ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.

domingo, 31 de março de 2013

DANDO "AULA" DE PEGA



PM flagrado dando 'aula' de pega na Barra, no Rio, pode ser expulso

Policial que 'ensinou' jovens e seu parceiro estão presos no batalhão. Prefeitura prometeu instalar mais radares eletrônicos no trecho.

Do G1 Rio, 30/03/2013 20h06





Estão presos na sede do Batalhão da Polícia Militar no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste do Rio, o sargento Maurício da Silva Maurício e o cabo Talvanis Luna da Silva, flagrados junto de jovens que se reúnem para disputar pegas na Avenida das Américas, na Barra da Tijuca. Um dos PMs não só deixa de autuar os jovens, mas também dá uma aula de como fazer o racha sem chamar atenção, como mostrou o RJTV. Os dois vão responder ao Conselho de Disciplina e poderão ser expulsos da PM.

Para coibir o excesso de velocidade, a prefeitura prometeu instalar mais radares eletrônicos nas pistas laterais da Avenida das Américas, onde o grupo de jovens se reúne, em um posto de gasolina. No trecho de cerca de um quilômetro, não há radares para controle de velocidade.

Moradores reclamam

Os moradores que reclamam da situação preferem não se identificar porque, segundo eles, muitos dos corredores são vizinhos.

“Cansei de acionar através de telefone, através de e-mail, os órgãos municipais e estaduais, e a gente não consegue obter retorno”, conta um morador.

Em alta velocidade, os participantes do pega dividem espaço com motoristas que trafegam normalmente pela avenida. “Cansei de acionar por telefones e e-mails os órgãos municipais e estaduais e a gente não consegue obter retorno. Eu chego a ver numa pista a polícia e no outro lado o carro do pega”, disse um morador.


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sábado, 30 de março de 2013

CASO ANA PAULA: POLÍCIA DEMORA E JUSTIÇA MANDA SOLTAR SUSPEITOS


ZERO HORA 30 de março de 2013 | N° 17387

CASO ANA PAULA. Justiça liberta três suspeitos

Três meses após o crime, assassinato da jovem de Santa Cruz ainda não foi elucidado pela polícia



Os únicos suspeitos de envolvimento na morte de Ana Paula Sulzbacher, 15 anos, estão em liberdade. O prazo de um mês da prisão temporária expirou e, embora a Polícia Civil tenha requisitado a prorrogação do cárcere, a Justiça negou o pedido.

Ana Paula foi encontrada morta no pé de um penhasco no Parque da Cruz, ponto turístico de Santa Cruz do Sul, há mais de três meses. Há 30 dias, o delegado Ribeiro Neto pediu pela prisão de dois suspeitos, alegando controvérsia nos seus depoimentos e com base em outros indícios, mantidos em sigilo, e foi atendido. O nome deles também não foi revelado para não prejudicar as investigações, justificou, na época, o delegado responsável pelo caso.

Na noite de quinta-feira, depois de receber o alvará de soltura da Justiça, conforme o diretor do presídio, Edson Rodrigues, os homens foram soltos. De acordo com o delegado regional da Polícia Civil, Julci Severo, a falta de provas impediu que os suspeitos permanecessem presos:

– Desde o começo do caso, fomos prejudicados com a falta de provas, exigidas pela Justiça para comprovar a autoria do crime. As perícias e os exames que poderiam nos ajudar demoram a vir e alguns resultados ainda não chegaram – esclarece Severo.

O delegado regional não soube precisar quais exames ainda não foram concluídos, mas um deles seria a análise de material genético no carro de um dos suspeitos, que comprovaria a ligação com o caso. No mesmo dia em que ocorreram as prisões, a polícia apreendeu dois veículos e os encaminhou para perícia. Além disso, roupas de Ana Paula também foram enviadas para análise.

– Embora os suspeitos não tenham confessado o crime, temos provas documentais, mas apenas isso não basta – salienta o delegado regional, que acompanha as investigações.

Ele afirma, ainda, que a tragédia de Santa Maria foi prioridade do Instituto-geral de Perícias (IGP) durante muito tempo, mas que, com a conclusão do inquérito, espera que os exames requisitados em Santa Cruz do Sul sejam agilizados.

Uma das hipóteses apontadas pela polícia é de que Ana Paula tenha sido vítima de um crime circunstancial, provocado por pessoas desconhecidas e que, possivelmente, tenham se aproveitado de ela estar sozinha à noite.

VANESSA KANNENBERG



quinta-feira, 28 de março de 2013

BRINCANDO COM FOGO

O Estado de S.Paulo, 28 de março de 2013 | 2h 08

OPINIÃO

A exemplo do que ocorreu no ano passado com a desocupação da área de Pinheirinho, em São José dos Campos, a execução de uma ordem judicial de reintegração de posse de um terreno no bairro Iguatemi, na zona leste de São Paulo, se converteu em mais um embate político entre o PT e o PSDB e terminou em tumulto. Convocada por um juiz de Itaquera, a Tropa de Choque da Polícia Militar (PM) iniciou às 6 horas a remoção das 700 famílias que ocuparam ilegalmente a área, mas suspendeu a operação no final da manhã, depois que o prefeito Fernando Haddad manifestou a intenção de desapropriar a área e o governador Geraldo Alckmin acionou o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Ivan Sartori.

Haddad e Alckmin disseram que chegaram a um acordo por temer que o confronto entre a PM e os invasores resultasse em mortes. Apesar de ter sido procurado por uma comissão de moradores da área invadida na mesma semana em que assumiu a Prefeitura, a verdade é que Haddad só agiu após a atuação da PM, que é subordinada ao governo estadual.

Com isso, o prefeito saiu bem na foto. Quando acenou com uma solução politicamente correta para os invasores, prometendo declarar o terreno área de utilidade pública, Alckmin já havia sofrido o desgaste político causado por uma operação policial sobre a qual não tinha responsabilidade, uma vez que a PM foi convocada pela Justiça para executar uma ordem judicial.

Foi uma situação semelhante à da desocupação da área do Pinheirinho, em janeiro de 2012, quando movimentos sociais, o PT e pequenos partidos de esquerda conseguiram atribuir ao governador a imagem de culpado pela remoção forçada de 1.600 famílias. O incidente foi amplamente usado nas eleições municipais de outubro pelo PT, que acabou derrotando o PSDB não só em São José dos Campos, mas em outras cidades do Vale do Paraíba - o principal reduto eleitoral de Alckmin.

A exploração política da execução de ações de reintegração de posse teve início há cerca de três décadas, quando os movimentos sociais começaram a estimular as invasões de propriedades privadas em áreas urbanas. À medida que as ocupações se repetiam, os advogados desses movimentos passaram a usar os recursos previstos pelo Código de Processo Civil para acelerar ou retardar a tramitação das ações impetradas pelos proprietários para preservar suas propriedades. O objetivo dos movimentos sociais era levar a Justiça a julgar essas ações e a autorizar sua execução no período de campanhas eleitorais, criando situações de fato que beneficiam os partidos de esquerda vinculados a ONGs e associações comunitárias e constrangem prefeitos e governadores.

O cronograma da ação de reintegração da gleba do bairro Iguatemi é um exemplo dessa estratégia. O processo foi aberto em junho do ano passado. A ordem de reintegração foi emitida dois meses depois pelo juiz Jurandir Abreu Júnior. Entre o final de 2012 e o início de 2013, ele recebeu quatro pedidos de suspensão da reintegração de posse, tendo negado todos. Há um mês, receando a exploração política da operação, já que o embate entre o PT e o PSDB pelo Palácio dos Bandeirantes já começou, a PM pediu o adiamento da reintegração, alegando falta de efetivo. O juiz não acolheu o pedido e ordenou à PM que promovesse a reintegração.

A exploração política da execução de ações de reintegração de posse também tumultua o Judiciário, disseminando incerteza jurídica. Diante da interferência dos políticos, o juiz Jurandir de Abreu Júnior acolheu o pedido de suspensão feito pelo governo do Estado e fixou o prazo de uma semana para que Haddad assine o decreto de desapropriação da área. Mas, para cumprir a promessa feita aos moradores da gleba invadida, a Prefeitura terá de pagar uma quantia vultosa ao proprietário - e, se depositar esse valor, estará estimulando uma onda de invasões na cidade e no Estado, abrindo com isso um perigoso precedente para todos os governos municipais e estaduais, já que os movimentos sociais exigirão um tratamento isonômico.



terça-feira, 26 de março de 2013

DEBATE MENOR


ZERO HORA 26 de março de 2013 | N° 17383

EDITORIAIS


Criou-se uma situação aberta aos mais variados entendimentos a decisão da Polícia Civil de sugerir também a responsabilização do prefeito de Santa Maria pela tragédia na boate Kiss. A partir desta citação, até mesmo como estratégia de defesa, setores políticos ligados ao governante passaram a questionar a suposta omissão de gestores estaduais, como se o dramático episódio devesse ser reduzido a uma disputa partidária. Ora, este debate é inaceitável, pois desrespeita as vítimas, seus familiares e não condiz com as expectativas da sociedade pela plena apuração dos fatos e pela correção das falhas que provocaram a morte de tantas pessoas.

Em primeiro lugar, cabe reconhecer o trabalho objetivo e bem fundamentado da Polícia Civil, que resultou em um exaustivo inquérito com mais de 13 mil páginas e na apresentação de provas testemunhais e técnicas convincentes. Ao propor, no relatório final, que o senhor Cezar Schirmer seja processado por homicídio culposo e improbidade administrativa, a polícia apenas provoca o Ministério Público e a Justiça, como é da praxe jurídica, a se manifestar sobre a existência de nexo causal entre as atribuições do administrador e o fato ocorrido. Caberá agora a essas duas instâncias, nos prazos estabelecidos, corroborar ou corrigir as investigações policiais, para que sejam bem conduzidas essas e outras questões.

O que a população deseja é que o caso seja plenamente esclarecido. Para que tal desejo se cumpra, nesta etapa decisiva para o MP e para a Justiça, as instituições precisam trabalhar sem os ruídos de interferências políticas. Nesse sentido, a cadeia de responsabilidades deve se estender até onde seja necessário, para identificar as negligências e as omissões criminosas que provocaram o infortúnio de tantas famílias, para que o julgamento dos responsáveis seja justo e no tempo adequado e também para que tragédias como essa sejam evitadas.

