JANIO DE FREITAS
DE SÃO PAULO
As greves da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, com os danos da primeira à prestação de serviços ao público e, a segunda, com a interrupção de vias como a ponte Rio-Niterói, fazem aquilo mesmo que as duas polícias invocam para reprimir com a força de cassetetes e armas qualquer grupo, de grevistas ou de manifestantes, que perturbe a normalidade de um serviço, um prédio ou uma estrada do sistema federal.
As greves de serviço público que se voltam contra a população voltam-se também contra a democracia. Na euforia do momento tão esperado, a Constituinte estendeu o direito de greve ao serviço público como uma conquista democrática sem precedente no Brasil.
A precaução de preservar o direito da população, porém, ficou longe do equilíbrio necessário entre a nova concessão a uns e as velhas e permanentes necessidades de todos os outros.
A permanência dos serviços, por plantões de servidores nos seus locais de trabalho, é uma farsa dos respectivos sindicatos.
Os plantões fazem figuração, sempre com número exíguo de funcionários para que os serviços não sejam mesmo prestados.
Atestam-no as filas imensas, o atendimento com os modos da tal operação tartaruga, as falsas informações que iludem os necessitados de documentos ou de providências pendentes da Polícia Federal, e por aí vai. Ou melhor, não vai.
Não deixar ir se torna mesmo o propósito exibido ao vivo pela Polícia Rodoviária Federal, que saiu de sua mínima valia para solucionar o que não resolve de outro modo: parou milhares e milhares de carros, caminhões, ônibus, gente com compromissos, gente a caminho do trabalho, gente cansada do trabalho, cargas perecíveis, cargas para embarque aéreo --serviço completo, enfim.
Se as polícias que reprimem anormalidades passam a fazer anormalidades, não haverá quem recomponha a normalidade. Mais: estará assegurado, por antecipação, que todos ficarão impunes.
E, pronto, estão estabelecidas as diferenças antidemocráticas: há os que se estrepam com a polícia se perturbarem área federal e, de outra parte, os que tanto reprimem aqueles como fazem livremente as mesmas perturbações.
Não, não as mesmas: as dos policiais são remuneradas e os seus dias de perturbadores contam para promoções por tempo de serviço e para a aposentadoria.
Funcionário da Polícia Federal ganha mais do que professor nas universidades federais e do que médicos do serviço público federal. E nem se destaque a faixa dos delegados, para não humilhar professores e médicos.
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Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Com certeza, se trata de desserviço público um protesto policial que adota medidas de violência contra as liberdade do cidadão que paga seus salários através de altos impostos que manda para o Estado. Entretanto, é também um desserviço o descaso dos governantes para com suas polícias. Enquanto os servidores dos palácios do Executivo, Legislativo e Judicial recebem altos salários, estruturas amplas e número de funcionários cada vez maiores, as forças policiais são sucateadas, desvalorizadas, desmotivadas e constrangidas pela falta de recursos em pessoal e estrutura para atender a demanda de segurança pública no combate ao crime e infrações.
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