" das PMs brasileiras.

'Se não aguentar, corra'

Em conjunto com a colega de PM Janaína Gomes, o capitão reuniu depoimentos de participantes de um curso de formação de um pelotão especial de patrulhamento em motos.Divulgação/Governo do Rio
Cadete em treinamento na Vila Cruzeiro, no Rio, em 2012: lógica do confronto se sobrepõe a valores como negociação e relação com comunidade, conclui estudo

Para os autores, que publicaram os resultados do estudo na última edição da revista do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os rituais do treinamento reforçam a "pedagogia do sofrimento" em detrimento de valores como comunicação, solução de problemas e relação com a comunidade.

"Na obtenção de um 'brevê de virilidade militar', é necessário um aprendizado voltado para o sofrimento físico e para as dores morais", escrevem os policiais e especialistas em segurança.

Nesse contexto, aponta França, mulheres que apostam na carreira policial acabam obrigadas a "introjetar o papel dominador da maioria masculina" para conseguir espaço em um "universo marcado pelo preconceito" de gênero e contra homossexuais.

Uma aluna do curso, por exemplo, relatou como os participantes eram molhados com água gelada durante a madrugada, entre outras privações.


"Além de banho de água gelada na madrugada teve também gás. Eles colocaram a gente dentro de uma sala, mandaram a gente tirar a camisa, colocar a camisa no olho, gasaram (lançaram gás lacrimogêneo ou de pimenta) a sala e desmontaram a pistola para a gente montar, e só saía da sala quem conseguisse montar a pistola", afirmou a militar aos pesquisadores.

Outro participante reclamou de uma situação em que a saúde dos alunos foi, segundo ele, colocada em risco.

"No horário de almoço da gente, pegaram as quentinhas e jogaram dentro de um isopor sujo. Aí botou (sic) a gente pra comer com a mão, a mão suja do dia todinho pegando na moto, pagando flexão, com a mão suja cheia de pus, tinha muita gente com a mão inflamada. A gente parecia um bando de animais", disse.

Reprodução da violência

Os relatos colhidos pelos pesquisadores militares da Paraíba reforçam os resultados de uma pesquisa recente com 21 mil policiais no Brasil, que mostrou que 30% deles já tinham sofrido abusos físicos ou morais dentro de suas próprias instituições.


Segundo o levantamento de 2014, realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Fundação Getúlio Vargas e Secretaria Nacional de Segurança Pública, 28% dos policiais ouvidos afirmaram ter sido "vítima de tortura em treinamento ou fora dele" e 60% narraram situações de desrespeito ou humilhação por superiores hierárquicos.Divulgação/Governo do Maranhão
Treinamento na PM do Maranhão: mulheres que apostam na carreira policial acabam obrigadas a "introjetar o papel dominador da maioria masculina", diz capitão da PM da PB

Para França, esse tipo de formação acaba motivando um efeito dominó, em que as vítimas passam a naturalizar e transmitir a violência adiante.

"Os alunos interiorizam as regras morais e vão exteriorizá-las no cidadão comum, que é o 'paisano', o 'civil', uma categoria diferente. Você sempre irá buscar uma válvula de escape para a ordem, a coerção moral", afirma o capitão.

A pesquisa registrou pelo menos um caso de violência física contra alunos, em que instrutores aproveitavam a superioridade hierárquica e a ausência do coordenador do curso para "resolver (problemas com) desafetos".

"Um instrutor que estava querendo 'tirar' um aluno que não foi com a cara pegou um pedaço de pau dentro da mata. (...) Aí ele pegou e bateu num aluno que quebrou o pedaço de pau, que o pedaço de pau voou longe na perna do dez (aluno), aí o dez deu um suspiro forte e caiu no chão do meu lado", relatou um participante.

Visão da polícia

Para o comandante do centro de educação da Polícia Militar da Paraíba, coronel Carlos Alexandre Sobreira, a formação "tem que ser dura e levar às vezes a extremos" para que o policial vivencie situações que encontrará nas ruas, mas não deve propor o "sofrimento pelo sofrimento".