Investigações policiais que incluem ocupantes de cargos públicos entre seus personagens estão, naturalmente, propensas a questionamentos políticos. Não interessa à sociedade que esse tipo de abordagem se propague para além dos ambientes que reúnem, de um lado, setores ligados ao prefeito e, de outro, defensores do governador. O que as famílias das vítimas e a comunidade de Santa Maria, em especial, e todos os gaúchos e brasileiros esperam é que se faça justiça, sem a discriminação de even- tuais envolvidos e sem que qualquer gesto, antes dos veredictos, represente julgamentos públicos sumários. Ministério Público e Judiciário estão diante do processo sobre a maior tragédia do Estado e certamente farão tudo para que as melhores expectativas não sejam frustradas.

O julgamento da tragédia da boate Kiss deve ficar alheio a ruídos políticos, para que a lei alcance todas as esferas envolvidas.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Este inquérito teve a propriedade de mostrar o quanto custa o esforço da polícia civil para produzir uma carga burocrática que é o inquérito policial, uma peça considerada meramente acessória na justiça. Todos os depoimentos podem ser anulados, mas o relatório e as perícias serão peças essenciais ao processo. Na justiça, haverá um retrabalho com a retomada de depoimentos até o julgamento do fato, cuja sentença não será definitiva, pois recursos serão providenciados tanto pelas defesas como pela promotoria, podendo cair o transitado em julgado lá nas cortes supremas. Se tivéssemos no Brasil uma descentralização do transitado em julgado e um sistema de justiça criminal integrado, ágil e desburocratizado, com investigação policial se baseando no relatório policial, perícias e depoimentos em vídeo, a justiça assumiria seu papel tomando depoimentos e dando andamento bem mais rápido e oportuno, com recursos dentro do âmbito federativo.

POLICIAIS SUSPEITOS DE CHACINA


ZERO HORA 26 de março de 2013 | N° 17383

MATANÇA EM SÃO PAULO

Prisão para policiais suspeitos de chacina



A Justiça decretou a prisão preventiva de cinco dos oito policiais militares acusados de participar da morte de sete pessoas em São Paulo. Os suspeitos estavam temporariamente presos desde o dia 24 de janeiro. Os demais vão responder ao processo em liberdade.

Segundo testemunhas, no dia 4 de janeiro, homens encapuzados atiraram na direção de um grupo de pessoas em um bar. De acordo com a investigação, o ataque seria retaliação à divulgação de uma gravação em vídeo feita em frente ao bar em novembro de 2012. As imagens mostram um grupo de PMs executando um servente de pedreiro.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - "Onde não há justiça, aparecem os bandidos, rebeldes e justiceiros", uma citação antiga que o Brasil ainda não consegue entender. 

segunda-feira, 25 de março de 2013

AVE SANTA MARIA

O SUL, 25/03/2013

WANDERLEY SOARES

Um inquérito que Deus não presidiu é considerado perfeito


O governo - aqui de meu tugúrio, no alto de minha torre, sempre alerto que, por governo, leia-se Executivo, Legislativo e Judiciário, incluídos seus leguleios, não necessariamente nesta ordem - tem lá suas idiossincrasias das quais não consegue se afastar, como ocorre, num mesmo plano, com a imprensa em geral, hoje chamada de mídia, sob pena de deixar o governo de ser governo, de deixar a mídia de ser mídia. São poderes que obedecem aos fundamentos e à mesma fatalidade da natureza do escorpião no seu relacionamento com o sapo que lhe deu guarida. Na tragédia de Santa Maria, o governo reagiu como fera ferida. Precisava reagir para sobreviver e a mídia cumpriu e continuará cumprindo o seu papel ao colorir o inferno de 241 mortos e 28 acusados com as tintas da espetaculosidade

Ao longo dos anos - todos nós sabemos que não serão poucos - personagens e atores deste espetáculo assumirão novos perfis. Nomes nunca mencionados passarão ao primeiro plano e aqueles que hoje estão no centro do palco poderão ser esquecidos. Sobre isso, um espectador ilustrado, privilegiado e midiático declarou que o inquérito policial chegou ao fim não só como muito bom, mas tecnicamente perfeito. Ora, caros conselheiros, um delegado que usa óculos na testa na hora das fotos pode ser muito bom, mas daí a chegar à perfeição é coisa que só um temerário poderia afirmar. Com vênia de magistrados que aprendi a admirar, o primeiro homicídio (fratricídio) bíblico ainda é controvertido. E, agora, um inquérito no entorno de 241 mortos, sem Deus a presidir, atingiu a perfeição.

Não é do meu feitio citar a mim mesmo e nisso não vai a hipocrisia da falsa modéstia. Sou um caçador de gestos humanos. Nunca me sentirei bem sendo eu a minha própria caça. Somente alguém no extremo delírio da solidão poderá se olhar no espelho e à luz de sua imagem começar a olhar o mundo. Nunca estou só, pois, num primeiro plano, materializados sempre estão os meus conselheiros encapuzados e me é fácil colocar no papel o que eles pensam melhor do que penso eu. Ainda assim, vou lembrar o que disse há algumas semanas sobre a tragédia que definitivamente marcou a nossa querida Santa Maria. Sob o trauma que ainda nos abate, repito que todos nós estamos gaseados, todos nós armamos aquela tocaia. Preparemo-nos, pois estaremos todos sepultos e todos estaremos no banco dos réus.

A CHEGADA DOS DRONES


G1 - 25/03/2013 08h51

Polêmicos e revolucionários, mais de 200 'drones' voam no país sem regra. Levantamento inédito feito pelo G1 mostra emprego civil e militar no Brasil. Uso dos "aviões-robôs" em ataques militares dos EUA é polêmica mundial.

Tahiane Stochero. Do G1, em São Paulo







Mais de 200 drones – veículos aéreos não tripulados (vant, na sigla em português) – estão em operação no Brasil sem que exista regulamentação para o uso civil e comercial destas aeronaves. O número foi obtido a partir de levantamento realizado pelo G1 com fabricantes, importadores, empresas e órgãos de governos estaduais.

Os drones – zangão ou zumbido, em inglês – desempenham funções que antes dependiam de aviões e helicópteros tripulados, buscando maior eficiência e alcance, redução de custo e mais segurança (veja nos vídeos ao lado drones em ação no Brasil e voos dos dois tipos mais comuns).

A nova tecnologia virou polêmica nos Estados Unidos e em todo o mundo depois que o país desenvolveu avançados modelos armados e passou a usar regularmente os "aviões-robôs" para destruir alvos no Oriente Médio.

Milhares de pessoas já foram mortas em ataques de drones, muitas delas inocentes, todas sem julgamento ou chance de defesa. A revista "Time", na edição da última semana de março de 2013, publicou a reportagem intitulada "Então, quem nós podemos matar?" (So, Who Can We Kill?), com um debate sobre a moralidade do uso bélico dos drones. O tema é recorrente nas principais revistas e jornais americanos. Entre membros da Organização das Nações Unidas (ONU), a preocupação é de que mais países passem a utilizar os drones como arma, numa escalada das mortes à distância.

Apesar de popularizado pela controversa utilização militar, é o uso civil dos drones que pode transformar inúmeros serviços. Com formatos e tamanhos variados, o número de máquinas voadoras controladas remotamente deve crescer em ritmo acelerado nos próximos anos no país e no mundo, devido à facilidade de voo, ao baixo custo e às inovações tecnológicas preparadas para cada modelo, como uso de câmeras, filmadores, sensores de raio-x, dentre outros.



Entusiastas falam em "revolução dos drones" e projetam milhares de aparelhos nos céus, em breve, seja a serviço do governo e de empresas ou para realizar tarefas cotidianas como entregar produtos, regar o gramado, acompanhar crianças até a escola ou guiar turistas pela cidade.

Hoje, distantes das indústrias, estudantes e apaixonados por tecnologia desenvolvem drones artesanais, aproveitando processadores, baterias e componentes retirados de smartphones e outros equipamentos eletrônicos.

Em alguns países, vants são usados para inspeção de linhas de transmissão, de rodovias ou grandes obras por transmitirem imagens em tempo real. Neste caso, são utilizados modelos pequenos, de até 2 kg, que sobrevoam centenas de quilômetros diariamente, bem próximos aos cabos da rede, identificando fios rompidos, ocupações irregulares e outros problemas.

As informações enviadas para a central são precisas, e o serviço de manutenção é acelerado. No Brasil, algumas empresas já estão começando a testá-lo no lugar de helicópteros.

Outro trabalho realizado por drones é o levantamento aéreo de terrenos, para cartografia, geografia e topografia, bem como serviços de filmagem para engenharia, mineração e indústria cinematográfica. Governos fazem uso da novidade principalmente nas áreas de segurança e de prevenção de desastres.

Só a AGX Tecnologia, uma das 15 indústrias que produzem esse tipo de aeronave no Brasil, diz ter vendido mais de 100 vants desde 2005, de acordo com o diretor Adriano Kancelkis. Entre os clientes estão órgãos públicos, consultorias ligadas ao ramo ambiental e fazendeiros que usam os drones para monitorar lavouras.

Outra empresa, a BRVant, já vendeu ao menos 35 para militares, agricultores e órgãos públicos, e também exportou outros para a América Latina. Segundo o proprietário, o engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) Rodrigo Kuntz, a falta de entendimento entre Aeronáutica e Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) sobre as regras necessárias para que esses aviões possam operar e serem certificados impede que as vendas sejam maiores.

'Assassinato sem julgamento'

Os Estados Unidos perceberam o potencial militar e passaram a usar drones para atacar alvos suspeitos de terrorismo no Afeganistão, Paquistão, Iêmen, Somália, além de monitorar outros países. A eficácia das missões é contestada por organizações de direitos humanos, que apontam um grande número de inocentes entre as vítimas e contestam a legalidade do recurso. Críticos falam em "assassinatos sem julgamento", "guerra suja" e "violação das leis internacionais".

Predator é um drone de guerra desenvolvido para a Força Aérea dos Estados Unidos(Foto: Reuters)


O aumento exponencial do uso da tecnologia dos drones em diversas situações representa um verdadeiro desafio para o direito internacional atual"
Ben Emmerson, relator de investigação das Nações Unidas (ONU) sobre uso de drones

A Fundação Nova América, baseada em Washington, contabiliza 350 ataques desde 2004, a maioria durante o governo de Barack Obama, com número de mortos entre 1.963 e 3.293, incluindo entre 261 e 305 civis. Segundo o Escritório de Jornalismo Investigativo, em Londres, o número de vítimas fatais em ataques americanos com drones é maior, entre 2.627 e 3.457, sendo entre 475 e 900 civis. No dia 20 de fevereiro, o senador republicano Lindsey Graham, defensor do uso de drones em ataques militares, disse que o número de mortos soma cerca de 4.700 pessoas, incluindo inocentes.

