FOLHA.COM, 19/08/2013
Em metade das escolas, policial é formado em seis meses
AFONSO BENITES
DE SÃO PAULO
Um estudo que analisou 57 escolas de formação de policiais em todo o Brasil concluiu que o tempo de treinamento desses profissionais é abaixo do ideal e focado em áreas que são pouco usadas no cotidiano deles.
Enquanto nos países europeus o tempo médio de formação dos policiais é de dez meses, aqui a maioria das instituições forma seus profissionais em até seis meses.
Das 44 unidades de ensino que responderam ao questionamento dos pesquisadores da ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 20 declararam que em um semestre o policial já pode trabalhar na linha de frente do combate à criminalidade.
Outros dois centros de ensino afirmaram que o curso de formação é opcional, mas não detalharam como o policial é instruído.
Os nomes das instituições ou os Estados onde se localizam não foram divulgados.
Os dados se referem a todos os quadros iniciais das polícias Civil (agentes, investigadores, escrivães e delegados) e Militar (soldados e tenentes).
'BACHARELESCA'
Para os pesquisadores, os policiais têm muitas aulas de direito e poucas de sociologia ou de resolução de conflitos.
"A formação é muito bacharelesca e militarista. Em alguns casos, os alunos têm mais aulas do que os de engenharia", afirma um dos coordenadores da pesquisa, o professor José Vicente Tavares dos Santos, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
ONDA DE PROTESTOS
"A escola, muitas vezes, não leva em conta que o policial vai se envolver em situações em que tanta teoria não basta."
Para Santos, uma das provas de que o treinamento das polícias está defasado foi a forma que elas atuaram na onda de protestos enfrentados pelas principais cidades brasileiras desde junho.
"Aconteceram atos que nenhuma polícia conseguia prever. As escolas precisam se adequar à essa realidade."
O estudo foi elaborado a pedido da Secretaria Nacional da Segurança Pública e tem como objetivo dar subsídios à elaboração de planos estratégicos para essa área.
INGRESSO
Ao interpretar os dados do estudo, o sociólogo Renato Sérgio de Lima, membro do fórum, concluiu também que as carreiras policiais precisam passar por reestruturação.
Para ele, a estrutura de ingresso e promoção das polícias Civil e Militar deveria ser semelhante à da Polícia Rodoviária Federal.
Nela, todos os policiais iniciam a carreira no mesmo posto, o de policial rodoviário federal. Com o passar dos anos, ele pode chegar ao cargo de inspetor, o que equivale ao máximo da carreira.
"Hoje, na Polícia Civil temos delegados de 25 anos de idade dando ordens para investigadores com 20 anos de carreira. Na Militar, não é diferente. Isso causa uma segregação e uma série de divergências internas que poderiam ser superadas com a reestruturação das polícias."
Editoria de arte/Folhapress
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Realmente, a política do imediatismo político tem colocado nas ruas policiais despreparados em conhecimentos e práticas essenciais à atividade policial. Nesta linha, a formação necessita de técnicas de defesa pessoal, imobilizações, manuseio de armas, prática de tiro, relações humanas, tecnolgias e resolução de crises que são essenciais para a segurança do policial e da população que irá proteger, complementado pelo conhecimento científico de sociologia, antropologia, informática, direitos humanos, direito ambiental, noções de direito civil e penal, noções de saúde, história da cidade onde vai trabalhar, entre outras. Para que se consolide estes conhecimentos técnicos e científico em seis meses é algo impossível e impraticável. Defendo a formação em dois anos no mínimo e com educadores policiais e civis concursados para as matérias exigidas.
Não posso concordar com a opinião do sociólogo Renato Sérgio de Lima sobre a carreira única, já que o modelo com graus superior e médio é o modelo utilizado nos demais instrumentos de justiça criminal, onde a segurança pública está inserida. Além disto, o modelo proposto da PRF já se mostrou ineficaz diante de várias mazelas que contaminam o gerenciamento, a execução, o controle e a fiscalização. É falacioso o argumento de que a idade a experiência é fiel de gerenciamento, pois se assim fosse pessoas de maior idade não poderiam ser comandadas por aqueles mais jovens e menos experientes do que eles. Neste modelo, o chefe de hoje pode ser o subordinado de amanhã e vice-versa, gerando permissividade e constrangimentos nocivos ao controle e fiscalização. No modelo paramilitar e hierárquico há maior controle, disciplina, respeito à antiguidade, reconhecimento do cargo e consideração ao conhecimento adquirido em escolas de liderança e gerenciamento onde as questões passam a ser estratégicas e táticas, ao invés de meramente técnicas da execução.
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