Publicação: 12/10/2012 06:00 Atualização: 12/10/2012 07:13
Atuação da Guarda Municipal já vira motivo de discórdia entre delegado e coronel eleitos
Iracema Amaral - Estado de Minas
A rixa histórica entre as polícias Militar e Civil de Minas Gerais deverá ganhar novos rounds a partir do próximo ano. Dois representantes das duas corporações, eleitos vereadores no último domingo, o delegado Edson Moreira, 53 anos, e o coronel reformado Edvaldo Piccinini, 67 anos, prometem travar debates acalorados no plenário da Câmara Municipal em função de posições divergentes sobre a segurança pública na capital. Moreira quer armar a Guarda Municipal e colocá-la também no policiamento ostensivo e preventivo, hoje prerrogativa constitucional da Polícia Militar. “Por que não? É só treinar, como faz a Polícia Militar e a Polícia Civil”, responde o delegado.
Piccinini refuta, por sua vez, a proposta do futuro colega de Parlamento e aposta em um trabalho educativo nas comunidades das periferias da cidade. “Podemos transformar os campos de várzea em centros de convivência”, contrapõe o coronel reformado. Quando questionados de forma incisiva sobre as propostas que defendem, Moreira reage pedindo que as suas palavras “não sejam deturpadas”. Por seu turno, Piccinini prefere desligar o telefone. Alguns minutos depois de interromper a ligação, o coronel reformado ligou para a reportagem justificando que “a bateria do celular tinha acabado”.
"Estou defendendo a Guarda Municipal auxiliar à PM. Por que faço isso? Porque o número de ocorrências de crimes está gritante". Delegado Edson Moreira
O que faz um policial deixar a Polícia Civil para se tornar um parlamentar?
Eu não estou deixando a Polícia Civil.
Mas o senhor vai se licenciar?
Possivelmente. Se eu arrumar um horário compatível, que dê para eu trabalhar na Polícia Civil e na Câmara, eu faço. Se não der, fico só na Câmara.
E como vai ser o trabalho como parlamentar?
As leis estão sendo muito mal elaboradas e chegou a hora de fazermos leis condizentes com o momento, para atacar na área de repressão, prevenção e de educação.
A segurança pública não é uma prerrogativa do município...
Mas é dever dele.
Há um limite constitucional...
Não existe limite constitucional, não. Compare com outros municípios, até de Minas Gerais mesmo, e do país, como São Paulo, onde a Guarda Municipal atua na segurança pública e armada. Na época do PCC (em São Paulo, organização criminosa batizada de Primeiro Comando da Capital) estavam matando muita gente e, em muitas situações, houve a atuação da Guarda Municipal. Então, é o seguinte: a guarda pode atuar no policiamento ostensivo e preventivo.
O senhor está defendendo o armamento da Guarda Municipal...
Estou defendendo a Guarda Municipal auxiliar à Polícia Militar. Por que faço isso? Porque o número de ocorrências de crimes está gritante, aumentando a cada dia e a Polícia Civil está trabalhando em demasia. Se a Polícia Civil está trabalhando muito é porque os crimes não estão sendo prevenidos. São muitas as funções para a Polícia Militar e a Guarda tem que auxiliar na prevenção de crimes.
Além do armamento da Guarda Municipal....
Não deturpe a matéria... Não é armamento da Guarda Municipal, mas a colocação dela na prevenção de crimes. Não quero colocar arma na mão de ninguém, não. Quero que ela atue na prevenção de crimes.
Mas isso implica em dar armas para a guarda, sim ou não?
Por que não? É só treinar o homem, como faz a PM e a Polícia Civil, e colocar a arma na mão dele. Qual o problema? Isso é para que eles possam atuar, não vejo nada de mal nisso. E sou contra também o estatuto do desarmamento. O povo tem o direito de escolher se quer comprar armas.
De acordo com relatório de comissão da Câmara, a Guarda Municipal se tornou um feudo da PM...
Exatamente. A Polícia Militar não tem nada que interferir. Aposto que ela tem vários documentos reservados contra a Guarda Municipal. Ela (Polícia Militar) acha que está perdendo espaço. Nós temos que pensar é na população.
O senhor acha que vai comprar briga com a corporação?
Se tiver, vou comprar briga, porque a população me passou uma procuração para que eu a defenda.
