ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.

domingo, 21 de outubro de 2012

TUDO NORMAL

ZERO HORA 21 de outubro de 2012 | N° 17229. ARTIGOS

Marcos Rolim*

A imprensa oferece às polícias uma visibilidade secundária a partir de narrativas e imagens. No Brasil, em 31 de março de 1997, o Jornal Nacional, da TV Globo exibiu cenas – gravadas por cinegrafista amador – em que PMs de São Paulo extorquiam, espancavam e matavam pessoas na Favela Naval, em Diadema. Esta matéria causou grande impacto na opinião pública, viabilizando a aprovação da Lei da Tortura no mesmo ano. Antes disto, em 1991, as cenas do espancamento de Rodney King em Los Angeles, também gravadas por particular, atualizaram a luta contra a violência policial e o racismo nos EUA. As novas tecnologias de comunicação, entretanto, alteraram radicalmente a visibilidade das polícias, cujas ações podem, agora, ser registradas por qualquer pessoa e compartilhadas nas redes sociais. Em algumas nações de democracia substantiva, inclusive, já existem ONGs que se dedicam a registrar as ações policiais, como a Copwatch, no Canadá, e a FITWatch, no Reino Unido.

Tais possibilidades inibem abusos e estimulam reformas democráticas. Isto ficou demonstrado nos casos de Ian Tomlinson, em 2009, na Inglaterra, e de Robert Dziekanski, em 2007, no Canadá. Ambos morreram após abordagens desastradas de policiais. Tomlinson acompanhava as manifestações de protesto contra reunião do G-20, em Londres, quando foi golpeado pelas costas. Dziekanski foi atingido por vários disparos de Taser, no aeroporto de Vancouver. Os dois fatos só foram esclarecidos porque imagens gravadas com celulares o permitiram. Nas duas oportunidades, os governos e os parlamentos – como costuma ocorrer em sociedades civilizadas – se dedicaram profundamente ao debate e à definição de procedimentos que evitassem a repetição das ocorrências trágicas, com grande interesse da imprensa no tema.

Polícias em uma democracia devem ter suas ações registradas pela cidadania, tanto quanto possível. Elas mesmas, para evitar leituras parciais, devem filmar suas atividades. No Brasil, estamos longe disto e algumas manifestações públicas ainda são tratadas com violência. Isto ocorre porque alguns policiais, ao invés de proteger as pessoas, agem sob o pressuposto de que elas são uma ameaça, ainda mais quando reunidas e portando câmeras. O princípio, comum a todos os regimes autoritários, ainda não foi revogado no “espírito objetivo” das polícias – mais nitidamente nas PMs –, a par dos avanços já verificados. O corporativismo e a conivência do poder público diante dos abusos se encarregam de perpetuar o problema, debilitando a já frágil confiança nas instituições.

Como se percebe nos vídeos que circulam pela internet, a postura repressiva adotada pela Brigada no Largo Glênio Peres há duas semanas foi desnecessária, desproporcional e, em alguns momentos, claramente abusiva. No outro dia, entretanto, incrivelmente, formadores de opinião lamentaram a “depredação” do símbolo da Copa, um tatu inflável – que, depois, se descobriu, não foi sequer tocado – enquanto as autoridades na área justificavam as ocorrências dentro de um padrão de “normalidade”. De fato, o mais preocupante é que está tudo normal mesmo.


*Jornalista

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