ZERO HORA 23 de junho de 2012 | N° 17109
FREIO À INVESTIGAÇÃO
STF discute limite ao poder do MP
Corte analisará um processo que contesta legitimidade de procuradores e promotores que fazem apurações por conta própria - JULIANA BUBLITZ
Investigações
que elucidaram escândalos como o do mensalão – responsável por sacudir o
país em 2005 – correm o risco de virar artigo raro no Brasil. Discutido
no Supremo Tribunal Federal (STF) esta semana, o direito de promotores e
de procuradores de Justiça de apurar crimes está em xeque.
Iniciada na última quinta-feira, a sessão que definirá o futuro do Ministério Público (MP) foi suspensa e deve ser retomada nos próximos dias. O resultado é aguardado com expectativa.
Convencidos de que o MP estaria extrapolando suas funções, os ministros Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski votaram pelo enfraquecimento de poderes do órgão, que nos últimos anos se notabilizou por liderar operações de destaque nacional – a maioria contra a corrupção.
Relator do processo, Peluso sustentou a tese de que a Constituição não autoriza promotores e procuradores a promoverem averiguações por conta própria, exceto em casos excepcionais. A prerrogativa, segundo ele, é uma exclusividade de policiais civis e federais.
Preocupado com o desfecho do caso – que também está em discussão na Câmara, por meio de uma proposta de emenda constitucional –, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, saiu em defesa do MP:
– Num país que tem esse quadro de desvio de recursos, é inaceitável restringir poderes investigatórios.
O argumento, porém, não é consensual. Entidades policiais de todo o país, inclusive a Associação dos Delegados do Rio Grande do Sul (Asdep), decidiram apoiar os ministros. Advogados de réus denunciados a partir de ofensivas do MP também aprovam a restrição, entre eles o criminalista gaúcho Lucio de Constantino. Defensor de um dos acusados da Operação Papai Noel, sobre supostas irregularidades no Natal Luz de Gramado, Constantino diz que o caráter acusatório do órgão prejudica a imparcialidade necessária às investigações.
– O MP deveria se limitar a fiscalizar a polícia – sugere o criminalista.
O argumento, no entanto, é contestado pelo procurador-geral de Justiça no Estado, Eduardo de Lima Veiga, que teme o avanço da impunidade:
– Estão sobrando crimes para investigar no Brasil, e todos sabem que a polícia, sozinha, não dá conta. Tenho confiança de que o STF vai ficar do nosso lado. Do contrário, quem vai perder com isso é a população.
Iniciada na última quinta-feira, a sessão que definirá o futuro do Ministério Público (MP) foi suspensa e deve ser retomada nos próximos dias. O resultado é aguardado com expectativa.
Convencidos de que o MP estaria extrapolando suas funções, os ministros Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski votaram pelo enfraquecimento de poderes do órgão, que nos últimos anos se notabilizou por liderar operações de destaque nacional – a maioria contra a corrupção.
Relator do processo, Peluso sustentou a tese de que a Constituição não autoriza promotores e procuradores a promoverem averiguações por conta própria, exceto em casos excepcionais. A prerrogativa, segundo ele, é uma exclusividade de policiais civis e federais.
Preocupado com o desfecho do caso – que também está em discussão na Câmara, por meio de uma proposta de emenda constitucional –, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, saiu em defesa do MP:
– Num país que tem esse quadro de desvio de recursos, é inaceitável restringir poderes investigatórios.
O argumento, porém, não é consensual. Entidades policiais de todo o país, inclusive a Associação dos Delegados do Rio Grande do Sul (Asdep), decidiram apoiar os ministros. Advogados de réus denunciados a partir de ofensivas do MP também aprovam a restrição, entre eles o criminalista gaúcho Lucio de Constantino. Defensor de um dos acusados da Operação Papai Noel, sobre supostas irregularidades no Natal Luz de Gramado, Constantino diz que o caráter acusatório do órgão prejudica a imparcialidade necessária às investigações.
– O MP deveria se limitar a fiscalizar a polícia – sugere o criminalista.
O argumento, no entanto, é contestado pelo procurador-geral de Justiça no Estado, Eduardo de Lima Veiga, que teme o avanço da impunidade:
– Estão sobrando crimes para investigar no Brasil, e todos sabem que a polícia, sozinha, não dá conta. Tenho confiança de que o STF vai ficar do nosso lado. Do contrário, quem vai perder com isso é a população.
ENTREVISTA
“O Ministério Público quer ganhar poder no grito”
Marcos Leôncio Sousa Ribeiro Presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal
Presidente
da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ANDF) e membro
do Conselho Nacional de Segurança Pública, Marcos Leôncio Sousa Ribeiro
entende que o Ministério Público (MP) desrespeita a Constituição ao
investigar crimes. Confira:
Zero Hora – Como o senhor avalia a possibilidade de esvaziamento dos poderes de investigação do Ministério Público?