A Organização das Nações Unidas (ONU) lançou em janeiro uma investigação sobre as vítimas civis de disparos de drones e pretende identificar possíveis casos de "execuções extrajudiciais". Segundo o relator especial Ben Emmerson, "o aumento exponencial do uso da tecnologia dos drones em diversas situações representa um verdadeiro desafio para o direito internacional atual".

Na sociedade americana, houve manifestações por maior transparência nas regras usadas para os ataques. Segundo a ONU, 51 países já possuem essa tecnologia e há preocupação de que outros países resolvam usar o drone como arma além das fronteiras, como fazem os EUA, sem um inimigo claro. Em meio à pressão, Obama reconheceu que os americanos "merecem saber mais sobre os ataques" e prometeu trabalhar junto ao Congresso.

Os Estados Unidos possuem mais de 7.800 drones ao redor do mundo. Um terço do total de aeronaves da força aérea do país não é tripulado, e quase metade dos pilotos em formação vai comandar esse tipo de equipamento futuramente.



Avião-robô é realidade no Brasil

O uso militar e principalmente as aplicações civis dos veículos aéreos não tripulados fizeram o Brasil investir na nova tecnologia, transformando-se em um centro emergente de pesquisa, fabricação e utilização de drones.

O Brasil conta com 15 das 44 indústrias de drones na América Latina e reúne ao menos outras 5 empresas desenvolvendo sistemas, segundo a Associação Internacional de Veículos Não Tripulados (AUVSI) e a Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (Abimde).

Apesar de pouco conhecidos e discutidos, os drones são realidade em vários setores do país, sendo usados nas áreas de energia, mineração, agricultura, rodovias e construção civil, além de ajudar no trabalho de órgãos policiais, ambientais e de defesa civil. Centros de pesquisa e desenvolvimento de projetos, montados em universidades com financiamentos do governo e da iniciativa privada, trabalham na construção de vants dos mais variados tamanhos, formas e serventias. Outros modelos são importados de países que já usam drones há mais tempo.

PF usa para fazer prisão no Paraná

No final de 2012, a Polícia Federal utilizou um vant israelense para seguir uma embarcação suspeita na tríplice fronteira com o Paraguai e a Argentina, em uma operação sigilosa contra o tráfico de drogas e o contrabando de armas.

A aeronave transmitiu em tempo real imagens de boa qualidade, feitas à noite, a investigadores do Núcleo Especial de Polícia Marítima da Polícia Federal (Nepom), que puderam realizar a prisão em flagrante dos criminosos. Outra ação usando o equipamento também teve êxito, e suspeitos de tráfico em região próxima à Usina de Itaipu foram presos.

A PF não deu maiores detalhes das operações, mas disse que o drone israelense tem custo operacional até 10 vezes inferior ao de um helicóptero tripulado. As duas unidades do modelo Heron, fabricados pela Israel Aerospace Industries Ltd (IAI), chegaram ao Brasil em 2010 ao custo de aproximadamente R$ 80 milhões cada. Os vants ficam alojados na Base Aérea de São Miguel do Iguaçu (PR) e são os únicos de uso civil certificados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) no país.

Bope receberá em 2013

O Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e a Defesa Civil do Rio de Janeiro vão contar ainda em 2013 com cinco unidades de um drone produzido pelo governo em parceria com o Instituto Militar de Engenharia (IME), do Exército. A aeronave foi utilizada durante as chuvas na Região Serrana e no distrito de Xerém, em Duque de Caxias, no início do ano.

A aeronave não tripulada irá revolucionar o trabalho de prevenção a desastres". Coronel Douglas Paulich Júnior, da Defesa Civil do Rio de Janeiro

É uma ferramenta maravilhosa, tanto para o patrulhamento de rodovias, acompanhamento de queimadas, quanto para inteligência, para monitorar ações de traficantes". Capitão Arlindo Bastos de Miranda Neto,
da Polícia Militar da Bahia

Com o vant, ganha-se muito em relação a corte de despesas e segurança, quando se compara com o uso de um helicóptero. O vant pode obter imagens de alta qualidade com um custo operacional por hora de R$ 10"
Adriano Kancelkis, diretor da fabricante AGX

"As imagens captadas por ela nos deram um conjunto rico de informações sobre onde era prioritário atuar, onde havia entulhos a serem retirados e para mapear o terreno e entender o que havia ocorrido", afirma o coronel Douglas Paulich Júnior. "A aeronave não tripulada irá revolucionar o trabalho de prevenção a desastres".

A Polícia Militar do Rio de Janeiro informou que o projeto de operação dos vants ainda está em estudo e que ainda não há conclusão sobre como os aparelhos serão empregados.

O modelo tem dois metros de envergadura e é elétrico, com alcance de 10 quilômetros e uma hora de autonomia de voo. Cada equipamento custa R$ 180 mil e transmite imagens em tempo real para uma espécie de óculos usado pelo operador em terra.

"Pretendemos fazer um vant brasileiríssimo, 100% nacional, inclusive com os sistemas e os sensores. Além da produção, vamos treinar os pilotos da polícia e dos bombeiros. O Bope separou até um grupo para um curso de três meses. Nosso objetivo é que saibam operar com segurança", diz o major Jacy Montenegro Magalhães Neto, gerente do projeto no IME.


PM usa na área ambiental em SP

A Polícia Militar de São Paulo comprou dois modelos da empresa AGX em 2012 e aguarda certificação dos equipamentos junto à Anac para usar na área ambiental.

Como teste, os drones foram usados para monitorar uma embarcação em área de exploração proibida e registrar em imagens os trabalhos ilegais realizados nas margens de um rio. A PM também estuda o uso para policiamento e no apoio a bombeiros em operações de salvamento no mar.

O comando da PM da Bahia está criando, dentro do seu grupamento aéreo, uma subunidade encarregada de planejar como os vants poderão ajudar no combate ao crime na divisa com Pernambuco, em uma região conhecida como Polígono da Maconha. "Já empregamos em testes e vamos adquirir alguns aviões ainda em 2013. É uma ferramenta maravilhosa, tanto para o patrulhamento de rodovias, acompanhamento de queimadas, quanto para inteligência, para monitorar ações de traficantes", diz o capitão Arlindo Bastos de Miranda Neto.

Drone para inspeção de energia

A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) já investiu R$ 4 milhões para construir um drone, em parceria com a Fundação para Inovações Tecnológicas (Fitec), visando à redução de custos na inspeção de redes de transmissão de energia, hoje feita com helicópteros. Com possibilidade de viajar até 100 quilômetros, voando a 150 metros do solo para obter imagens detalhadas nas missões de inspeção, o protótipo ainda passa por testes e aguarda licença da Anac para operar.

"Já é possível, com ele, identificar casos de invasão de faixa de servidão (área abaixo e próxima da linha de transmissão que não pode ter ocupação), de realizações de obras, com movimentação de terras, próximos às estruturas, de ocorrências de erosões no pé da torre e de vegetações abaixo da linha, coisas que podem colocar em risco o sistema elétrico", afirma Jaelton Avelar Fernandino, gerente de Gestão Tecnológica da Cemig.

O emprego do vant no Brasil é muito promissor, principalmente para fotos aéreas, planejamento urbano, controle de tráfego de rodovias, identificação de pontos críticos em estradas ou em grandes obras, controle de plantações ou na pecuária". Luiz Munaretto, diretor da Organização Brasileira para o Desenvolvimento da Certificação Aeronáutica (DCABR)

A Petrobras firmou uma parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) para criar um drone apto a fiscalizar mais de 14 mil quilômetros de faixas de oleodutos, trabalho hoje realizado a pé pelos técnicos da empresa. O objetivo é desenvolver um aparelho capaz de verificar possíveis invasões e irregularidades, avaliar danos que possam colocar em risco a distribuição de óleo e agilizar os trabalhos de manutenção. Testes preliminares foram feitos em uma área do Exército no Rio de Janeiro, mas a decisão sobre adotar ou não os drones ainda não foi tomada.

"Ainda não temos a dimensão de quanto um vant pode reduzir custos e nos garantir rapidez na identificação de problemas. Isso só será possível quando levarmos para o uso real em um processo sistemático. Espero que até 2014 consiga ter uma avaliação, para que a empresa decida ou não como empregar a aeronave", diz Heitor Araujo, do departamento de tecnologia da Petrobras.

A Energia Sustentável do Brasil, consórcio que administra a construção da Hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, usou drones para monitorar a retirada da vegetação do reservatório da usina. As imagens localizaram áreas de desmatamento ilegal na floresta amazônica e foram entregues ao Ibama para avaliação.

Na agricultura, drones são usados por empresas que atuam com levantamentos topográficos, mapeamento aéreo, consultoria ambiental, controle de pragas, correção de problemas, entre outros serviços. Diversas empresas investem no desenvolvimento de sistemas sofisticados de sensores e de gravação e transmissão de dados.

A AGX, empresa que desde 2002 foca no uso agrícola dos drones, já vendeu modelos para vigilância de usinas de cana de açúcar e para agricultura de precisão. Os vants tem preços que variam entre R$ 60 mil e R$ 800 mil, dependendo das configurações e do tipo de sistema instalado, e podem voar até quatro horas seguidas. Entre os clientes, além de empresas e de cooperativas, estão fazendeiros que fazem uso particular dos dispositivos.

Um novo modelo, construído em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), o Centro Tecnológico do Exército (CTex) e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) foi lançado há poucos dias com uma novidade: um airbag capaz de proteger a aeronave em pouso vertical.

"Com o vant, ganha-se muito em relação a corte de despesas e segurança, quando se compara com o uso de um helicóptero. O vant pode obter imagens de alta qualidade com um custo operacional por hora de R$ 10. Enquanto que a hora de um voo de helicóptero fica em R$ 1.500 ou mais", afirma Adriano Kancelkis, diretor da AGX.

"O emprego do vant no Brasil é muito promissor, principalmente para fotos aéreas, planejamento urbano, controle de tráfego de rodovias, identificação de pontos críticos em estradas ou em grandes obras, controle de plantações ou na pecuária", diz Luiz Munaretto, diretor da Organização Brasileira para o Desenvolvimento da Certificação Aeronáutica (DCABR), que trabalha em parceria com a Anac para regulamentar o uso de drones no país.