O caso do ex-goleiro Bruno ajudou a eleger o senhor?
O trabalho como delegado há 23 nos em Minas Gerais me ajudou. Passei noites e noites em claro. Então foi um conjunto. São vários casos, o caso Bruno é um dos que trabalhei.
"A gente tem a Guarda Municipal nas atividades que a Constituição determina para ela e a PM também. A parceria é importante dentro dessas prerrogativas" . Coronel Piccinini
A segurança pública não é prerrogativa do município. Diante dessa limitação, o que o senhor vai poder fazer na Câmara Municipal?
Primeiro, eu pretendo ser um elo entre a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros e o poder público municipal.
De que forma?
Certamente, os eleitores e a população vão mostrar as necessidades e os problemas de segurança que acontecem em cada bairro. Nós podemos fazer sugestões, fazendo esse link com a Polícia Militar.
Mas, para isso, precisava ser eleito vereador?
Precisava, porque as reivindicações da sociedade civil vão estar mais assistidas por essa pessoa que é o vereador. Por exemplo, os campos de várzea, neles os traficantes estão aliciando os menores. Podemos transformar os campos de várzea em centros de convivência.
O senhor defende uma parceria entre a Guarda Municipal e a Polícia Militar para o policiamento ostensivo e preventivo?
A gente tem a Guarda Municipal nas atividades que a Constituição determina para ela e a Polícia Militar também. A parceria é importante dentro dessas prerrogativas. A gente não pode atravessar nenhuma lei.
Está em um relatório de uma comissão especial da Câmara, divulgado no ano passado, que a Guarda Municipal se tornou uma instituição comandada por oficiais da PM reformados, que ocupam cargos comissionados na direção da guarda. Como é que o senhor encara o assunto?
É um assunto polêmico. A nossa prudência e a cultuada mineiridade vão me aconselhar que, antes de emitir qualquer opinião, devo estudá-lo em todos os seus aspectos.
Existe uma reclamação da entidade que representa a Guarda Municipal de que a instituição reproduz a disciplina dos quartéis militares. O senhor acha que é uma crítica pertinente?
Preciso me inteirar desse tema para emitir uma opinião.
O senhor é a favor de dar armas de fogo para a Guarda Municipal?
Pela sua pergunta são suposições... já tem um projeto de lei para isso, né? Eu quero estudar isso bem. Não vou dar opinião neste momento e, certamente, você não daria... (cai a ligação).
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Não vou entrar no debate. Já manifestei em meus blogs, palestras e livros que sou a favor da Polícia Municipal. Fundamento meu pensamento na inoperância do Estado em dotar de policiais em número suficiente para ocupar as ruas, prevenir os delitos e aproximar a polícia das comunidades, especialmente da periferia. Defendo as polícias municipais pelo maior comprometimento delas para com a cidade e locais de trabalho, diante da alta e nociva rotatividade de comandos e de remanejos políticos de policiais nestas cidades que prejudicam a eficácia do policiamento ostensivo nos turnos de serviço. No mínimo, cada cidade ou bairro de uma cidade deveriam ter 12 policiais para garantir a permanência e a ação de presença real do policiamento, mas algumas cidades tem cinco ou menos até e bairros importantes não conta com uma guarnição. Além disto, são os munícipes os principais clientes da segurança pública. São eles que sofrem com o descaso do Estado e com o jogo de empurra entre Estado e Prefeitura na alocação de recursos. Os países desenvolvidos convivem muito bem com polícias federais, estaduais e municipais porque possuem limitações, respeito entre as organizações e um Sistema de Justiça Criminal bem consolidado e amparada por leis fortes.
A Policia exerce função essencial à justiça. Não é instrumento político-partidário. A segregação pela justiça e a ingerência partidária em questões técnicas e de carreira dificultam os esforços dos gestores e operadores de polícia, criam animosidade, desviam efetivos e reduzem a eficácia e a confiança do cidadão nas leis, na polícia e no sistema de justiça criminal que, no Estado Democrático de Direito, garante a ordem pública e os direitos da população à justiça e segurança pública.
ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.
sexta-feira, 12 de outubro de 2012
ATUAÇÃO DA GUARDA MUNICIPAL CAUSA DISCÓRDIA ENTRE DELEGADO E CORONEL ELEITOS
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