ISTO É ENTREVISTA N° Edição: 2307 | 07.Fev.14
Wagner Moura. Maior astro do cinema nacional, o intérprete do Capitão Nascimento, de "Tropa de Elite", afirma que os policiais desrespeitam os pobres e critica a truculência da corporação
por Michel Alecrim
SEQUÊNCIA
Ele descarta fazer um “Tropa de Elite 3”:
“Já deu o que tinha que dar”, afirma
“Sempre declaro meu voto. Estou observando essa união
entre a Marina Silva, que já apoiei, e o Eduardo Campos"
"Uma usina hidrelétrica causa um impacto brutal.
A cidade onde meus pais nasceram foi inundada pela
barragem de Itaparica. Sei do que estou falando”
SEQUÊNCIA
Ele descarta fazer um “Tropa de Elite 3”:
“Já deu o que tinha que dar”, afirma
O baiano Wagner Moura, 37 anos, é atualmente “o cara” do cinema brasileiro. Filmes com seu nome no letreiro encontram o tapete vermelho estendido em festivais internacionais, como o de Berlim, na Alemanha, onde o longa-metragem que protagoniza, “Praia do Futuro”, disputa o Urso de Ouro, cujo ganhador será conhecido no domingo 16. Ao contrário do herói invencível Capitão Nascimento que encarnou com brilho no sucesso internacional “Tropa de Elite”, o atual salva-vidas Donato fracassa ao não conseguir tirar do mar uma pessoa com vida. “É um filme sobre coragem, mas também sobre covardia”, diz o ator, que, pela primeira vez, interpreta um personagem gay no cinema. O filme ainda é inédito no Brasil.
Moura não faz mistério sobre suas preferências políticas. Votou na última eleição presidencial em Marina Silva, na época no PV, e este ano diz tender, no momento, a votar na dupla Eduardo Campos (governador de Pernambuco pelo PSB) e Marina Silva (criadora da Rede Sustentabilidade e também filiada ao PSB). Mas faz ressalvas: “Tudo o que o PSB não é, sinceramente, é uma nova forma de se fazer política, que é o que a Rede vinha apregoando.” Casado com a fotógrafa e jornalista Sandra Delgado e pai de três filhos, ele falou à ISTOÉ antes de viajar para Berlim, onde participa do festival.
Moura não faz mistério sobre suas preferências políticas. Votou na última eleição presidencial em Marina Silva, na época no PV, e este ano diz tender, no momento, a votar na dupla Eduardo Campos (governador de Pernambuco pelo PSB) e Marina Silva (criadora da Rede Sustentabilidade e também filiada ao PSB). Mas faz ressalvas: “Tudo o que o PSB não é, sinceramente, é uma nova forma de se fazer política, que é o que a Rede vinha apregoando.” Casado com a fotógrafa e jornalista Sandra Delgado e pai de três filhos, ele falou à ISTOÉ antes de viajar para Berlim, onde participa do festival.
“Sempre declaro meu voto. Estou observando essa união
entre a Marina Silva, que já apoiei, e o Eduardo Campos"
"Uma usina hidrelétrica causa um impacto brutal.
A cidade onde meus pais nasceram foi inundada pela
barragem de Itaparica. Sei do que estou falando”
Fotos: Felipe Varanda/ ag. istoé; Ueslei/ MarcelinoREUTERS
ISTOÉ -
Existe a possibilidade de se filmar “Tropa de Elite 3”?
WAGNER MOURA -
Não. Está sepultada. O “Tropa”, do ponto de vista da dramaturgia, já deu o que tinha que dar. Aquele personagem não tem mais para onde ser levado. Ao contrário do tema segurança pública e violência, que sempre dá pano para manga.
ISTOÉ -
As Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs) nas favelas cariocas não são um convite à sequência cinematográfica?
WAGNER MOURA -
Nesse cenário político, a gente faz até Tropa 50. O que não falta é assunto: violência, caos urbano, a forma como a polícia age, mas dramaturgicamente não dá.
ISTOÉ -
Como vê a implantação das UPPs e os recentes reveses em algumas comunidades?