FAB usará vant israelense em ações de segurança na Copa (Foto: Ministério da Defesa/divulgação)

O drone é a evolução do poder de combate, ele sintetiza tudo [...] É uma arma completa". General Alvaro Pinheiro, especialista em terrorismo

Copa do Mundo e Olimpíada

Em 18 de fevereiro, a Força Aérea Brasileira (FAB) recebeu dois aviões não tripulados feitos pela empresa israelense Elbit, que custaram R$ 48,174 milhões e serão montados em Santa Maria (RS), de onde devem operar a partir de março. Sem serem equipados com armas, os modelos vão reforçar a segurança nas sedes da Copa do Mundo de 2014 e na Olimpíada de 2016. Em junho deste ano, o sistema será testado durante a Copa das Confederações.

Até 2014 deve ficar pronto o Falcão, drone de mais de 800 kg que está sendo produzido pela brasileira Avibras com investimento do Ministério da Defesa e que será vendido pela Harpia (parceria da Embraer, Avibras e a israelense Elbit).

O modelo está entre os favoritos para ser adquirido pelos militares brasileiros. Um dos projetos, inclusive, é equipar o vant com mísseis e bombas para fins de combate.

"O drone é a evolução do poder de combate, ele sintetiza tudo. Ele tem sensores capazes de localizar qualquer coisa, consegue transmitir a informação em tempo real para qualquer lugar – o que só o drone é capaz – e pode neutralizar e eliminar a ameaça naquele exato momento. É uma arma completa", diz o general Alvaro Pinheiro, especialista em terrorismo e defensor da capacidade brasileira em operar drones com armas.

"O projeto existe, mas vai ficar para o futuro. Por enquanto, o foco prioritário é vigilância e monitoramento. O assunto é ainda bastante delicado. Precisamos primeiro avançar na atuação de vants de reconhecimento", afirma Renato Tovar, diretor da Avibras.

Entre as ações militares que as Forças Armadas planejam fazer empregando drones também estão o monitoramento de fronteiras, a segurança de instalações estratégicas como usinas e plataformas, a proteção da Amazônia, e a defesa da costa brasileira.

Fim da privacidade e riscos à aviação

A capacidade de circular sem serem percebidas, guiadas remotamente a partir de informação recebida por sensores e câmeras, faz com que os drones sejam motivo de desconfiança. Em vários países há debate sobre ética e moral no emprego de drones, principalmente no que se refere a questões de privacidade.

Há temor de que a falta de transparência no uso dos veículos encubra possíveis abusos no monitoramento de áreas e pessoas, com interceptação de conversas telefônicas, fotografias e filmagens feitas de maneira irregular. Países e indústrias já estão sujeitos à espionagem, por exemplo.

Produzido pela Avibras, o drone Falção é uma das opções para o Exército (Foto: Avibras/Divulgação)

Devido aos novos desafios e características associadas ao voo remoto, são necessárias adequações na regulamentação deste tipo de aeronave para garantir níveis de segurança"

Agência Nacional de Aviação Civil (Anac)
Companhia de energia de Minas Gerais usa vant  para inspecionar linhas (Foto: Cemig/Divulgação)
O maior desafio, no mundo todo, é tentar integrar a aeronave remotamente pilotada às aeronaves pilotadas"
capitão José Augusto de Almeida, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA)

A verdade é que a tecnologia dos drones avança mais rapidamente do que o mundo é capaz de refletir sobre o seu uso e seus benefícios, abrindo espaço para projeções paranóicas de um futuro em que não será possível escapar do raio de ação dos drones. Com os céus repletos de pequenas aeronaves equipadas com alta tecnologia, como saber quem está operando o aparelho, quais informações estão sendo recolhidas e que usos serão feitos desses dados?

As autoridades temem ainda o risco de colisão com aviões e obstáculos aéreos, bem como a possibilidade de que o equipamento caia sobre áreas habitadas, colocando em risco a vida de pessoas em solo. Controlados de uma cabine, os drones circulam sem garantia de que os operadores tenham total conhecimento da situação no ar.

"Vant é como um avião. Não se pode impor as mesmas regras para um ultraleve e para um Airbus voarem. São tipos e tamanhos diferentes, com funções diferentes. Há vants pequenos e grandes, usados para coisas diferentes", explica o engenheiro Flávio Araripe, referência no tema no Brasil desde 1980, quando começou a estudar drones dentro da Aeronáutica.

O caminho seguro para que vants consolidem-se como ferramentas benéficas à sociedade é a regulamentação e a fiscalização das aeronaves e de seus operadores. O responsável pelo controle da aviação civil nos Estados Unidos deve divulgar ainda em 2013 normas referentes aos voos domésticos de drones. Vários países aguardam o documento para servir de base na criação de suas próprias leis.

Atualmente, a operação civil ainda é bem controlada nos Estados Unidos, restrita a liberação de licenças individuais e proibida em regiões habitadas.

No Brasil, a Anac reconhece a importância do uso civil dos drones, tanto para indústria como para a sociedade, mas afirma que, "devido aos novos desafios e características associadas ao voo remoto, são necessárias adequações na regulamentação deste tipo de aeronave para garantir níveis de segurança".

Na prática, apesar da pressão de empresas do setor, apenas os dois vants da Polícia Federal estão aptos a voar após terem recebido um Certificado de Autorização de Voo Experimental (Cave), expedido para casos especiais, garantia de que a agência fez a avaliação do projeto técnico e de aeronavegabilidade, atestando as condições de segurança da aeronave.

A agência esclarece que, mesmo nos países em que existe a regulamentação sobre o tema, ainda há limitações na legislação devido à inexistência de especificações de aparelhos e de seus operadores, "que vão desde os critérios técnicos que um projeto deve atender até o treinamento necessário para as pessoas envolvidas", garantindo "que os vants possam ser integrados com segurança no espaço aéreo".

Tanto as normas da Anac quanto as regras do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), da Aeronáutica, proíbem totalmente o voo de drones sobre cidades brasileiras. As demais operações precisam ser comunicadas à Aeronáutica com antecedência de 15 a 30 dias, para evitar que os veículos dividam o espaço aéreo com aviões comerciais.

"Nenhum país atualmente permite voo livre de vant. Sempre é um processo de autorização especial, concedido caso a caso. O maior desafio, no mundo todo, é tentar integrar a aeronave remotamente pilotada às aeronaves pilotadas", afirma o capitão José Augusto de Almeida, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), um dos especialistas do tema no país.

Em outubro de 2012, a Anac publicou no Diário Oficial a Instrução Suplementar (IS) 21-002, que prevê requisitos básicos para certificar os veículos. Drones totalmente autônomos são proibidos. Interessados em obter a licença devem enviar para a agência informações sobre o modelo e o propósito da operação.

O Brasil lidera na América do Sul, e também desponta no mundo, com iniciativas que envolvem o acesso de aeronaves remotamente controladas ao espaço aéreo". John Scull Walker, que integra um grupo que propõe regras para o uso de drones nos EUA

O governo brasileiro está sendo o mais ativo na América Latina na abertura de seus céus para as vantagens e benefícios de aeronaves remotamente controladas". Gretchen West, vice-presidente da Associação Internacional de Veículos Não Tripulados (AUVSI)

"O Brasil lidera na América do Sul, e também desponta no mundo, com iniciativas que envolvem o acesso de aeronaves remotamente controladas ao espaço aéreo. É um tema que envolve várias preocupações com a segurança", diz John Scull Walker, que integra um grupo que propõe regras para o uso de drones dentro dos Estados Unidos e outro que discute e regula internacionalmente o tema.

"O governo brasileiro está sendo o mais ativo na América Latina na abertura de seus céus para as vantagens e benefícios de aeronaves remotamente controladas e também no crescimento da indústria. No mundo todo, a regulação é restritiva em relação a áreas urbanas e a aplicação, apesar de crescente, é ainda muito limitada", diz Gretchen West, vice-presidente da Associação Internacional de Veículos Não Tripulados (AUVSI).

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) não informa o número de vants no país porque o cadastro de aviões experimentais, usado para as aeronaves remotamente pilotadas, também engloba outros tipos de modelos, não sendo possível separar só os drones. Em 2012, a Anac tinha registrado 4.750 aeronaves experimentais. Apenas as duas unidades usadas pela PF, no entanto, estão autorizadas a voar.

Com o "boom" dos drones, a Administração Federal de Aviação (FAA) dos Estados Unidos expediu, desde 2007, mais de 1.400 licenças de operação para veículos de uso doméstico, sendo que 327 seguem listados como "ativos". Boa parte dos pedidos foi feito por unidades policiais, universidades, agências federais e departamentos de transporte. Só a agência responsável pela proteção das fronteiras conta com dez aeronaves para monitoramento dos limites com o México e o Canadá.

Estados Unidos, Israel, Irã, Rússia, China, Inglaterra, Itália e Paquistão lideram a produção e a utilização militar de drones, segundo a Federação Global UVS International, enquanto que Austrália, Canadá, França, Inglaterra e Espanha figuram entre os países mais avançados no uso civil e comercial das aeronaves.

MORTE DE OFICIAL DE JUSTIÇA HÁ QUATRO ANOS SEM ILUCIDAÇÃO

ZERO HORA 25 de março de 2013 | N° 17382

OFICIAL DE JUSTIÇA - Após quatro anos, morte ainda não foi elucidada


A morte do oficial de Justiça Paulo José Athanásio Carneiro, 35 anos, em 28 de fevereiro de 2009, é o típico caso policial cercado de mistérios. Carneiro foi encontrado sem vida dentro do pátio da Delegacia de Delitos de Trânsito, em Porto Alegre, atrás do Palácio da Polícia Civil (a sede da corporação), o Departamento de Criminalística não foi chamado para periciar o corpo e o Departamento Médico Legal (DML) não conseguiu apontar a causa da morte.

E ainda há mais dois aspectos que aumentam o enigma: dois policiais são suspeitos de espancar a vítima, mas não existem provas contra os agentes. Carneiro surgiu na delegacia por volta das 5h daquele sábado. Tinha pulado a cerca de tela e invadido o pátio aos gritos. Minutos depois, morreu no estacionamento, em meio a viaturas.

Duas ambulâncias foram ao local e um médico atestou a morte de Carneiro, provocada, aparentemente, por parada cardíaca. Sob essa justificativa, agentes de plantão na 1ª Delegacia de Pronto Atendimento evitaram chamar peritos criminalísticos. Naquela hora, sequer identificaram a vítima, porque documentos de Carneiro estariam sumidos.

Nem policiais nem médicos teriam se preocupado com as lesões na vítima – arranhões na testa, joelhos e cotovelos esfolados e cortes nas palmas das mãos. O corpo foi recolhido ao DML, exame de urina apontou presença de cocaína, mas o laudo da necropsia relatou morte por “causa indeterminada”.

