Participaram desta cobertura Carlos Wagner, Eduardo Torres, Francisco Amorim, Humberto Trezzi e Pedro Moreira - ZERO HORA 22/12/2011
É para evitar mal-entendidos que podem resultar em tragédias como a de Gravataí que agentes de todo o Brasil têm uma regra: avisar os policiais de outros Estados, quando a investigação acontece na região deles. Isso não foi feito ontem e acabou na morte do sargento Ariel da Silva. Para completar a tragédia, partiu dos policiais gaúchos a quebra de uma segunda regra em casos de sequestros: não atirar contra os sequestradores, se esse ato representar algum risco aos reféns.
Comunicar os colegas de investigações nas suas áreas de atuação é procedimento ensinado em todas as academias de polícia. Mesmo quando isso implica probabilidade de vazamento da informação, ensina o delegado Renato Hendges, que há 27 anos atua na equipe antissequestro da Polícia Civil de Santa Catarina.
– Avisamos no mínimo a Chefia da Polícia do Estado onde vamos atuar. Quando já nos conhecemos e existe algum grau de confiança, nos reunimos com representantes de todas as polícias locais, montamos um QG, pedimos que a PM faça cerco. Colaboração total – afirma Hendges, que atuou em mais de 40 sequestros.
O delegado ressalta que não conhece o caso específico de Gravataí, mas acredita que possa ter ocorrido duplo erro: dos policiais civis, ao não informarem a presença. E do PM, ao abordar três desconhecidos sozinho.
O coronel Altair Cunha, subcomandante da Brigada Militar e experiente em casos com reféns, resume com uma frase sua opinião sobre a ação dos policiais civis paranaenses:
– Eles atuaram de forma clandestina e temerária num Estado sem avisar as autoridades competentes.
O delegado Cleber Ferreira, que tem mais de 30 anos na Polícia Civil gaúcha e lecionou Técnica de Investigação na Academia, diz que a ação dos colegas paranaenses é chamada, na gíria, de “pirataria”:
– A primeira coisa que deveriam fazer era avisar a polícia local. Até porque, em caso de prisão, eles têm de apresentar os presos aqui.
Expert em negociar a libertação de reféns, com 22 casos resolvidos, o coronel da BM Rodolfo Pacheco é enfático:
– A primeira preocupação tem de ser com a vítima. Saber onde está o refém, antes de atirar.
Sargento dedicou 21 anos à BM
Nascido em Porto Alegre, Ariel da Silva dedicou 21 dos seus 40 anos à BM e ao 17º BPM de Gravataí.
– Era tranquilo. Mesmo como policial, ele era um apaziguador. Por isso a gente não ficava com medo de algum tiro ou confronto – conta a cunhada, Sônia Aires, 27 anos.
Nas folgas, o pai de uma adolescente de 16 anos e marido de Adriana era dedicado à família. Nos últimos dois anos, quando foi promovido a sargento, Ariel passou a atuar no serviço de inteligência e já planejava a aposentadoria. O enterro será hoje no Memorial da Colina, em Cachoeirinha.
Refém era natural de Novo Hamburgo
Nascido em Novo Hamburgo, Lírio Persch foi com a família para o Paraná ainda criança, com pouco mais de um ano. Casado, o agricultor não tinha filhos. Definido pelo irmão mais velho, Sérgio Persch, como uma pessoa tranquila, Lírio era proprietário de uma faixa de terra em Quatro Pontes (PR) e no Paraguai, onde plantava soja, milho e trigo. Também era dono de poucas cabeças de gado. Segundo Sérgio, o irmão acompanhou o amigo Osmar na viagem em que comprariam uma máquina agrícola oferecida por um bom preço em um site.
– Entraram em uma emboscada. Vão ter de pagar por isso – lamenta.
A vítima tinha parentes no Estado, que ontem à noite tentavam obter informações sobre a desastrada ação policial.
ENTREVISTA. “Eles iriam nos libertar”. Osmar José Finkler, refém libertado
Resgatado na desastrada ação policial, o proprietário de uma empresa de transportes e fazendeiro paranaense Osmar Finkler, 36 anos, falou com ZH por telefone à noite:
ZH – Como foi o encontro com os supostos vendedores?
Osmar Finkler – Foi no posto. Logo ele (um dos criminosos) se apresentou como policial, nos rendeu e nos levou embora.
ZH – Vocês foram agredidos?
Finkler – Só nos amarraram.
ZH – Vocês estavam sendo libertados quando ocorreu a ação da polícia?
Finkler – Sim. Já tinham deixado em algum lugar a caminhonete tomada de nós. Já tinham me dado a chave e a documentação dela.
ZH – Como foi a ação policial?
Finkler – Estávamos dentro do carro, já com o resgate pago, e eles iriam nos libertar. Quando abriu o portão, o cara deu ré e um dos caras ali disse “volta que tem viatura”. Quando o carro voltou, foi aí que deu o pipoco (tiroteio).
ZH – O que aconteceu, então?
Finkler – Foi aí que a polícia atirou. Eu escutei a polícia atirando. Foi aí que acertaram o meu amigo Lírio.
ZH – Os sequestradores atiraram?
Finkler – Não ouvi. Nós estávamos de olhos vendados. Eu não vi ninguém atirando, só ouvi que os tiros vinham de trás. Mas os bandidos estavam armados.
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