Ele diz acreditar que as polícias no Brasil ainda estejam em processo de transição democrática, e reconhece que um policial desrespeitado na formação tenderá a reproduzir esse comportamento nas ruas.

"Por isso temos buscado uma metodologia de ensino voltada para humanismo, respeito e dignidade do cidadão", afirmou Sobreira, citando ênfase em temas de direitos humanos e policiamento comunitário. "O policial tem que tratar bem o cidadão, conhecer bem os problemas sociais e não ser alguém que traga mais transtornos."

No treinamento, contudo, diz o comandante, é preciso encontrar um equilíbrio. "Não podemos florear, é preciso trazer o máximo de realidade possível para a formação."

Mudança social
Os autores da pesquisa concluem que as narrativas dos alunos expõem a resistência das instituições policiais às mudanças - algo que, segundo ele, as PMs precisarão superar para não perderem ainda mais confiança na sociedade.

"Mesmo que exista a crença policial militar de que esse tipo de pedagogia seja necessária para fazer o PM crer que o curso o habilita e o fortalece para as situações encontradas nas ruas, as experiências escolares com os PMs mostram a falta de preparo profissional dos instrutores que enaltecem o sofrimento e desconhecem a lógica de poder e dominação presente nas ações desencadeadas por eles mesmos", afirmam.Abr
Tropa de choque da PM em ação em protesto em Niterói (RJ) em 2013: para pesquisador, sofrimento em cursos é exteriorizado por policiais nas ruas

França, que atua como professor de Criminologia no Centro de Educação da PM da Paraíba, diz acreditar que exista uma nova geração de policiais ingressando nas instituições, com maior bagagem cultural e educacional, e que pode tornar as polícias mais permeáveis a críticas.


"Há integrantes de PMs, por exemplo, que não aceitam as críticas que faço. Mas não há como as PMs voltarem atrás, elas têm que se adequar à realidade democrática do país."

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

O PODER DAS GUARDAS MUNICIPAIS





ZERO HORA 07 de janeiro de 2016 | N° 18407


EDUARDO PAZINATO*



Uma maior integração entre Estados e municípios na segurança pública afigura-se absolutamente necessária. A criação de um sistema integrado congregando esforços das agências estaduais e municipais em prol do controle da criminalidade, encampado pela Secretaria Estadual da Segurança Pública, merece ser saudada. Os cerca de 2.945 guardas municipais gaúchos, como aponta o Atlas da Municipalização da Segurança Pública RS de 2015, podem e devem exercer um papel diferenciado e protagônico no âmbito de uma estratégia mais ampla de policiamento de proximidade nas cidades.

A Lei 13.022/2014 conferiu novas identidades socioprofissionais às guardas municipais, como corporações de caráter civil, uniformizadas, eventualmente armadas, com a função de proteção municipal preventiva. Não obstante, muitos são os sentidos em disputa nesse processo de assunção de novas responsabilidades político-institucionais pelos municípios e pelas guardas municipais. Destarte, é imperioso rechaçar a transferência direta de encargos do Estado para os municípios, sem a devida contraprestação técnica e financeira para tanto, o que inviabilizaria, de plano, a integração sistêmica pretendida. De igual modo, deve ser evitada a reprodução de práticas profissionais tradicionais e reativas advindas da colonização dos seus saberes pelas forças policiais.

O Estatuto Geral das Guardas Municipais não as dotou de poder de polícia em sentido amplo, tampouco da faculdade de portar armas de fogo. Pela sua natureza, a exemplo de outras instituições de regulação e fiscalização, possuem poder de polícia administrativo em sentido estrito. O porte de arma de fogo também já é uma realidade desde o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003), mediante o cumprimento de requisitos prévios.

A grande novidade consiste, pois, na transição de uma Guarda Municipal adstrita à proteção do patrimônio físico e material dos próprios públicos municipais para uma Guarda Comunitária, talhada para intervenções mais dialógicas voltadas à segurança dos direitos da população, na defesa da vida. Este, sim, seu maior poder.