A ocorrência de “falecimento por morte súbita de um homem de aproximadamente 40 anos”, registrada na Delegacia de Delitos de Trânsito, gerou, cinco meses depois, a abertura de um inquérito na 2ª Delegacia da Polícia Civil (2ª DP), no bairro Menino Deus.

A partir daí, o caso começou a mudar de morte súbita para suspeita de assassinato. Foi localizada uma testemunha que afirmou ter visto, em meio à escuridão, vultos de dois homens desferindo pontapés em um pessoa caída. A vítima tentava se esconder embaixo de um carro, mas era puxada para fora, e gritava “socorro, socorro, não sou bandido, olha meus documentos”.

Os vultos seriam de dois policiais – um já aposentado – que estavam de plantão na Delegacia de Trânsito naquela madrugada. Os dois prestaram depoimento à 2ª DP e negaram qualquer agressão. Garantiram que chamaram socorro para Carneiro e citaram o nome de um homem como testemunha. Interrogado, o homem negou que estivera no local naquela madrugada. Dias depois, apareceu para depor outro homem afirmando ser ele a testemunha e que os policiais falaram a verdade. O inquérito está em poder do Ministério Público, que analisa o caso.

JOSÉ LUÍS COSTA

Quem era a vítima

- Estudante de Filosofia, casado, pai de um menino recém-nascido, Paulo José Athanásio Carneiro, 35 anos, estava em um momento especial na vida. Aprovado em um concurso para oficial de Justiça, havia 15 dias exercia a atividade, em Pinheiro Machado, na Campanha.

- Horas antes da morte, Carneiro retornou para Porto Alegre, onde morava sua família, pois pretendia transferir a matrícula para uma faculdade do Interior. Momentos antes de morrer, saiu da casa da mãe para fazer um lanche. Procurada por Zero Hora, ela evitou falar.

sexta-feira, 22 de março de 2013

DICAS POLÊMICAS DE SEGURANÇA


Polícias oferecem dicas polêmicas de segurança. Recomendações como sempre ter um dinheiro extra para não irritar os criminosos são comuns

O GLOBO
Atualizado:22/03/13 - 8h00


RIO — Depois de retirar de seu site oficial as inusitadas dicas de segurança que incluíam até mesmo um treinamento para que sequestrados fugissem de porta-malas de carros e orientavam o cidadão carregar sempre uma quantia extra no bolso para não irritar os ladrões em caso de assalto, pode-se constatar que a Polícia Militar da Bahia não está isolada. Em outros estados, órgãos semelhantes fazem recomendações surpreendentes que, combinadas, podem deixar a população em estado de permanente paranoia.

O site da Polícia Civil de Minas Gerais recomenda aos cidadãos não entrarem em elevadores com pessoas estranhas ou suspeitas, e reforça: “Caso seja necessário, diga algo como: Puxa, esqueci a minha chave!”. Dicas adiante, a organização sugere a utilização de motéis para encontros íntimos. “Não use local isolado para encontros amorosos, pois este é um comportamento de risco. Tem locais mais apropriados e com segurança”.

A PM de Sergipe reforça a proposta baiana de ter à mão o “dinheiro do criminoso” e, nas orientações para a segurança do veículo, traz uma dica pouco reveladora: “As chaves reservas devem ser guardadas dentro de casa, nunca no interior do veículo”. No entanto, uma seção que oferece “conselhos para evitar vigaristas” traz as dicas mais surpreendentes.

O segundo item da listagem sergipana diz: “Cuidado com benzedeiras, rezas e despachos. Denuncie os exploradores da credulidade pública e jamais permita que um deles entre em sua casa”, sem explicar como diferenciar religiosos e golpistas. As seguintes trazem elementos de intolerância religiosa, como “Não acredite em ‘revelações’ e profecias feitas por ciganas que apareçam em sua casa. Elas só desejam se apropriar de seus valores. Chame a polícia”.

Dicas até para a segurança de cães

No site da Polícia Militar do Paraná, é possível encontrar dicas para a segurança canina. Além de recomendar que os cidadãos mantenham cães de guarda permanentemente treinados em suas residências, o órgão oferece informações sobre as táticas mais utilizadas pelos criminosos. A lista diz que é comum oferecerem alimento envenenado aos animais, e lembra que há treinamento específico para a rejeição de comida dada por terceiros.

O documento afirma que, em muitos casos, a simples abertura do portão da residência é suficiente para que animais treinados escapem, deixando livre o caminho para a ação dos ladrões. No entanto, os criminosos têm métodos mais engenhosos para agir. De acordo com a polícia, é comum um dos bandidos “jogar uma cadela no cio para dentro do seu quintal ou usá-la para atrair o cão para fora do seu quintal”, e lembra: “mesmo que se tenha casal de cães, a segurança da casa estará diminuída”.

Especialista condena abordagem repressiva

Para o professor Kant de Lima, do curso de Segurança Pública da UFF, as recomendações dos órgãos de segurança mostram a ineficácia do conceito de polícia preventiva no Brasil.

— O estranhamento acontece porque todos esperam que as polícias ajam na prevenção, para evitar que o crime aconteça. É natural que as dicas partam com mais força das polícias militares, porque elas devem mesmo ser mais repressoras, enquanto as civis devem investigar e apurar, mas isto não acontece. Então, elas aceitam que não podem evitar o crime. Nesse sentido, as dicas acabam tentando preservar a vida da vítima porque, quando a segurança pública for atuar, ela terá como prioridade a punição ao criminoso, ainda que muitas vezes isto custe a vida da vítima — analisa.

Para o pesquisador, há uma clara transferência de responsabilidades no ato de a polícia oferecer dicas para evitar a ocorrência de crimes, com uma ação de inteligência. No entanto, para ele, as cúpulas dos órgãos não analisam os dados desta maneira.

— É claro que há uma transferência de responsabilidades, mas o pensamento repressivo não permite enxergar isso. Então, eles divulgam dicas pós fato, para minimizar o dano em futuras ocorrências — conclui.

quarta-feira, 20 de março de 2013

REFORMULAÇÕES NAS POLÍCIAS


REVISTA VEJA Edição 2141 / 2 de dezembro de 2009

Sim, pode dar certo

Los Angeles e Chicago empreenderam profundas reformulações em suas polícias. Com planejamento, metas e tecnologia, conseguiram reduzir a criminalidade e reconquistar a confiança da população


Ronaldo França, dos Estados Unidos
Fotos Gilberto Tadday


CIDADE VIGIADA
Dois helicópteros no ar e tecnologia de ponta nas ruas, Los Angeles superou os tempos ruins
para figurar entre as cidades que mais reduziram o crime nos Estados Unidos


Passava das 3 horas da tarde na Califórnia quando o rádio do carro do sargento Robert Bishop, do Departamento de Polícia de Los Angeles (LAPD), emitiu o alerta. Um crime acabara de ocorrer em EcoPark, uma belíssima e extensa área de lazer na região noroeste da cidade. Bishop, da unidade de prevenção a crimes de gangues, partiu para o local para se juntar a outros 25 policiais. Era possível contar catorze carros na entrada do lugar e um helicóptero sobrevoando. O crime? O assassinato de um membro de gangue urbana. Tamanha mobilização em torno de um único bandido abatido por rivais é inimaginável no Brasil. A cena, presenciada por VEJA, indica a absoluta prioridade do Departamento de Polícia de Los Angeles no combate a homicídios e crimes de gangues. É também o reflexo das profundas transformações pelas quais a instituição passou na última década.

Polícias do mundo inteiro já se viram diante da necessidade de adotar novos métodos de ação. Eles envelhecem à medida que a sociedade se modifica e o crime se adapta. O problema é que não há uma fórmula única. Conhecer cada uma delas ajuda a construir o caminho. O Departamento de Polícia de Los Angeles é o exemplo do momento no que diz respeito a reformas em segurança pública. A mais famosa força policial americana, retratada em filmes comoChinatown e Los Angeles – Cidade Proibida, criadora da Swat (unidade de elite que virou referência mundial), acaba de se livrar de uma longa intervenção federal, que se estendeu por nove anos, desde 2000. Dois episódios foram decisivos: o espancamento do taxista negro Rodney King por policiais brancos, em março de 1991, reproduzido pelas televisões do mundo inteiro, e um escândalo de corrupção e abuso da força, em 1999. A prisão de policiais por envolvimento com roubo de cocaína, tráfico e assassinato serviu de base ao filme Dia de Treinamento, estrelado por Denzel Washington, o policial que não dava um passo sem infringir metade do Código Penal.

Os dois casos colocaram o LAPD sob vigilância do governo federal. Quando se constatou que a força policial da segunda maior cidade americana estava apodrecida, duas providências foram tomadas. A primeira, pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, foi uma intervenção, na forma de um acordo voluntário de cumprimento de metas. A segunda foi a contratação de William Bratton, o homem que já havia dado jeito na polícia de Nova York (veja a entrevista). Em pouco menos de sete anos ele mudou a face da instituição. "Bratton mostrou que era possível, e o fez através de um mecanismo de cobrança de resultados", afirma Christopher Stone, da Harvard Kennedy School, encarregado pelo Departamento de Justiça de acompanhar a evolução da reforma. Suas armas foram investir na cooperação com outras polícias e agências de segurança, como o FBI, a polícia federal americana; prender bandidos em escala industrial (foram 750 000 presos em sete anos). E, o mais importante de tudo, iniciar uma gestão baseada em resultados, no modelo do Compstat, o método gerencial que já havia dado certo em Nova York. Deu certo novamente. Bratton se aposentou no mês passado e voltou a morar em NovaYork. A revista The Economist escreveu sobre sua aposentadoria há três semanas: "Sete anos depois, ele deixa Los Angeles com uma reputação ainda mais estelar". A redução da criminalidade, de 1 000 homicídios em 1998 para 351 em 2008, é a segunda mais acentuada entre as dez principais cidades americanas a vencer o crime. Perde apenas para a de Nova York, onde ele mesmo começou o serviço.



