A Policia exerce função essencial à justiça. Não é instrumento político-partidário. A segregação pela justiça e a ingerência partidária em questões técnicas e de carreira dificultam os esforços dos gestores e operadores de polícia, criam animosidade, desviam efetivos e reduzem a eficácia e a confiança do cidadão nas leis, na polícia e no sistema de justiça criminal que, no Estado Democrático de Direito, garante a ordem pública e os direitos da população à justiça e segurança pública.
ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
TARSO DÁ NOTA 8 ÀS POLÍCIAS DO RS
ENTREVISTA. Tarso Genro governador do Estado - CARLOS WAGNER, JOSÉ LUÍS COSTA E MARCELO ERMEL - ZERO HORA 16/11/2011
O governador Tarso Genro tem os olhos voltados para um horizonte bem além dos três anos que lhe restam no Palácio Piratini. E acredita que a segurança é um dos três pilares (os outros dois são saúde e educação) pelos quais seu governo será lembrado por futuras gerações, com planos gestados na época em que era ministro da Justiça do governo Lula.
Quando o assunto é programas e projetos de segurança para o Estado, lembra mais das ações do ministro Tarso Genro do que as práticas do Tarso governador. Nos primeiros 20 segundos de conversa, já cita o Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, criado em sua gestão no ministério, em 2007) como modelo. Em uma hora e 18 minutos de entrevista, repete outras 28 vezes a sigla que o projetou nacionalmente.
Ao alçar novos voos pelo país, surpreende ao afirmar que as questões de segurança gaúcha se assemelham mais às paulistas do que à realidade carioca, onde as autoridades estão retomando territórios dominados durante décadas pelo crime. Assim, se aproxima mais do tucano Geraldo Alckmin do que do peemedebista e aliado do Planalto Sérgio Cabral. Hoje, por exemplo, Tarso sentará à mesa com Alckmin para costurar parcerias na área de segurança.
Sobre o Rio, faz questão de classificar as ações espetaculares que direcionam os olhos do país para a Cidade Maravilhosa:
– É muito importante o que acontece no Rio, mas é importante porque coloca os territórios do Rio na mesma posição dos outros territórios do país. Parece que lá, no Rio, está solucionada a questão da segurança pública. Não! – responde, para em seguida completar:
– Lá, agora é que pode ser solucionado, melhorado substancialmente, porque é o lugar mais hostil e mais atrasado em termos de segurança pública.
Admitindo que o PT gaúcho aprendeu à frente do Piratini com eventuais equívocos do passado, Tarso elogia as corporações policiais, quer o diálogo e minimiza o tamanho da corrupção – “não é diferente da corrupção que existe nos demais órgãos”.
Ontem, antes de embarcar para São Paulo – onde à tarde encontrou-se com Lula, em São Bernardo do Campo, e hoje reúne-se com Alckmin –, Tarso recebeu ZH em uma casa locada para abrigar a segurança, em frente à sua residência no bairro Rio Branco. Confira trechos da entrevista:
Zero Hora – O senhor trouxe do Ministério da Justiça ideias claras de segurança, entre elas as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Continua com elas?
Tarso Genro – As UPPs são estruturas policiais que ocupam territórios fora de controle do Estado. O que acontece hoje no Rio é a colocação desses territórios na mesma situação em que todos os territórios das grandes capitais já estão. Territórios em quem a polícia e o Estado entram. A situação do Rio Grande do Sul é mais semelhante à de Curitiba, de São Paulo e da Grande Belo Horizonte. Não temos território em que a autoridade estatal não entre.
ZH – O que vem depois da polícia?
Tarso – Crime se combate com ações policiais altamente qualificadas, logística, inteligência e programas sociais. Um tem a função repressiva. E os programas para cortar as veias alimentadoras da criminalidade visam a obstruir a vinda de jovens para as quadrilhas. Em determinado bairro, o mais importante talvez seja iluminar uma quadra para a juventude se reunir à noite e conviver com a autoridade policial. Inclusive com certa tolerância com um menino que puxa fumo.
ZH – Nossa autoridade policial está treinada para tolerar isso?
Tarso – Não. Mas um policial comunitário tem de compreender a cultura da região. Se ele vê um traficante, tem de prendê-lo. Se vê um menino puxando um baseado, ele tem de ser trazido para um programa voltado para a juventude. O policial tem de procurar os pais do menino para colocá-los em uma rede de integração social porque esse menino pode ser o próximo traficante.
ZH – O que a Restinga receberá depois do ônibus da BM?