Coordenador do Núcleo de Segurança Cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma)*

CONTRATAÇÃO DE POLICIAIS NO RS NÃO PODE ESPERAR






JORNAL DO COMÉRCIO 06/01 às 21h20min



EDITORIAL


Contratação de policiais no Estado não pode esperar

 

É consenso que a sensação de segurança não melhorou para ninguém nos últimos tempos. Pelo contrário. Diariamente, gaúchos são vítimas, presenciam ou escutam relatos de casos de violência, roubos, assaltos, tentativas de sequestro e assassinatos.


E quando até o governador do Estado admite que o quadro é difícil e ainda pode piorar, como fez José Ivo Sartori (PMDB) em entrevista publicada ontem no Jornal do Comércio, fica claro que a situação é crítica.


Não é de hoje que a segurança pública é uma pauta prioritária para a sociedade gaúcha, que clama por mais policiamento ostensivo. Também é verdade que esse desafio não está restrito ao Estado, atinge todo o Brasil, como bem observou o governador Sartori. Mas o fato é que essa realidade atemorizadora não pode continuar se agravando, é imprescindível reagir imediatamente, e isso passa por mais brigadianos nas ruas.


A questão é que, a persistir o panorama atual, a situação só vai se agravar. Teremos cada vez menos policiais e a criminalidade seguirá crescendo. Para dar um freio imediato a isso, é, sim, forçoso contratar imediatamente mais policiais a Brigada Militar espera 2 mil aprovados em concurso público e a Polícia Civil, 661. Isso nem de longe repõe o efetivo, mas é um auxílio importante.


Dois argumentos tem sido levantados com frequência nesse debate, quando o governo é cobrado a contratar brigadianos. Um deles é que o problema da segurança não vai ser resolvido apenas com mais repressão e policiais. O outro é o problema das contas públicas do Rio Grande do Sul, citado como impeditivo para chamar novos servidores o governador Sartori chegou a dizer, na entrevista ao JC, que se orgulha de não ter contratado ninguém em 2015.


É evidente que ninguém acredita que a insegurança será resolvida apenas com "um policial em cada esquina". O trabalho vai muito além disso, e inclui inteligência, prevenção, assistência social, oportunidades, engajamento comunitário e, fundamentalmente, educação. Entretanto, é forçoso reconhecer que, no contexto atual, são necessárias medidas emergenciais, a começar por mais policiais nas ruas.


Em relação ao equilíbrio financeiro, é louvável tentar gastar apenas o que se arrecada. Contudo, os bandidos não vão esperar o Estado colocar as contas dias para atuar. E o pior é que as medidas de contingenciamento de gastos tem incentivado uma redução no efetivo, seja pelo congelamento de promoções e aumentos salariais o que acelera a aposentadoria de brigadianos, que preferiam seguir na ativa em função desses benefícios , seja pelo corte das horas extras (usado para compensar o déficit de pessoal) e a proibição de novas contratações para repor o quadro.


Sartori tem dito que sua prioridade é a segurança pública. Então, governador, mantenha esse objetivo no foco e contrate os tão demandados profissionais da Brigada Militar e Polícia Civil o quanto antes.
Hoje é Dia do Leitor. Queremos expressar nosso respeito e admiração ao nosso público, por quem nos esforçamos diariamente para produzir um conteúdo ágil, diferenciado e aprofundado, a fim de mantê-lo bem informado, através da nossa edição impressa e pelo nosso site. Nós, do Jornal do Comércio, agradecemos e parabenizamos nossos leitores por este dia.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

GUARDA MUNICIPAL NÃO É A BRIGADA MILITAR


"Por mais que tenha treinamento, não é a Brigada Militar", diz Sebastião Melo. Prefeito em exercício de Porto Alegre não concorda com a proposta de atuação da Guarda Municipal no policiamento

Por: Adriana Irion
ZERO HORA 02/01/2016 - 04h05min




Foto: Luciano Lanes / Prefeitura de Porto Alegre


O prefeito de Porto Alegre em exercício, Sebastião Melo (PMDB), não concorda com a atuação da Guarda Municipal no policiamento de rua. Diz que para isso ocorrer, as competências em relação à Segurança Pública teriam de ser mudadas em lei. Leia trechos da entrevista que concedeu a Zero Hora:

Como a prefeitura vê a proposta de atuação da Guarda Municipal como polícia?