A TÉCNICA APURADA
A polícia de Chicago aproxima-se dos cidadãos sem abrir mão de sua eficiência para tirar os bandidos das ruas e reduzir os crimes


O que há de comum entre todas as experiências de reforma policial, principalmente nos Estados Unidos, é o absoluto respeito aos números. Estatísticas, orçamentos, metas e tudo quanto servir de ferramenta de análise e planejamento são perseguidos com obsessão por policiais. A outra chave é fazer com que a população se torne uma aliada na tarefa de construir as estratégias para o policiamento preventivo. Nesse sentido, Chicago oferece um dos melhores exemplos do mundo. No luxuoso saguão de entrada do quartel-general da polícia, na Avenida Michigan, a principal da cidade, tudo é simbólico. Suas paredes são repletas de estrelas dedicadas aos policiais mortos no cumprimento do dever. Acima, dois painéis gigantes mostram cenas da cidade, com pessoas em diversas situações ligadas ao cotidiano profissional. As pilastras são de aço, e a iluminação central lembra um disco voador. O projeto arquitetônico é feito para demonstrar as três ideias centrais do plano de reforma da polícia iniciado em 1993: o trabalho policial exige esforço e custa vidas; a polícia é parte da comunidade que trabalha para construir uma cidade melhor; e o uso intensivo da tecnologia é o caminho para alcançar isso. Essas diretrizes não são uma novidade. Polícias do mundo inteiro as perseguem. O que diferencia a segunda maior força policial dos Estados Unidos (perde apenas para a de Nova York) é que ali está sua melhor tradução.

Na sala do chefe de polícia, Jody P. Weiss, 52 anos, fica estacionada uma bicicleta prateada. Não é mera decoração. Com ela, Weiss percorre quase todos os dias a distância de 4,5 quilômetros entre sua casa e o trabalho – sem segurança à sua volta. Ex-agente do FBI, ele dá o exemplo de aproximação com os cidadãos. Chicago é uma cidade de apenas 3 milhões de habitantes. Tem um quarto da população de São Paulo e metade da do Rio de Janeiro. A complexidade da tarefa de colocar de pé um serviço policial eficiente era a histórica desconfiança de seus moradores em relação à polícia. Afinal, trata-se da cidade que abrigou Al Capone, com todas as ramificações que a máfia tinha no aparato policial. Quando a taxa de homicídios atingiu o patamar de 31 assassinatos para cada 100 000 habitantes, em 1991, ficou clara a necessidade de mudança. Vencer a descrença foi a primeira parte do plano. "Sem credibilidade, as pessoas não reportam crimes e é impossível planejar um bom policiamento", afirma Wesley G. Skogan, especialista em justiça criminal e um dos autores do projeto de policiamento comunitário.

Essa proximidade ajuda a atualizar um monumental banco de dados com o nome de suspeitos, horários de crimes em cada rua e forma de atuação dos bandidos, por exemplo. O sistema de mapeamento criminal guarda informações sobre os 2 milhões de pessoas presas na cidade desde 1962. Com ele, pode-se tomar conhecimento de detalhes da ficha criminal, envolvimentos com gangues, aparência e mesmo sinais corporais de cada bandido que já passou por uma delegacia. O nível de detalhamento chega ao impensável. É possível saber, por exemplo, que em julho havia 1 022 bandidos tatuados com a frase I love mom (Amo minha mãe, em inglês). Recursos assim são preciosos, principalmente nas grandes cidades. Mas a lição é que não adianta tê-los, se não forem usados à exaustão. No Brasil, as polícias estaduais têm 76 estandes de tiros e apenas 36 laboratórios de informática. Intensificar o uso do computador é urgente. É o caminho para a polícia do futuro.

Gilberto Tadday

O ALVO É O CRIME
O treinamento dos policiais e o investimento em recursos tecnológicos estão na base do sucesso das melhores polícias do mundo








Entrevista • William Bratton
O STEVE JOBS DA POLÍCIA



A crônica americana de grandes feitos empresariais, como a virada da General Electric promovida por Jack Welch, ou a da Apple, de Steve Jobs, tem agora seu similar no ramo da segurança pública. William Bratton, 62 anos, já era famoso quando conseguiu vencer o crime em Nova York, na década passada. Sua mais recente empreitada foi recolocar o Departamento de Polícia de Los Angeles no trilho. Graças a seu talento para estruturar polícias, alcançou fama inigualável entre os policiais do mundo inteiro. No mês passado, ele trocou o comando do LAPD, que ocupou por sete anos, pela carreira de consultor. Suas lições nesse ramo são preciosas. Bratton falou ao editor Ronaldo França, pouco antes de se aposentar, sobre o que falta às polícias brasileiras para que ganhem em eficiência.

SEGURANÇA NO BRASIL - Quando estive no Brasil, em 2002, o país começava a se tornar uma força econômica. Nessa área, o Brasil teve avanços enormes, que não se refletiram na segurança. Eu não sairia do hotel para andar pelas ruas do Rio de Janeiro, como faço nos Estados Unidos. A reputação do Rio é terrível. Eu não iria lá nem a negócios nem como turista.

SALÁRIOS X CORRUPÇÃO - A polícia brasileira, como acontece em diversos países latino-americanos, é terrivelmente mal paga, o que encoraja a corrupção. Os policiais ficam muito suscetíveis a receber propostas de suborno para sustentar sua família. Nos Estados Unidos, os policiais ganham muito bem e pertencem de fato à classe média. No Brasil, os soldados da Polícia Militar ou os agentes da Polícia Civil são parte da classe social mais baixa. Isso cria uma distância em relação à classe média e aos ricos, provoca grandes dificuldades e 
frustração.


"Comecei a carreira como policial. No Brasil, seria um soldado de polícia. Eu jamais conseguiria ascender e me tornar chefe de polícia. Seria no máximo capitão ou major"



POLÍCIA DESMOTIVADA  - Vocês têm uma divisão na Polícia Militar em que os policiais são de uma classe social diferente da dos oficiais. Os soldados não podem chegar ao topo. E os policiais civis e investigadores são uma outra classe. Os delegados são advogados. É um sistema extraordinariamente complexo, que não tem a equidade existente na polícia dos Estados Unidos. Eu comecei minha carreira como policial. No Brasil, seria um soldado de polícia. Jamais conseguiria ascender ao cargo de oficial e, depois, ao de chefe de polícia. Seria no máximo capitão ou major. Eu teria de ir a uma faculdade de direito para me tornar delegado. Em meu departamento, todo investigador pode chegar ao posto mais alto da carreira policial. Não ter chance de ascender é algo desestimulante em qualquer carreira. Não haveria por que ser diferente na polícia.

TECNOLOGIA  - Ainda há muitas delegacias com aparelhos de fax velhos e máquinas de escrever. Os equipamentos também são muito precários, com veículos em condições terríveis. Esse atraso é extremamente prejudicial. A tecnologia faz parte do coração de um departamento de polícia, claro que operada por pessoal capacitado e bem treinado.

JUSTIÇA - É muito, muito importante que as corporações se relacionem com a Justiça, a promotoria, o sistema penitenciário, todos os elementos que compõem o sistema de justiça criminal. No Brasil, isso não acontece. Já estive no Ceará prestando serviços para o governador Tasso Jereissati, que estava muito empenhado nisso e trabalhando com muita seriedade. Despendemos muito tempo lá, implantamos alguns sistemas e fizemos algumas recomendações. Mas a Justiça é extremamente ineficiente. O sistema de justiça criminal brasileiro é tão desconectado que nem sequer pode ser chamado de sistema. É preciso promover uma profunda mudança, ou não se terá nunca uma boa polícia no Brasil.

NO RUMO CERTO

REVISTA VEJA, Edição 2141 / 2 de dezembro de 2009
Dossiê - Polícia • Pesquisa


Com gente bem treinada, investimento em tecnologia e modernos métodos de gestão, Minas Gerais e São Paulo mostram que  não é preciso mudar o mundo para melhorar a segurança


Ronaldo França

Fotos Leo Drumond/Nitro

OLHOS BEM ABERTOS
A vigilância por câmeras, presente em várias cidades do mundo, começa a se expandir nas principais capitais brasileiras, como Belo Horizonte


Não fosse pela farda, o comandante da Polícia Militar de Minas Gerais, coronel Renato de Souza, 46 anos, em nada lembraria um policial. Gestos suaves, vocabulário preciso, ele parece um acadêmico. É quase isso. Presença constante em seminários e congressos sobre segurança pública, Souza tem um currículo de tipo ainda incomum no Brasil, mas que começa a ser usual nas melhores polícias do mundo. À tradicional formação como policial, ele incorpora o mestrado em administração pública e a especialização, na Academia de Polícia do FBI, na Virgínia, em gestão de crises e ainda curso de gerenciamento de empreaas. Souza faz parte de uma nova geração com formação de qualidade em administração e estudos criminais que está ascendendo na hierarquia da segurança pública. Foi o primeiro a ocupar cargo tão alto e um sinal visível de que, finalmente, se começa a perceber no país como é importante estabelecer uma integração entre os que pensam a segurança nas universidades e os que combatem a violência nas ruas.

Isso é importante porque rompe com a ideia paralisante de que para combater a violência é preciso antes mudar o mundo. Durante muito tempo vigorou esse conceito nefasto de que seria impossível combater a violência e a criminalidade sem atacar primeiro as mazelas sociais. Havia por trás disso a visão distorcida de que bandidos são vítimas da sociedade – um anacronismo que, felizmente, começa a ser sepultado. Nas palavras do prêmio Nobel de Economia de 1992, o economista Gary Becker, da Universidade de Chicago: "É um mito criado por intelectuais a ideia de que é impossível combater o crime porque ele é fortemente relacionado com a pobreza e só pode ser reduzido com drásticas reformas sociais". Um dos fundadores dos estudos do comportamento humano por meio das fórmulas econômicas, Becker mostrou com clareza que o número de crimes baixa quando sobe o número de criminosos presos. É óbvio. Mas o óbvio ficou décadas escondido sob a argumentação de que é necessário melhorar primeiro as condições de vida das regiões onde se encontra a maioria dos criminosos violentos para depois esperar baixar os índices de banditismo. Diz ele: "Não é preciso esperar uma geração para que mudanças na educação e na moralidade tenham efeito na atenuação do crime".

Becker entendeu primeiro o que somente agora começa a se materializar como fundamento das políticas de segurança pública: o crime não é invencível. Bogotá e Medellín, na Colômbia, Nova York, Boston e, mais recentemente, Los Angeles, nos Estados Unidos, são exemplos a demonstrar que sim, existe um caminho. O que há de comum a todas as experiências de segurança pública bem-sucedidas no planeta é que elas, sem exceção, passam pela construção de um serviço policial eficiente. Essa eficiência não se mede apenas pelo número de policiais nas ruas. Não é meramente uma questão quantitativa. Departamentos de polícia eficientes são aqueles que fazem o crime baixar em sua área de atuação. São invariavelmente bem geridos, apresentando uma série de atributos indispensáveis  que incluem treinamento, credibilidade, proximidade com a população, melhor gestão dos recursos, tecnologia e integração com a Justiça e o sistema prisional.

