A Policia exerce função essencial à justiça. Não é instrumento político-partidário. A segregação pela justiça e a ingerência partidária em questões técnicas e de carreira dificultam os esforços dos gestores e operadores de polícia, criam animosidade, desviam efetivos e reduzem a eficácia e a confiança do cidadão nas leis, na polícia e no sistema de justiça criminal que, no Estado Democrático de Direito, garante a ordem pública e os direitos da população à justiça e segurança pública.
ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.
sábado, 18 de junho de 2011
A INEFICÁCIA DA PRISÃO NO BRASIL E A DESMORALIZAÇÃO DA POLÍCIA
A INEFICÁCIA DA PRISÃO NO BRASIL - ALI MAZLOUM, JUIZ FEDERAL EM SÃO PAULO. É PROFESSOR DE DIREITO CONSTITUCIONAL - O Estado de S.Paulo - 18/06/2011
Começam a pulular acerbas críticas à nova sistemática de prisão cautelar (em flagrante e preventiva). A partir do dia 4 de julho, data da entrada em vigor da Lei n.º 12.403/2011, o processo criminal poderá mudar a cara do Judiciário. Avaliações preliminares indicam que cerca de 100 mil presos serão imediatamente postos em liberdade.
Para alguns, a lei tornará inviável a decretação da prisão preventiva, permitindo que autores de delitos graves permaneçam soltos durante o processo. Além disso - o que já não é pouco -, praguejam contra as inovadoras medidas cautelares, que despontam como alternativas ao cárcere antes da condenação definitiva. O Estado - argumentam esses críticos - não terá condições de fiscalizá-las. Enfim, proclama-se a coroação da impunidade no Brasil!
Os dotes da nova lei, porém, não podem ficar obnubilados pelo pessimismo incauto. As mudanças são boas e vêm de encontro ao degradante e crescente "populismo judicial", que fez da fama ou fortuna do acusado requisito de prisão cautelar. É alvissareira a lei. Obrigará o juiz a estudar autos de flagrante e decidir, desde logo, pelo relaxamento da prisão, quando ilegal; pela conversão do flagrante em prisão preventiva, na hipótese de ineficácia da medida cautelar; ou, pela concessão da liberdade provisória, com ou sem fiança.
O conteúdo misto das normas estabelecidas pela lei acarretará a aplicação imediata dos dispositivos de natureza processual, sem prejuízo dos atos anteriores, ao mesmo tempo que retroagirá quanto aos normativos penais benéficos. Portanto, com a vigência das novas regras, juízes e tribunais deverão imediatamente chamar à conclusão todos os feitos envolvendo prisão provisória para a indeclinável confrontação com o nascituro modelo.
Perceba-se a sutileza da mudança: os presos que deixarão imediatamente o cárcere, ao contrário do que pregam os antagonistas da lei, são justamente os que nele não deveriam estar. Rompe-se com o modelo perverso pelo qual novatos aprendem com veteranos do crime.
Por outro lado, a nova sistemática confere ao Estado maior controle sobre o agente. Se entre a liberdade e a prisão nada mais havia, doravante o juiz terá à sua disposição nada menos que nove medidas cautelares de alto impacto pessoal e social. Perceba-se: as medidas cautelares funcionarão como uma espécie de "período de prova preventivo" durante o processo. O descumprimento de obrigações impostas renderá ensejo ao decreto prisional.
A sociedade poderá ficar mais tranquila sabendo que um possível culpado, solto, estará sendo monitorado durante o processo, ao mesmo tempo que um presumido inocente não será levado à prisão injustificadamente. Esse é o paradigma constitucional. Desde 1988, nossa Carta Política impõe ao Estado que ninguém seja levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade (inciso LXVI do artigo 5.º). A prisão é a ultima ratio.
Enfatize-se, por conseguinte, que a lei não acaba com a prisão preventiva, como apregoam os mais afoitos. Será ela de três tipos: inicial, derivada e substitutiva. Inicial quando decretada durante a investigação ou o processo, derivada se resultar da conversão do flagrante e substitutiva em lugar de medidas cautelares descumpridas pelo agente.
Os pressupostos, como antecedente indispensável à aplicação da medida extrema, passam a ser de três ordens cumulativas: prova da existência do crime, indícios sérios de autoria (artigo 312, in fine) e ineficácia - inadequação ou insuficiência - das medidas cautelares (artigo 282, parágrafos 4.º e 6.º, c.c. artigo 312, parágrafo único). Os requisitos da prisão preventiva, como exigência de validade do ato, continuam os mesmos (artigo 312, primeira parte) e são alternativos: garantir a ordem pública ou econômica, assegurar a aplicação da lei penal, ou necessidade da instrução criminal.
Presentes as citadas hipóteses, alguma das seguintes condições haverá de estar presente, alternativamente: prática de crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos; ou prática de crime doloso punido com pena privativa de liberdade, tendo o agente condenação definitiva anterior por crime doloso; ou para garantir a execução de medida protetiva aplicada em crimes envolvendo violência doméstica e/ou familiar; ou, por último, em face de dúvida séria e fundada sobre a identidade civil do autor do crime, que se recusa a solvê-la.
Em situações excepcionais, a prisão preventiva poderá ser substituída pela prisão domiciliar. E questões humanitárias, que vão muito além do clamor da turba e seus desejos de vingança, justificam esse abrandamento. Será a hipótese do agente maior de 80 anos ou extremamente debilitado por motivo de doença grave. Também a gestante a partir do sétimo mês de gravidez, ou sendo esta de alto risco, poderá ser beneficiada com a medida. Caberá ao juiz deferir a prisão domiciliar diante de prova idônea dos requisitos legais.
A liberdade, com ou sem fiança, repita-se, é a regra. O instituto da fiança ganha status de medida cautelar e prestigia sobremaneira a vítima, que nela poderá buscar a reparação dos danos sofridos. O valor da fiança é expressivo e alcançará, em algumas situações, a considerável cifra de R$ 106 milhões. A prudência, as circunstâncias do fato e as condições do agente nortearão a sua fixação.
A Lei n.º 12.403/2011 constitui, sem dúvida alguma, avanço e importante instrumento de justiça. Caberá ao Poder Judiciário traçar estratégias e aplicá-la com vontade e criatividade, para dela extrair o máximo de efetividade. A nova lei, enfim, poderá mudar a cara e a imagem da Justiça Criminal, que ainda deve à sociedade presença mais marcante com o fito de desestimular a crescente criminalidade e acabar com o sentimento de impunidade que grassa no País.
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