WAGNER MOURA -
As UPPs são muito bem-vindas e funcionam como um primeiro passo. O poder público precisava chegar às favelas, mas não só com a polícia. Faltam escola, creche, biblioteca, parque, tudo o que tem no asfalto. Antes, por outro lado, a polícia tem de ser pacificada. O que fizeram com o Amarildo (Dias de Souza, pedreiro torturado e morto dentro da sede da UPP da Rocinha em julho do ano passado) dentro de uma Unidade Pacificadora é significativo do que eu estou dizendo. A mesma velha polícia agindo de forma desrespeitosa com as pessoas pobres.
ISTOÉ -
Este ano tem eleições. Pretende participar de campanha eleitoral?
WAGNER MOURA -
Eu sempre declaro meu voto. Estou observando essa união entre a Marina Silva (filiada ao PSB e idealizadora da Rede Sustentabilidade) e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). Tenho respeito pelo Campos e já apoiei publicamente a Marina, mas tudo o que o PSB não é, sinceramente, é uma nova forma de se fazer política, que é o que a Rede vinha apregoando. Estou esperando para ver como se darão as alianças, os palanques em São Paulo, Minas Gerais... Mas participar (de campanha política) não estou a fim.
ISTOÉ -
O Donato é seu primeiro papel explicitamente gay?
WAGNER MOURA -
Talvez seja o primeiro filme em que há explicitamente uma relação entre o meu personagem e o de um outro cara, embora essa não seja a coisa mais importante. É um filme sobre identidade, descoberta, coragem para ser o que você é. É uma busca existencialista de querer fazer a própria vida, de se libertar das amarras, dos rótulos em que a gente se encaixa. Todos os personagens passam por um processo de humanização muito grande. Eu acho que a gente ajuda a superar os preconceitos a partir do momento em que a homossexualidade não vira um assunto. Se meu personagem tivesse se apaixonado por uma mulher, não ia ser um assunto.
ISTOÉ -
Você vai estrear na direção em breve. O que espera dessa experiência?
WAGNER MOURA -
Eu me interesso por direção e por tudo que transcende o meu trabalho como ator. E acho que é muito legítimo o ator querer dirigir porque temos uma visão muito privilegiada do processo do cinema. Na realidade, estamos no epicentro. Vemos de dentro para fora. Desde a equipe de câmera, o som, a produção, a comida, até o cara que tapa a rua lá fora. O filme que vou dirigir sobre o Carlos Marighella (guerrilheiro, 1911-1969) será focado entre os anos 1964 e 1969, quando o Marighella estava na casa dos 50 anos. Estamos na fase de captação de recursos. Espero começar a filmar logo, mas ainda não tenho data.
ISTOÉ -
Você vai contar um a história política, mas as grandes bilheterias do cinema brasileiro têm sido comédias, não é?
WAGNER MOURA -
A minha vontade é de fazer coisas populares. Por alguma razão, filmes que poderiam atrair muito público, como “Xingu” e “Serra Pelada”, não aconteceram. Não vejo isso como uma tendência do público a apenas ver comédias, pode ser uma contingência do momento. E a comédia é importante, não é menor que outros gêneros. É importante que o público se identifique com outras propostas, como o “Tropa de Elite” ou os filmes espíritas que fizeram sucesso, ou “2 Filhos de Francisco”. Os trabalhos que eu quero fazer, como o do Marighella, precisam ter conteúdo. Que eu considere artisticamente interessantes, me orgulhe de ter feito, mas que sejam comunicativos, que dialoguem com as pessoas. Eu tenho pouquíssimo interesse em fazer coisa cabeçuda para cineclube.
ISTOÉ -
Como foi a experiência de trabalhar em Hollywood?
WAGNER MOURA -
Foi ótimo. O primeiro convite para trabalhar fora do Brasil que realmente me interessou. Era de um diretor cujo primeiro filme, “Distrito 9”, eu tinha gostado muito, uma história de segregação social misturada com ficção científica, um blockbuster hollywoodiano que não era uma bobagem… Havia muitas coisas novas e interessantes. Fiquei bem a fim de fazer. Mas, mais que tudo, o personagem que me ofereceram era muito bom. Foi uma aventura diferente das que eu estava acostumado, uma experiência boa que enriqueceu a minha vida. É dessas coisas que eu estou atrás.
ISTOÉ -
Como entende as recentes manifestações de rua?