Tarso – Um programa dessa natureza só pode ser implementado em colaboração com prefeitura, Estado e União. Aqui em Porto Alegre, orientamos a nossa estrutura de microcrédito para procurar donos de bares, supermercados, oficinas e jovens que querem fazer empreendimento, para incluí-los na sociedade formal através do trabalho.
ZH – Qual a influência da eleição municipal na implementação do programa?
Tarso – Todos prefeitos que eu tenho contato e todos candidatos apoiam essa política.
ZH – E qual a contribuição que o realinhamento salarial de delegados com procuradores pode dar ao programa?
Tarso – Não tem relação. Vamos negociar essa demanda com os delegados para obter uma solução, para que os delegados saiam satisfeitos. Embora esse realinhamento com os procuradores seja impossível hoje.
ZH – O senhor acha que o realinhamento é justo?
Tarso – Dentro de uma política salarial ideal para todos, é justo. Assim como é justo os inspetores ganharem o dobro do que ganham. Mas estamos tratando da distribuição da massa salarial que o Estado tem condições de pagar. O importante é que se reconheça, e eu reconheço, que os delegados têm de ganhar mais.
ZH – Atingiu-se no Estado um patamar perigoso de negociação salarial. Por que há esse ingrediente explosivo?
Tarso – Acho que não há ingrediente explosivo. O que ocorreu na BM foi uma questão orientada por pessoas que estavam saindo ou já tinham saído da BM.
ZH – O que mudou em relação a governos anteriores?
Tarso – Não acho que tenha ingrediente político-partidário organizado. Pode ter, em algumas pessoas, um sentimento de frustração em função da nossa vitória. Pode ter algum ranço ideológico. No caso dos delegados, a demanda deles é histórica. Nenhum governo estabeleceu uma negociação tão completa como estamos fazendo.
ZH – É estranho que o governo estabelece negociação completa e eles avançam um passo que nunca avançaram?
Tarso – Aí tem um outro ingrediente. É o fato da valorização do servidor público estar no nosso programa, e ela estimula que as demandas sejam mais fortes. Temos de compreender e negociar.
ZH – Como o senhor avalia o fato de o Rio receber recurso federal para as UPPs, e os territórios da paz, aqui, sendo bancados pelo governo do Estado...
Tarso – Não posso criticar a drenagem de recursos para o Rio porque fui responsável por ela. Em relação ao Estado, estamos recebendo recursos, um exemplo é um helicóptero para a Polícia Civil, porque o governo do Estado anterior não apresentava projetos.
ZH – Temos registro do senhor recebendo um calhamaço de 66 projetos do ex-secretário José Francisco Mallmann...
Tarso – Isso é anteprojeto, é proposta.
ZH – Não se sente frustrado pela falta de recursos do Pronasci para o Estado?
Tarso – Eu gostaria de receber mais do Pronasci. A presidenta Dilma resolveu jogar esses recursos no combate ao tráfico nas fronteiras, uma opção política que temos de respeitar. Vamos bancar com as prefeituras.
ZH – Os território da paz são em áreas específicas. Qual o benefício ao restante da população gaúcha?
Tarso – É impossível implementar o território da paz em todo território nacional, estadual. Tem de ser focado em territórios com índice de criminalidade maior. E esse índice afeta a segurança de toda a população. Essas regiões como criminalidade maior são regiões de recrutamento de mão de obra para as quadrilhas e de produção de mão de obra criminosa. Em relação aos demais territórios, tem de apostar em tecnologia, em qualificação da informação policial, em aparatos de comunicação mais modernos e em relações articuladas entre as polícias.
ZH – Por que o Rio Grande do Sul não consegue colocar em prática a Lei dos Desmanches?
Tarso – Não tenho condições de responder agora. Essa questão não foi suscitada para mim, como governador, de que essa legislação não esteja sendo aplicada aqui.
ZH – O primeiro governo do PT foi marcado por embates ideológicos com categorias de policiais. Houve algum aprendizado?
Tarso – Todo governo é um aprendizado. O governo Olívio foi um excelente governo. Mas, como ele não tinha maioria na Assembleia, sofreu um cerco político muito forte, e isso prejudicou algumas iniciativas.
ZH – Naquele momento se falou em separação de bombeiros, em corrupção policial. Não se fala mais em corrupção....
Tarso – Não quer dizer que não tenha.
ZH – Há assuntos que não são tocados. Eles continuam existindo?