Segurança pública tem de ter sistema integrado envolvendo o governo federal, que tem de vir para essa conversa do ponto de vista de ações concretas e com recursos para os Estados, que hoje não têm dinheiro para nada. O município tem um papel que não é só o da Guarda. Uma cidade bem iluminada é um fator decisivo de segurança. Quando ilumina parques, é fator de segurança. Essas ações se complementam com a atuação das guardas.

Como a Guarda atua na Capital?

Nós temos, como outras cidades, efetivo reduzido. Às vezes, nos perguntamos "o que não faz a Guarda Municipal"? Por exemplo, uma criança tem um surto numa escola, a diretora chama a guarda. Uma grávida que não tem como ir para hospital, a guarda leva. Pichação, é com a Guarda. A Guarda tem múltiplas ações. Tem de trabalhar residualmente, muito integrada com todo o sistema de segurança. Esse debate é mais do que debate, já existe hoje um bom entrosamento.

É viável a Guarda fazendo policiamento?

Não enxergo a Guarda assim. Enxergo trabalhando residualmente na segurança pública. Por mais que tenha treinamento, não tem o treinamento de uma polícia ostensiva como é a Brigada Militar. Ela residualmente pode e deve agir.

O que é o residualmente?

Você tem os parques da cidade onde a Guarda faz ronda. Ela pode, ao encontrar determinada situação, abordar. Mas em outras situações não vai poder abordar, vai ter que se comunicar com a BM para que juntos ajam. Um trabalho integrado, especialmente zelando pelos espaços públicos. Não vejo hoje no Brasil, não vejo em Porto Alegre, essa condição de destacar a Guarda para estar na linha de frente da segurança. Ela tem de trabalhar residualmente, entrosada e articulada com as forças de segurança estaduais.

Não é possível nem para o futuro, com treinamento adequado?

Aí temos de pensar o que existe em outros países. Nos EUA, a segurança pública é cuidada pelas prefeituras. Aqui essas competências não são nossas. Para ter isso no futuro, teria de fazer uma inversão, o Brasil teria de decidir: as polícias passam a ser de competência dos municípios? Então vamos dotar os municípios nessas condições. Hoje, não é assim. O guarda não tem preparo para enfrentar essa criminalidade. Não concebo segurança pública com apenas mais brigadianos ou guardas nos espaços públicos. O fator segurança pública é muito mais complexo do que ter mais PMs nas ruas. O Brasil só vai melhorar em segurança quando tiver mais colégio integral, as crianças com acesso a cursos profissionalizantes, quando não se faça do Presídio Central e de outras cadeias a indústria do crime. Não é um ato isolado que vai melhorar a segurança. Quando tu botas GPS e botão de pânico nos táxis, é fator que ajuda. São várias ações integradas. Milagre não tem.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Mais um político que trata a segurança pública como um "sistema"  e não como um "direito", equívoco generalizado e incluído na constituição por efeito de 20 anos de ditadura militar. Assim como ocorre com a União, os Estados também abandonaram os municípios considerados entes federativos autônomos pela lei maior do Brasil. O direito à segurança público é um dos mais precários e os munícipes estão entregues á própria sorte perdendo vidas, patrimônio e liberdade. A Brigada Militar que tem na sua razão de existir o policiamento ostensivo preventivo está uniformizada e aparatada para atender e enfrentar o crime, não para prevenir os delitos. Se a BM não mudar a prioridade, é neste hiato que as guardas municipais vão se fortalecer e ocupar os espaço, já que a população aterrorizada e enjaulada anseia por este direito.

