WANDERLEY SOARES
Fora os momentos de euforia, ainda há um forte nevoeiro entre a saga de Miguel Paiva e o assassinato do coronel Júlio Miguel Molina Dias.
O caso do coronel do SNI Júlio Miguel Molina Dias, 78 anos, gaúcho de São Borja, assassinado a tiros em Porto Alegre quando chegava em sua residência, no bairro Chácara das Pedras, em 1 de setembro último, gerou ou deu continuidade ao caso do deputado federal paulista Rubens Paiva, desaparecido há 41 anos nas garras da ditadura. São, portanto, dois casos apressadamente considerados como isolados um do outro: O "caso Júlio Miguel" e o "caso Rubens Paiva". Nesta moldura, enquanto não houver uma devassa investigatória plena sobre o cruzamento destes dois episódios, será temerário afirmar que não exista um elo criminoso e até político oculto entre o desaparecimento do deputado e o assassinato do coronel. Sobre isso pairam brumas que não foram desfeitas nem mesmo em parte, não obstante os momentos de ufanismo que envolveu desde o delegado que investigou o caso até a cúpula do governo do RS com a localização de documentos - divulgados flagrantemente antes de serem periciados - que apontam ter sido o deputado preso no DOI-Codi, no Rio, onde sumiu para sempre. Sigam-me.
Dama diáfana
Para que seja aberta uma janela fadada a dar uma nesga de luz a essa trama que, em minha torre, tenho discutido com meus conselheiros, é preciso que a polícia tenha resposta, em primeiro plano, para uma pergunta: - Quem matou o coronel? Esta janela está trancada e não é notável nenhum avanço na retirada de suas emperradas dobradiças. É tênue a tese sobre latrocínio que, se comprovada fosse, eliminaria a conotação política e, paralelamente, a versão, por mera e impensada dedução, sobre crime passional soou ridícula, a menos que alguém apareça em futuro próximo com uma diáfana dama de vermelho, personagem que já ilustrou um fato de grande vulto ocorrido em Porto Alegre no século passado.
Uma estranha visita
Homicídios com autoria desconhecida, que é o caso do coronel, exigem dos investigadores minúcias de comportamento, especialmente em locais que estão ou possam estar ligados aos fatos. No levantamento investigatório ocorrido na residência do coronel eram esperados procedimentos óbvios. O isolamento externo caberia à Brigada Militar - não é sabido que tal providência tenha sido tomada. Nos cômodos da casa deveriam entrar o delegado chefe da investigação, seus assistentes imediatos e peritos do IGP (Instituto-Geral de Perícias). Nada mais que isso, a não ser depois do trabalho legal ser encerrado. Na ampla divulgação sobre a visita à casa do coronel, nem brigadianos nem peritos são citados. Por isso, ainda não se sabe onde estavam, exatamente, os documentos, se num cofre, se numa pasta preta, se numa prateleira, se numa gaveta chaveada, se no armário da cozinha, se em meio a um álbum de recordações. Nada disso está definido. Mas ficou claro que um repórter, possivelmente convidado especial (eu aceitaria este convite) folheou, junto com o delegado, os documentos, sem a presença de peritos e sem a ciência dos superiores da autoridade que chefiava a investigação, pois ali não se encontravam. Como se trata de um episódio histórico, isso tudo deverá um dia ser explicado a partir, é claro, da descoberta de quem matou o coronel.
Nenhum comentário:
Postar um comentário