Tarso – A corrupção que existe na polícia não é diferente da que existe nos demais órgãos do governo. Não podemos tratar a corrupção policial como se fosse o mal estrutural do Estado. O que temos de fazer é combatê-la em todos os níveis.
ZH – Mas mudou alguma coisa? Antes falava-se diferente...
Tarso – Eu estou falando do presente. Não tenho condições de informar qual o grau de corrupção que tinha antes.
ZH – No seu governo, a segurança está em que grau de prioridade?
Tarso – Em primeiro grau. Baixamos os investimentos destinados à infraestrutura, estamos captando recursos de fora para esses investimentos, e aumentamos os recursos para a segurança, educação e saúde.
ZH – Qual o projeto que é a menina dos olhos do governo?
Tarso– Vou dizer três. O combate à criminalidade com foco nas quadrilhas e nas máfias de tráfico de drogas, os territórios da paz, combinados com os gabinetes integrados de segurança pública.
ZH – O senhor disse em campanha que iria desativar o Presídio Central...
Tarso – Eu disse que ia reformar. Disse que o Presídio Central não podia ser desativado se não tivesse uma rede organizada de presídios.
ZH – Faria uma reforma imediata mas que não foi feita até agora...
Tarso – Não.
ZH – E disse que iria tirar a BM dos presídios. Foram três promessas suas...
Tarso – Serão cumpridas. Já fizemos concurso para a Susepe.
ZH – O senhor disse na campanha: o Presídio Central será reformado e, mais tarde, poderá ser extinto...
Tarso – Isso mesmo. Mas vai depender de quantos presídios vamos conseguir fazer.
ZH – Quantos presídios o senhor vai inaugurar?
Tarso – Nesse negócio de obra pública, estou acostumado a pagar mico. Uma coisa é a vontade do administrador, outra são as licitações e as crises de disputa entre empresas que vão parar no Judiciário. Quero inaugurar três. Em Canoas, para 3 mil vagas, o de Passo Fundo e o de Bento Gonçalves.
ZH– Foram prometidas novas vagas para 2011, mas as obras de duplicação das penitenciárias estão paradas.
Tarso – Até o final do ano vamos gerar novas vagas.
ZH – O Estado não consegue controlar criminosos presos, que comandam crimes por meio de celulares. Como combater isso?
Tarso – Como nós estamos fazendo.
ZH – Mas aumentam os celulares...
Tarso – E aumenta a retirada de celulares.
ZH – As cadeias gaúchas são territórios fora de controle? Seriam os nossos morros cariocas?
Tarso – Não. Tem graus maiores e menores de controle. Aqui, não se tem controle absoluto porque há uma tradição.
ZH – Os presos montaram uma espécie de território livre dentro das cadeias?
Tarso – Não diria território livre, mas espaços de domínio.
ZH – Comparando os nossos problemas de segurança com os do Primeiro Mundo, como estamos?
Tarso – Em relação ao Primeiro Mundo, o nosso sistema é medieval.
ZH – O senhor vai a São Paulo conhecer experiências?
Tarso – As questões de segurança do Rio Grande do Sul têm mais similaridade com as de São Paulo do que com as do Rio.
ZH – São Paulo tem dinheiro para investir em segurança e os índices de homicídios, de roubos, vêm caindo há 10 anos. O senhor acredita que possa ter recursos para atingir esse mesmo estágio?
Tarso – Vamos discutir um regime de colaboração com a Polícia Militar, qual o tipo de colaboração que podemos aportar a eles, pois eles também têm interesse. E, com a Polícia Civil, qual o tipo de relação que podemos estabelecer para enriquecer as polícias, com verificação de aportes tecnológicos que temos e o que eles têm. Como são usados os aparatos que o Estado dispõe, o sistema de comunicação. É um intercâmbio das políticas de segurança que são necessárias para repressão da criminalidade. São Paulo tem experiência de polícia comunitária japonesa.
ZH – Como surgiu essa ideia?
Tarso – Tenho uma relação com o governo de São Paulo desde a época do Serra (José Serra, ex-governador). Agora, encontrei o Alckmin (Geraldo Alckmin, atual governador) em duas oportunidades e conversamos sobre retomar um regime de colaboração.
ZH – Que nota o senhor dá para a segurança no Estado?
Tarso – A segurança no Estado é média. Para o esforço da Polícia Civil e da Brigada Militar pode-se dar nota oito aos dois.
ZH – O senhor se sente seguro?
Tarso – Atualmente sim, porque tenho uma proteção como governador. Mas o grau de segurança de qualquer cidadão, hoje, em Porto Alegre, não é bom.
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