GUARDAS MUNICIPAIS COM PODER DE POLÍCIA EM DEBATE





ZERO HORA 02 de janeiro de 2016 | N° 18402


ADRIANA IRION E HUMBERTO TREZZI


ESTADO PROPÕE UTILIZAR 2,6 MIL SERVIDORES de 26 cidades para reforçar combate à criminalidade. Mas prefeituras questionam proposta pelo custo de manter as estruturas



Proposta como alternativa para a carência de efetivos no combate à criminalidade, a integração das Guardas Municipais ao trabalho das polícias poderia garantir hoje um incremento de 2,6 mil servidores nas fileiras da segurança pública, pinçados dentre funcionários de 26 cidades. A ideia é defendida pela Secretaria da Segurança Pública (SSP), mas vista com cautela por gestores municipais por causa de um detalhe de peso: o custo para a manutenção dessas estruturas.

– Os municípios, com raras exceções, não têm como bancar esse custo, assumir mais esta demanda, que é de responsabilidade do Estado e da União. Não que eu não queira ou a ideia não seja boa. O problema é o recurso para isso – diz Luiz Carlos Folador (PT), presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) e prefeito de Candiota.

Independentemente de valores envolvidos, o projeto tem outros percalços a enfrentar. O principal é a vontade de atuar na segurança. Em 2014, a Lei 13.022 deu às guardas poder de polícia. Um ano depois, há cidades que se esforçam com as estruturas que têm para já fazer um trabalho nessa linha e, outros, que resistem, reforçando a ideia de que as guardas têm como função primordial a proteção patrimonial de bens do município.

Em Porto Alegre, parte dos agentes municipais usa arma, e o trabalho não tem foco em policiamento. O prefeito em exercício, Sebastião Melo (PMDB), diz que os guardas não têm preparação para atuar na linha de frente da segurança. Enquanto o debate se impõe pela necessidade de reforçar efetivos insuficientes para o combate à criminalidade, há municípios que já estão em outro ritmo. Um exemplo é Novo Hamburgo, que firmou convênio com a SSP para formar guardas de outras cidades e que tem tradição de atuar como polícia municipal, prendendo quando necessário.

Conforme a Associação de Secretários e Gestores Municipais de Segurança Pública do Estado (ASGMUSP), das 26 guardas existentes hoje no RS, 15 trabalham em algum grau no policiamento ostensivo e 14 fazem uso de arma de fogo.

– Em torno de 40% das guardas estão preparadas para fazer segurança nas ruas, em calçadões, áreas comerciais, a maioria com viaturas (e não com o agente a pé, como faz a Brigada Militar). Isso é importante (estar na rua), porque o que dá a sensação de segurança ao cidadão é a visibilidade do agente. Mas é preciso aperfeiçoar – diz Mauro Moro, presidente da ASGMUSP.

SECRETARIA QUER SISTEMA INTEGRADO DE SEGURANÇA

Foi o titular da SSP, Wantuir Jacini, que colocou em debate um sistema integrado de segurança dos municípios com o Estado. O objetivo é reunir esforços – recursos de pessoal e material – para fechar o cerco à violência. Por exemplo: a SSP pretende integrar os sistemas de videomonitoramento que cada município mantém isoladamente.

– Hoje, se roubam um carro na cidade A e vão para a cidade B, passam nas câmeras e ninguém sabe que o carro é roubado. É preciso ter um sistema: a placa é colocada no sistema, por onde o carro passar vai estar sendo monitorado, vão fazer barreira e prender. Queremos que os municípios se integrem entre eles e conosco – destaca Jacini.

A associação presidida por Moro aprova a parceria, mas aponta o que o Estado precisa dar: formação e treinamento padronizados por parte da SSP, acesso dos guardas ao sistema Consultas Integradas – que reúne dados de órgãos da segurança – e participação nos sistemas de comunicação. Em Novo Hamburgo (leia ao lado), os guardas têm acesso ao Consultas, para conferir foragidos e carros roubados ou furtados.