WAGNER MOURA -
Eu vi as manifestações como uma das coisas mais surpreendentes e interessantes que aconteceram na política brasileira desde que eu me entendo como cidadão. O que eu fiquei preocupado foi com a criminalização das manifestações. Foi um pouco assustador ver gente querendo ressuscitar a Lei de Segurança Nacional. É claro que ninguém quer ver quebradeira, mas prender um garoto que está na manifestação e enquadrá-lo como terrorista está errado. Os governantes se mostraram despreparados.
ISTOÉ -
Os protestos podem atrapalhar a Copa?
WAGNER MOURA -
Eu quero ver a Copa, mas acho bom que haja manifestações contra o que ela representa e a forma como ela está sendo administrada. Os gastos públicos e a maneira precária como o Brasil está se preparando. Estádios atrasados, aeroportos caóticos, hotéis que vão ficar cheios. Essa Copa não está ocorrendo como deveria acontecer.
ISTOÉ -
Como vê a experiência do Uruguai com a liberação da maconha?
WAGNER MOURA -
Eu acho ótimo. Isso vai trazer dividendos para o Uruguai. Muita gente está querendo ir morar lá, fazer negócios, passou a ser um foco no mundo. Mas os americanos também estão mudando. Dois Estados de lá estão legalizando e na Califórnia é permitido de forma medicinal. Não há muito como segurar. No Brasil, o que segura é a questão moral. Reprimir é uma coisa ineficaz. Gasta-se muito dinheiro, a guerra mata mais gente do que a droga em si. As drogas têm que ser vistas como questão de saúde pública. Um exemplo de como o Brasil trata o problema foi o que o (governador de São Paulo) Geraldo Alckmin (PSDB) fez na Cracolândia, mandando a polícia baixar a porrada. Dá porrada nos caras e tira eles dali: é assim que tratam a questão da droga.
ISTOÉ -
Por que você é contra a hidrelétrica de Belo Monte?
WAGNER MOURA -
Tudo que se diz sobre energia hidrelétrica é sempre que é uma energia limpa, que não causa transtorno ao meio ambiente, o que é uma mentira. Não é igual a uma termelétrica, mas, para ser construída, o impacto ambiental é brutal. E não só isso, há o impacto na vida das pessoas. Todas as questões políticas que eu levanto, no fundo, afunilam e vão dar nos direitos humanos. Eu venho de uma cidade chamada Rodelas (Bahia), onde meus pais nasceram, que foi inundada pela barragem de Itaparica. Sei do que estou falando.
ISTOÉ -
Sua família teve que se mudar por causa da barragem?
WAGNER MOURA -
Todo mundo teve que se mudar. A Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) indenizava as pessoas por conta das terras inundadas, mas elas ganhavam outro pedaço de terra que era totalmente diferente daquela que estavam acostumadas a cultivar. Primeiro, as pessoas ficaram felizes com as indenizações, mas, passada a euforia, o que se via era uma cidade com alto nível de alcoolismo, gente sem ter o que fazer, sem relação com o lugar e casas padronizadas. Dizem que a energia eólica e a solar não vão dar conta, mas o investimento nessas fontes é baixíssimo. Minha posição é um tanto utópica, mas por princípio não posso achar corretos certos projetos, ainda mais quando há a questão das terras indígenas.
ISTOÉ -
Você está longe da tevê desde 2007. Não sente falta?
WAGNER MOURA -
O fato de eu estar afastado das novelas tem mais a ver com a minha vontade de aproveitar esse momento do cinema. Hoje em dia eu não tenho vontade de fazer uma novela, de ficar 11 meses fazendo uma coisa só, enquanto tem um monte de projetos no cinema acontecendo, um momento de grande diversidade e ebulição.
ISTOÉ -
E programas mais curtos de tevê?
WAGNER MOURA -
Tenho um projeto com o diretor Luiz Fernando Carvalho, há mais de dois anos, de fazer a adaptação do livro “Dois Irmãos”, do Milton Hatoum, que é um livro lindo. Eu também adoro as coisas que ele faz na tevê. E esse projeto seguidamente é cancelado na Globo. O próprio (Carlos Henrique) Schröder (diretor-geral da emissora) me falou que ia acontecer. Eu estava muito animado, mas esbarrou com a novela que o Luiz Fernando está dirigindo e tiveram que adiar. Agora não sei mais se vão retomar.
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