Para efeito de análise, examinemos o caso da formação acadêmica e do treinamento policial. No Brasil, a maioria das polícias civis contenta-se em mandar homens ao trabalho depois de apenas três meses de formação. Grande parte chega à academia tendo cursado uma faculdade de direito, o que resulta numa formação excessivamente jurídica e pouco prática. É tempo insuficiente para o aprendizado de todas as técnicas que compõem o universo profissional dos policiais. Principalmente porque se trata de um tipo de serviço peculiar. Policiais são os únicos funcionários públicos que têm licença para usar a força, o que implica desde empregar um simples golpe para contenção de um agressor até tirar a vida nos casos em que ele próprio ou um terceiro esteja ameaçado. Deixar que cheguem às ruas para o trabalho despreparados é temerário.

Na Polícia Militar, a situação é melhor, o que explica a avaliação mais positiva da população na pesquisa CNT/Sensus feita em parceria com VEJA. O curso básico de seis meses é similar ao de outros países. Mas o destaque nessa área é o Japão, que treina seus recrutas por um ano antes de mandá-los ao trabalho. Isso ajuda a explicar a taxa de 1,4 homicídio por 100.000 habitantes – um quarto da taxa nova-iorquina, que já é baixa. Treinar um policial para situações de confronto é um trabalho delicado. Exige-se a repetição de ações à exaustão. Em Los Angeles, esse método foi aprimorado nos últimos dois anos. "Entendemos que, além de ensinar a prática de tiros ou de direção em perseguições, é preciso integrar todas as disciplinas", afirma a chefe do departamento de treinamento, Sandy Jo MacArthur.


Fotos Jonne Roriz/ AE e Ricardo Benichio

CHOQUE DE GESTÃO
Com administração organizada, a polícia de São Paulo já tem helicóptero que vigia a cidade e armas não letais

Aperfeiçoar treinamentos, adaptar currículos e testá-los na rua é parte do trabalho de gestão, uma cadeira em que a maioria das polícias brasileiras seria reprovada. O primeiro grande êxito nessa área se deu em Nova York, na década passada, na gestão do então prefeito Rudolph Giuliani, mas não pelas razões que se costumam mencionar. Batizado de Tolerância Zero, é confundido com um programa voltado apenas para a maior repressão a delitos. Foi isso e muito mais. O projeto implantado na cidade pelo então chefe de polícia, William Bratton, foi bem mais abrangente. Nova York empreendeu um conjunto de ações cujo coração foi a criação de um sistema de gerenciamento, semelhante em muitos aspectos ao utilizado por grandes empresas privadas. O CompStat (sigla para estatísticas computacionais comparadas) é uma metodologia para solucionar problemas e cobrar responsabilidade dos policiais encarregados de resolvê-los. Tudo isso com o uso de softwares que ajudam a ter uma ideia precisa das ocorrências criminais em cada rua da cidade.

A boa notícia é que, como demonstra o coronel Renato de Souza, o Brasil começa a trilhar esse caminho. Minas Gerais e São Paulo adotaram sistemas semelhantes e já ostentam índices de redução de crimes violentos em valor inquestionável. O caso mais notório é o de São Paulo, cuja taxa de homicídios na capital foi reduzida em 79% entre 1999 e 2009, ficando em 11 por 100 000. Ainda é alta, mas o resultado impressiona porque até a década de 90 sua Polícia Militar era mais conhecida pela chacina do presídio do Carandiru, que resultou em 111 mortos, e pelos abusos e crimes cometidos contra moradores da favela Naval, em Diadema, na região metropolitana da capital. A enorme repercussão dos dois casos foi o que deu a partida na mudança da PM paulista. Ela ainda está distante do ideal, como mostrou, recentemente, a sucessão de erros na frustrada tentativa de resgate da estudante Eloá Pimentel, mas trilha o caminho certo.


O investimento mais importante foi na construção de uma base de análise de dados, com o sistema de informações criminais mais bem estruturado do país, que registra a localização das ocorrências no mapa. O Infocrim tem dados de todos os boletins de ocorrência registrados no estado. Ele se soma a outros dez bancos de dados que são usados pelos policiais em suas investigações. Outra novidade relevante foi a integração do departamento que despacha os carros e helicópteros ao que atende as ligações de emergência da população. São inovações que parecem óbvias, mas nada é fácil no estado que concentra 20% da população brasileira, 37% da frota de veículos e tem 19 milhões de habitantes somente da região metropolitana. A Polícia Civil tem mais problemas, e mais graves. Mas obteve um avanço importante no Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa, o DHPP, no qual o governo estadual concentrou seus esforços para alcançar o êxito na diminuição do número de mortos. Reformulou o departamento, adotou softwares e sistemas de informações para investigações que fazem com que São Paulo solucione hoje 48% dos casos de homicídio que investiga. No Rio de Janeiro, para se ter uma ideia, são apenas 4%.

Minas Gerais adotou mudanças que abrangeram toda a Secretaria de Defesa Social. Isso significou melhor desempenho também da Polícia Civil. O governo estadual formou um colegiado em que as decisões são tomadas em reuniões que juntam na mesma sala todos os envolvidos na segurança pública, o que inclui bombeiros, sistema penitenciário e Juizado de Menores, por exemplo. Quem reporta o andamento da situação nos municípios mineiros são profissionais formados no curso superior de administração pública, que fazem a interface com a população e as prefeituras. "Minas Gerais tem um trabalho exemplar na constituição de metas e cobrança de resultados, a exemplo do Comp-Stat de Nova York", afirma a especialista em justiça criminal Julita Lemgruber, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes (Cesec). Tudo é monitorado seguindo um sistema de metas. O resultado das políticas implantadas foi uma drástica redução do número de crimes violentos em Belo Horizonte – de 44 000, em 2003, para 22 300, no ano passado. É a prova do acerto no caminho escolhido. Com policiais mais bem preparados, mais tecnologia e polícias bem administradas, há uma chance de que a sociedade consiga vencer o crime.



NA SALA DE AULA
O comandante Renato de Souza: o primeiro a chegar ao topo


O QUE FAZ UMA POLÍCIA MELHOR

1. Treinamento - Há um conjunto de situações cotidianas que um policial deve conhecer para saber como decidir sua ação. Elas vão desde ajudar alguém passando mal na rua até perseguir criminosos e atuar no resgate de sequestrados. Deve-se repetir uma ação no mínimo vinte vezes para que um policial padronize ritos, gestos e palavras em momentos de abordagem a um suspeito, por exemplo

2. Credibilidade - Quando a população acredita na polícia, fornece informações com as quais se constrói a estratégia de policiamento de cada rua, cada esquina. Estudos baseados em experiências bem-sucedidas, como a de Chicago, mostram que a taxa de resolução de crimes mais que triplica quando a população colabora com informações e sugestões para atacar os problemas

3. Gestão - As técnicas de administração empresarial estão consagradas como as mais eficazes na condução das polícias. A PM de Brasília tem três vezes mais policiais por habitante do que
a de São Paulo, e a média salarial é o dobro. Mas o trabalho de gestão de São Paulo é mais eficiente, com um sistema de metas, cobrança de resultados e investimento em tecnologia. A taxa de homicídios é metade da que se tem na capital do país

4. Prevenção e planejamento - A experiência internacional mostra que cada dólar investido em novos métodos de investigação e planejamento detalhado do policiamento representa uma economia de
3 dólares no custo da repressão


5. Mapear as zonas de perigo - Prevenir furtos de bicicletas exige esforço e recursos menores do que garantir a segurança contra homicídios. Para dirigir esforços de forma mais eficaz, é preciso construir o mapa do crime, superpondo a localização de ocorrências no mapa da cidade através do uso de GPS


6. Prender mais bandidos - Em Nova York, prende-se uma pessoa para cada grupo de cinquenta habitantes, em um ano. No estado do Rio de Janeiro, a média é de um preso para cada 1 000 habitantes, no mesmo período. A diferença é que lá a tolerância é mínima. Leva-se à detenção até quem pula a catraca do metrô, o que reduz a sensação de impunidade. É uma das razões para a taxa de homicídios carioca ser até seis vezes a nova-iorquina


7. Integrar o sistema de justiça criminal - Não adianta prender e soltar criminosos para desestimular novos delitos. Tem-se de mantê-los encarcerados, o que exige sintonia entre polícias, Justiça, promotorias e o sistema prisional

DESPREPARADA, MAL EQUIPADA E MAL REMUNERADA

REVISTA VEJA, Edição 2141 / 2 de dezembro de 2009 
Dossiê - Polícia • Pesquisa

Sem medo da verdade

A polícia é despreparada, mal equipada, mal remunerada, e a corrupção grassa nas corporações. A avaliação é dos próprios policiais, em pesquisa exclusiva para VEJA. Na coragem de pôr o dedo na ferida está a chave para  vencer o crime no Brasil




Ronaldo França
Fotos Fabiano Accorsi e Fernando Lemos


Um assassinato a cada doze minutos. É esse o ritmo da tragédia brasileira. É o número por trás da atmosfera de medo que domina as ruas de todas as grandes cidades do país. Ele se traduz em 45.000 homicídios por ano. E vem dramaticamente acompanhado de uma quantidade igualmente estratosférica de todos os outros tipos de crime, como assaltos, roubos a residências ou estupros. Esse conjunto nefasto empurra os cidadãos para dentro de casa, afastando-os das ruas e praças, que ficam à mercê dos bandidos. O medo mina o ambiente nas cidades, nos negócios, afasta investimentos e traz enormes prejuízos às famílias. Encarar essa questão é uma das emergências do país. O Brasil já se mostrou capaz de resolver problemas aparentemente insolúveis. Venceu a inflação supersônica, na década passada, para se tornar uma liderança entre as economias emergentes deste início do século XXI; com sua disciplina econômica, foi dos primeiros países a se distanciar do vórtice da crise financeira mundial. Não é possível que não consiga lidar também com o problema da criminalidade e combater a inépcia de suas polícias. Não mais.