Segundo a SSP, o Estado já propôs o treinamento padronizado. Também está em discussão o acesso a informações e a possibilidade de existir um número único de emergência, que serviria para acionar qualquer um dos órgãos integrantes do sistema de segurança.


Uma alternativa prevista em lei


Criadas para dar proteção aos bens, serviços e instalações municipais – conforme artigo 144 da Constituição Federal de 1988 –, as guardas municipais ganharam há pouco status similar aos das polícias estaduais. Ou seja, viraram alternativa à segurança pública no Brasil.

Em 15 de agosto de 2014, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei 13.022, que formaliza o poder de polícia. O documento acrescenta aos deveres das guardas a missão de proteger vidas, com direito a porte de arma, e não apenas patrimônios, como antes. Podem, inclusive, atuar em conjunto com órgãos de segurança pública, agindo em situações de conflito, por exemplo.



RIO TEM 8 MIL AGENTES. EM SP, REPRESSÃO AO CRIME


É a formalização de uma performance que há anos é adotada por guardas civis do Rio e São Paulo. No Estado fluminense, por exemplo, são 8 mil guardas. Eles patrulham as praias contra furtos, tendo realizado centenas de prisões nos últimos meses. Fazem também rondas escolares e reprimem comércio clandestino de ambulantes. Eles dispõem, inclusive, de uma academia própria para formação e treinamento de pessoal.

Em São Paulo, a Guarda Civil Metropolitana atua há mais de uma década como polícia municipal. Reprime, além de comércio clandestino, o tráfico de drogas e até casos de tráfico de pessoas, em situações como cárcere privado, trabalho escravo e exploração sexual. Em janeiro de 2015, salvaram uma mulher que era vítima de tentativa de estupro. Em outro caso, trocaram tiros com ladrões de banco.



A ATRIBUIÇÃO DE CADA UM

POLÍCIA MILITAR -Faz patrulhamento (policiamento preventivo) e reprime crimes em andamento.

POLÍCIA CIVIL -Investiga crimes já ocorridos, solicita e cumpre mandados de prisão. Ocasionalmente, prende em flagrante.

POLÍCIA FEDERAL -Investiga crimes da esfera federal, tráfico internacional e crime organizado em geral.

GUARDA MUNICIPAL -Faz patrulhamento, protege bens públicos e reprime crimes em andamento.



Em Novo Hamburgo, efetivo local equivale a batalhão da BM


Os 190 guardas municipais de Novo Hamburgo atuam como policiais há mais de uma década. Cada um deles tem direito a usar um revólver – com porte permanente – e, em horários de serviço, recebem uma pistola, partilhada com colegas de outros turnos (são 78, em sistema de rodízio). Todos treinam, e a corporação acaba de construir “o maior estande de tiro” do Rio Grande do Sul, com salas de treino climatizadas.

Em janeiro, o efetivo deve aumentar para 220 agentes, o que tornará o contingente similar ao da Brigada Militar do município – são cerca de 250 PMs, um batalhão, hoje. O inspetor-chefe dos guardas municipais novo-hamburguenses, Erlínio Botega, diz que, na prática, os seus comandados agem como policiais: prendem assaltantes e traficantes, atuam contra desmanches de veículos e, em alguns casos, até fazem transporte de presos – tudo apoiado por videomonitoramento, embasado em 69 câmeras espalhadas pela cidade.

– Deixamos há muito aquele papel passivo, de guarnecer prédios. Meus guardas prenderam vários criminosos na Operação Papai Noel, que patrulha o centro nesta época de festas. Não queremos substituir as polícias, mas achamos que devemos apoiá-las – resume Botega.

Foram realizadas 106 prisões de janeiro a novembro de 2015 e recuperados 54 veículos furtados ou roubados. O vencimento dos guardas é hoje melhore que o dos PMs, ao ponto de policiais desistirem da carreira e fazerem concurso municipal, em busca de melhores rendimentos. O salário inicial é de R$ 2,1 mil, acrescido de adicional de risco de vida e outras vantagens, que elevam o valor para cerca de R$ 4 mil.

