ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

ALÉM DAS UPPs


Apoiadas por grande parte da população do Rio de Janeiro, as UPPs ocuparam territórios controlados há décadas pelo tráfico armado de drogas. Elas contribuíram também para reduzir significativamente vários indicadores de violência, o que fortalece a percepção de segurança no estado. O modelo de ocupação social das favelas, do qual as UPPs são uma parte, provou ser mais eficaz do que o esgotado modelo guerreiro anteriormente visto como paradigma da segurança pública. Assim, o apoio que têm recebido é merecido.

No entanto, já é possível, e se faz necessário, que se produzam algumas reflexões sobre o assunto para além desse êxito aparente, com o objetivo de preservar os avanços conquistados. Podemos começar pela alardeada redução da criminalidade. A diminuição dos índices não deve ser creditada, de forma exclusiva, às UPPs. Ela se tornou possível, igualmente, com a redução da pobreza e da desigualdade. Afora isso, cabe observar que estamos longe de padrões de civilidade tranquilizadores: nossos índices de violência, sobretudo de homicídios, ainda são epidêmicos.

É ilusório supor que as UPPs, por si só, resolverão todos os problemas da segurança pública, ou a sua maior parte. As milícias são um exemplo que merece destaque, já que as áreas por elas controladas mostram um nível diversificado de atuação. Tais organizações se alastram com força e velocidade pelo estado. Devem ser combatidas por meio da desestruturação das redes de negócios e poder que financiam seus mecanismos de corrupção e violência. Desarticular essas redes, que possuem ramificações no aparelho de Estado, demanda vontade política e uma complexa conexão e colaboração entre setores de inteligência e repressão nas esferas estadual e federal.

No que diz respeito às UPPs, há que atentar para os padrões de policiamento adotados nas comunidades onde se estabelecem. Será uma ironia indesejada retornar à antiga noção que exprimia a questão social como um "caso de polícia", caso se atribuam às forças de segurança pública papéis estranhos à sua institucionalidade. Não deve ser função da polícia, por exemplo, mediar conflitos entre vizinhos ou familiares. Por outro lado, não se pode dar margem a uma possível fissura no âmbito da PM caso se consolide um quadro em que teríamos a "PM normal" e uma "PM das UPPs", com diferenciações quanto a capacitação, remuneração, benefícios, etc. Já passou da hora de os governos dos estados resolverem a questão do piso salarial nacional das polícias. As disparidades são gritantes.

Espera-se que se implantem mais UPPs onde elas forem necessárias, mas que não se criem, com isso, favelas de primeira classe, com UPPs, e as de segunda, sem UPPs e sem investimentos sociais. E que esse empreendimento seja acompanhado de medidas contra a corrupção policial, de um fortalecimento das corregedorias de polícia e de um combate implacável às milícias.

WADIH DAMOUS, presidente da OAB do Rio de Janeiro. O GLOBO, 04/05/2011

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