Ainda que a boa cautela nos mostre que o mais prudente é aguardar a competente apuração dos fatos e a conclusão da investigações, até porque os acusados, como qualquer cidadão, têm o direito à ampla defesa, configura-se como extremamente grave, num momento em que a polícia do Rio vem mudando positivamente a sua imagem, a denúncia de um funcionário de um ferro-velho de ter sido submetido a uma sessão de tortura , possivelmente cometida por cinco ou seis agentes, no interior da 10ª DP (Botafogo), na Zona Sul do Rio. A tortura tinha como objetivo obter da vítima uma confissão que incriminasse seu patrão, proprietário de uma oficina na Região dos Lagos. Entre os mecanismos utilizados pelos policiais para obtenção da confissão, segundo o denunciante, estão socos na barriga e tapas no rosto. Um alicate (pasmem) também teria sido usado para apertar e comprimir seu órgão genital. "Eu nunca esperava passar por isso", disse a vítima em entrevista ao 'RJTV', da TV Globo. Acho que todos nós, cidadãos, que sonhamos com a polícia democrática e cidadã, também não.
Chega a ser inacreditável que tal fato absurdo tenha mesmo ocorrido no interior de uma unidade policial. No entanto, não é menos verdade que a violência policial ainda continua arraigada à cultura brasileira. Alguns policiais militares do Amazonas - o comandante-geral daquela corporação acaba de ser exonerado , não se sabe se por esse motivo - estão sendo investigados pela agressão contra um adolescente de 14 anos. Agrediram e balearam covardemente o menor indefeso, encurralado numa parede. Contra as chocantes imagens, não há defesa que se sustente. Fosse acusado do que fosse, a tortura, a lesão corporal e o abuso de poder estão plenamente configurados e são inaceitáveis partindo de agentes do estado.
Louve-se, no caso da acusação aos policiais da 10ª DP do Rio, a atitude transparente, corajosa e exemplar da chefe da Polícia Civil, delegada Martha Rocha, em levar a público a grave acusação de crime de tortura - inafiançável com pena de 2 a 8 anos - demonstrando inequivocamente que a mudança para uma polícia democrática e cidadã, cujo referencial de ação seja servir, proteger e respeitar direitos civis, está a caminho. O modelo das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), implantado no Rio, nos tem mostrado que isso é possível.
Os tempos mudaram, o Brasil mudou e a polícia, representatividade do Estado que regula direitos, terá que acompanhar essa mudança. O exemplo foi mostrado na ação transparente da ilustre delegada. Quem tiver juízo, que o siga. A tortura policial é crime abominável e inaceitável em todos os sentidos, quanto mais quando praticado por agentes do estado investidos do poder de polícia. A chefe da Polícia Civil, em outra atitude correta, decidiu também afastar das funções, na 10ª DP, os policiais envolvidos. Que a verdade sobre os fatos aqui narrados venha à tona. "Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante", reza a Declaração Universal dos Direitos Humanos . Cumpra-se.
Milton Corrêa da Costa - O GLOBO, 01/04/2011
A Policia exerce função essencial à justiça. Não é instrumento político-partidário. A segregação pela justiça e a ingerência partidária em questões técnicas e de carreira dificultam os esforços dos gestores e operadores de polícia, criam animosidade, desviam efetivos e reduzem a eficácia e a confiança do cidadão nas leis, na polícia e no sistema de justiça criminal que, no Estado Democrático de Direito, garante a ordem pública e os direitos da população à justiça e segurança pública.
ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.
domingo, 3 de abril de 2011
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