Mediante convênio com a Secretaria Estadual da Segurança Pública, Novo Hamburgo formará agentes para outros municípios. A academia local ministra 600 horas/aula aos novatos, algo que varia de quatro a seis meses de ensinamentos.

E o custo disso? É um dos mais altos dentre as secretarias municipais da cidade, mas Botega explica que o gasto é diluído, já que os guardas atuam também no trânsito e parte do valor das multas é revertida ao sustento da Secretaria de Segurança e Mobilidade Urbana, à qual os guardas são vinculados.



COMO FUNCIONA EM OUTROS PAÍSES

Estados Unidos – As polícias, nos EUA, nasceram municipais. São 12,3 mil corporações deste tipo, além das estaduais e agências federais. Só depois de décadas da independência, os Estados norte-americanos criaram polícias estaduais e a Polícia Federal (FBI). O xerife, tão conhecido nos filmes de faroeste, desempenha o papel de chefe de polícia municipal, que conta com ajuda de deputies (delegados). As polícias municipais contam inclusive com setor de investigação (missão que as Guardas Civis do Brasil não podem realizar).

Holanda – A polícia municipal existe em toda cidade com mais de 25 mil habitantes. É o maior efetivo – representa dois terços do total de policiais do país.

Bélgica – Polícias municipais representam metade do total de policiais do país.

Inglaterra – Tem polícias comunitárias que estão sob gestão municipal. E uma Polícia Metropolitana (abrange Londres e arredores) que inclusive tem corpo de investigação, não­uniformizado.

Espanha – Além das polícias nacionais, tem corporações comunitárias e locais, comandadas pelos municípios. Desempenham função semelhante à Guarda Municipal no Brasil. Fazem patrulhamento, mas não realizam investigações.

Fonte: Polícias e Sociedades na Europa (Jean-Claude Monet) e Padrões de Policiamento (David H.Bailey)



GUARDAS NO RS

-No Rio Grande do Sul, 26 municípios têm Guarda Municipal, com um total de 2.665 agentes.

- Das 26 corporações, 15 atuam fazendo policiamento ostensivo, com cerca de 2,1 mil servidores.

-Em 14 municípios, os agentes municipais já trabalham com arma de fogo.
-Em torno de 40% das guardas têm preparação para atuar na segurança de rua, mas ainda precisam de aperfeiçoamento.

-São destacadas como exemplo de funcionamento próximo ao ideal as guardas de Novo Hamburgo, Caxias do Sul e São Leopoldo.

- Uma das expectativas de autoridades municipais é de que a SSP promova a formação e o treinamento padrão para os servidores das guardas.



CIDADES COM GUARDAS MUNICIPAIS INSTALADAS

Com atuação na proteção municipal preventiva, ostensiva fardada e armada:
Cachoeirinha
Caxias do Sul
Canoas
Estância Velha
Esteio
Gravataí
Novo Hamburgo
Porto Alegre
Pelotas
Rio Grande
São Leopoldo
Sapucaia do Sul
Santa Cruz do Sul
Santa Maria
Vacaria

Com atuação na segurança patrimonial municipal

Alvorada
Alegrete
Canela
Flores da Cunha
Imbé
Montenegro
Santiago
São Sebastião do Caí
Sapiranga
Uruguaiana
Viamão




COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - SUBSISTEMA POLICIAL...A guarda (ou polícia) municipal armada e com poder de polícia é uma tendência diante da insuficiência, abandono e inoperância das policiais militares na ocupação, patrulhamento, permanência e aproximação do policiamento ostensivo preventivo nos bairros das cidades. No uniforme, nas estratégias e nas ações táticas que vêm empregando, as polícias militares revelam que a prioridade é a contenção e o atendimento de ocorrências, salvo raras iniciativas comunitárias preventivas.