Marcos Leôncio Sousa Ribeiro – Parto da premissa de que não se pode esvaziar o que não existe. O MP está apostando em uma postura de afronta à Constituição e quer que o STF regularize uma situação que ele próprio forçou ao longo dos anos. O MP quer ganhar poder no grito.
ZH – Então o MP não pode investigar crimes?
Ribeiro – Não está escrito na Constituição que o MP pode investigar. A Constituição resultou de um profundo processo de negociação, que estabeleceu que aquele que acusava não deveria investigar direta e independentemente. O MP simplesmente ignorou isso e passou a exercer a atividade à revelia. Agora, quer que o Supremo resolva um problema que ele próprio criou.
ZH – O MP diz que, se perder poder, a impunidade aumentará no país. O senhor concorda?
Ribeiro – Esse é um discurso falacioso, que beira à chantagem. O Ministério Público é o responsável por fiscalizar a polícia e garantir que ela não seja omissa. Se a impunidade aumentar, não será porque o MP perdeu poder, mas porque não cumpriu a sua obrigação.
Zero Hora – Como o senhor avalia a possibilidade de esvaziamento dos poderes de investigação do Ministério Público?
Marcos Leôncio Sousa Ribeiro – Parto da premissa de que não se pode esvaziar o que não existe. O MP está apostando em uma postura de afronta à Constituição e quer que o STF regularize uma situação que ele próprio forçou ao longo dos anos. O MP quer ganhar poder no grito.
ZH – Então o MP não pode investigar crimes?
Ribeiro – Não está escrito na Constituição que o MP pode investigar. A Constituição resultou de um profundo processo de negociação, que estabeleceu que aquele que acusava não deveria investigar direta e independentemente. O MP simplesmente ignorou isso e passou a exercer a atividade à revelia. Agora, quer que o Supremo resolva um problema que ele próprio criou.
ZH – O MP diz que, se perder poder, a impunidade aumentará no país. O senhor concorda?
Ribeiro – Esse é um discurso falacioso, que beira à chantagem. O Ministério Público é o responsável por fiscalizar a polícia e garantir que ela não seja omissa. Se a impunidade aumentar, não será porque o MP perdeu poder, mas porque não cumpriu a sua obrigação.
ENTREVISTA
“A polícia é corporativista e quer mais poder”
Mario Luiz Bonsaglia Integrante do Conselho Nacional do Ministério Público
Procurador
Regional da República, Mario Luiz Bonsaglia é membro do Conselho
Nacional do Ministério Público (CNMP) e doutor em Direito pela USP. Para
ele, a perda de poder do MP, se confirmada, representará “um atentado à
Constituição”. Confira:
Zero Hora – Como o senhor avalia a possibilidade de esvaziamento dos poderes de investigação criminal do MP?
Mario Luiz Bonsaglia – Seria algo muito desastroso para o país. Algo que não atenderia os interesses da sociedade. O Brasil já é referido como o país da impunidade, e querer restringir a atuação do MP é um contrassenso.
ZH – Quem defende a perda de poder do MP alega que a investigação criminal é exclusividade das polícias. Qual a sua posição sobre isso?
Bonsaglia – Não está escrito na Constituição que só a polícia pode fazer uma investigação. O problema é que a polícia é corporativista e quer cada vez mais poder. É importante que as pessoas se perguntem a quem interessa o enfraquecimento do MP. Aos criminosos poderosos e influentes, que temem as investigações do órgão, e à polícia, em função do corporativismo.
ZH – Se o Ministério Público perder parte do poder, a impunidade pode aumentar no país?
Bonsaglia – Sim. Principalmente entre os criminosos influentes e poderosos, a impunidade vai aumentar exponencialmente. Não será bom para o país. Se isso acontecer, será um atentado à Constituição.
Zero Hora – Como o senhor avalia a possibilidade de esvaziamento dos poderes de investigação criminal do MP?
Mario Luiz Bonsaglia – Seria algo muito desastroso para o país. Algo que não atenderia os interesses da sociedade. O Brasil já é referido como o país da impunidade, e querer restringir a atuação do MP é um contrassenso.
ZH – Quem defende a perda de poder do MP alega que a investigação criminal é exclusividade das polícias. Qual a sua posição sobre isso?
Bonsaglia – Não está escrito na Constituição que só a polícia pode fazer uma investigação. O problema é que a polícia é corporativista e quer cada vez mais poder. É importante que as pessoas se perguntem a quem interessa o enfraquecimento do MP. Aos criminosos poderosos e influentes, que temem as investigações do órgão, e à polícia, em função do corporativismo.
ZH – Se o Ministério Público perder parte do poder, a impunidade pode aumentar no país?
Bonsaglia – Sim. Principalmente entre os criminosos influentes e poderosos, a impunidade vai aumentar exponencialmente. Não será bom para o país. Se isso acontecer, será um atentado à Constituição.
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