A essa constatação, segue-se uma indagação inevitável. O que falta às polícias brasileiras para que consigam restaurar um nível civilizatório de segurança nas cidades? A resposta a essa questão, tratada ao longo das dezesseis páginas desta reportagem especial, começa a emergir da pesquisa CNT/Sensus, feita a pedido de VEJA. O principal mérito do levantamento é colocar frente a frente a opinião de uma polícia sobre a outra – e também sobre os problemas que enfrentam em suas próprias corporações. Algo assim nunca foi feito no país. Principalmente porque a pesquisa foi elaborada com a melhor metodologia, a mesma usada em eleições presidenciais. Foram ouvidos policiais de cinco cidades – São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Recife e Brasília. Juntas, elas abrigam mais da metade da população das capitais brasileiras e sediam regiões metropolitanas que sintetizam os principais problemas das cidades do país. A empreitada teve apoio das secretarias de Segurança. O confronto das visões dos integrantes das duas instituições traz revelações importantes.
Gustavo Azeredo/Ag. O Globo

UM EMBLEMA DO QUE HÁ DE PIOR
O ex-chefe da Polícia Civil do Rio Álvaro Lins acabou preso: corrupção,
lavagem de dinheiro, quadrilha...



A profundidade dos tentáculos da corrupção no aparato policial começa a ser exposta: existe "muita corrupção" na Polícia Civil para 10% dos policiais militares de Brasília, o menor porcentual, e 46% no Rio de Janeiro, o pior de todos. Na média das opiniões das polícias Civil e Militar, o porcentual dos que admitem a existência da corrupção aproxima-se dos 90% nas cinco capitais.

É elevada a quantidade de policiais que afirmam haver práticas de tortura em "ambas as corporações". E nesse ponto ninguém fica bem. São Paulo e Brasília, os menos mal cotados, apresentam índices de 17% e 16%, apontando para a gravidade do problema.

A polícia do Distrito Federal, cujos salários são os mais altos do país, desponta na primeira colocação na maioria dos quesitos.

O Rio de Janeiro é o mais mal avaliado. Perguntados sobre a qualidade em aspectos fundamentais como seleção de pessoal, policiamento ostensivo, os militares foram extremamente severos. O Rio fica em última posição entre as capitais pesquisadas.
Oscar Cabral

HONRA E MORAL PRESERVADOS
Major Elmo Moreira: padrão de vida modesto após 27 anos de serviços prestados à Polícia Militar do Rio de Janeiro



O mérito do levantamento realizado agora é dar nome aos bois e pôr o dedo na ferida como nunca foi feito. O costume de avaliar polícias sempre de maneira pretensamente abrangente incorre no vício do coletivismo, que despreza o essencial: elas são compostas de indivíduos que, como todos, querem progredir e construir o melhor para a vida deles. É esse um dos principais achados da pesquisa. Críticos em relação a seu trabalho, os policiais querem ser mais bem treinados e consideram que as chefias e a gestão administrativa deixam a desejar. Sentem-se desmotivados, ressentem-se da constatação de que a sociedade brasileira não confia neles, e reclamam do escasso investimento profissional. São ainda mais críticos do que a população em geral quando o assunto é a propina, a praga que deteriora o ambiente nas cidades e põe em risco a vida de quem leva a sério a tarefa de fazer cumprir a lei. Sim, porque a corrupção arma emboscadas.

O major da Polícia Militar do Rio de Janeiro Elmo Moreira, 48 anos, já deparou com situação assim. Durante os dezesseis anos em que serviu no Batalhão de Operações Especiais do Rio de Janeiro, viveu na linha de tiro nos enfrentamentos da polícia com os bandidos cariocas. Acostumado a vencer o medo, assustou-se com um telefonema. Em 1999, estava com sua equipe no alto do Morro do Fogueteiro, uma perigosa favela carioca. Acabara de apreender 350 quilos de cocaína quando tocou seu telefone funcional, cujo número era conhecido apenas por seus subordinados e superiores. Do outro lado da linha, o chefe do tráfico local queria "comprar" de volta a "mercadoria". É assim, como um comércio, que muitos policiais e bandidos veem a ação da polícia do Rio. VEJA entrevistou Moreira em sua casa há nove anos. Ele se aposentou no mês passado, depois de 27 anos de serviço e de ter tido em suas mãos o enorme poder de arrecadação que um oficial da PM desfruta no cotidiano violento de uma cidade sitiada por bandidos. Sua casa, na empobrecida Zona Oeste do Rio, teve apenas os progressos que seu salário de 5 800 reais pode pagar. Nove anos atrás, havia um ar-condicionado pequeno para refrigerar seu quarto e o de seus filhos, ligados por um buraco na parede. Agora já são dois aparelhos, mas as dificuldades da vida permanecem estampadas na modesta casa construída nos fundos do terreno cedido pelo sogro. "Meus filhos levam vida simples, mas a dignidade e a honra de minha família são nosso patrimônio", afirma. É o valor da honestidade. Um oásis no deserto da escassez moral que desidrata a segurança dos cidadãos brasileiros.

Os descalabros ocorrem, sim. Aos montes. Em São Paulo, um secretário adjunto de Segurança foi afastado após denúncias de venda de cargos na direção da Polícia Civil. Em outubro de 2008, Lindemberg Fernandes Alves, de 22 anos, invadiu o apartamento de sua ex-namorada Eloá Cristina Pimentel, de 15 anos, em Santo André. Ele fez reféns a ex-namorada e sua amiga Nayara Silva. A ação da polícia paulista no episódio foi trágica. Depois de mais de 100 horas de negociações, uma invasão desastrada resultou na morte de Eloá. Em Manaus, um policial virou apresentador de programa de TV e mostrava cadáveres que ele mesmo encomendava. Na Polícia Civil do Rio, havia uma quadrilha instalada nos principais postos de comando. O ex-chefe Álvaro Lins foi preso pela Polícia Federal de-pois que se encontraram evidências de corrupção, enriquecimento ilícito e formação de quadrilha, da qual é acusado de ser o líder. Na origem de todos esses fatos está a péssima gestão que se verifica na maioria das polícias brasileiras, cujos comandos ainda acreditam que tudo se resolve com mais policiais e armamento cada vez mais pesado. "A pesquisa mostra um sério problema de gestão. O Brasil tem uma das maiores proporções de policiais por habitante, mas a maioria dos entrevistados considera que seriam necessários mais homens na rua", afirma o ex-secretário nacional de Segurança Pública José Vicente da Silva.


Os serviços de segurança pública custam aos brasileiros 16 bilhões de reais por ano. Se não fosse por todas as outras razões, muito mais importantes, haveria esta a exigir um padrão de qualidade superior. No entanto, é mínimo o nível de satisfação com o serviço pelo qual se paga. Além de ouvir os policiais, a CNT/Sensus fez uma pesquisa com a população, na qual entrevistou 1.000 pessoas em 24 estados. Para 80% dos brasileiros, a situação da violência está fora de controle; e as ações da polícia para acabar com o crime são inadequadas, segundo 53% dos entrevistados. A formação dos policiais está aquém do esperado por 60% das pessoas. É um diagnóstico grave. A população está com medo e confia pouco na polícia (46% das respostas). A vida nas cidades é insegura para um terço dos moradores. E o medo sabota as cidades. Ruas vazias são territórios de gangues. Retomar os espaços urbanos das mãos dos bandidos tem um efeito profilático contra o crime. Mas a operação de desembarque dos brasileiros de volta às suas ruas e praças e aos passeios noturnos não pode ser um ato de coragem individual. Ela tem de ser liderada por suas polícias. Isso só acontecerá se, antes, elas mesmas se libertarem das amarras que sequestram sua eficiência.


Domingos Peixoto/Ag. O Globo

QUERO SER ASSIM
Polícia Federal em ação: a instituição é referência para policiais militares






PROJETO DESCONSTITUCIONALIZA APARATO POLICIAL

Notícias ABAMF | Por abamfimprensa - Publicado em : 19 de março de 2013

Agência Câmara 

Começa a tramitar projeto de unificação das polícias

A Comissão Mista de Segurança Pública apresentou, no último dia 7, o Projeto de Lei 6690/02, que estabelece normas gerais relativas ao funcionamento das polícias estaduais, do Distrito Federal e dos territórios e dos corpos de bombeiros.

A relatora da Comissão para este tema, deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), defende que é necessária a edição de uma lei moderna, que preveja um padrão mínimo de normas nacionais, ao mesmo tempo em que dá liberdade para os estados legislarem segundo as suas realidades, “garantindo o mínimo de direitos para o exercício das funções dos policiais”.

ORGANIZAÇÃO

Pelo projeto, a organização das polícias será fixada em lei, de iniciativa privativa do respectivo governador, observadas as normas gerais previstas nesta lei. A organização das polícias judiciárias e das polícias ostensivas e dos corpos de bombeiros do Distrito Federal e dos Territórios será fixada em lei federal.

COMPETÊNCIAS

Pelo Projeto, a lei definirá garantias, direitos, efetivos, material bélico, convocação e mobilização das polícias militares. As polícias judiciárias ficarão incumbidas, privativamente, da apuração das infrações penais; as polícias ostensivas, da preservação da ordem pública; e os corpos de bombeiros, da coordenação e execução de atividades de defesa civil no âmbito de sua competência, além de outras atribuições previstas em lei.

Serão considerados princípios básicos das polícias judiciárias, das polícias ostensivas e dos corpos de bombeiros: a hierarquia, a disciplina, o respeito à dignidade e aos direitos humanos, a participação comunitária e a legalidade.

UNIFICAÇÃO

No Projeto de Lei é proposta uma norma única de organização das polícias civis e militares e dos corpos de bombeiros militares.

Segundo Zulaiê Cobra, no texto foram adotados princípios contidos nas seguintes proposições, que estão em tramitação na Casa:

I – quanto às polícias civis:

- Projeto de Lei 4371/93, do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), com o PL 3274/00 apensado;

- Projeto de Lei 3274/00, do Poder Executivo, apensado ao PL 4371/93, já aprovado na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, e atualmente sob a apreciação da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional;

II – quanto às polícias militares e corpos de bombeiros militares:

- Projeto de Lei 4363/01, do Poder Executivo;

- Substitutivo ao PL 4363/01, elaborado pelo relator na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, deputado Alberto Fraga (PMDB-DF), após analisar 112 emendas ao projeto original e mais 60 ao substitutivo inicial.

O texto do Projeto de Lei 6690/02 está disponível na página eletrônica www.câmara.gov.br. A proposição será distribuída para as comissões técnicas.

Texto: Regina Céli Assumpção/ LC
Foto: Maryanna Oliveira / Câmara dos Deputados


MATÉRIA recebida do Cel Ref BM Jose Aparecida de Castro Macedo


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA -Se não mostrar à sociedade a importância na função precípua que estabelece a razão de ser da existência, a polícia militar poderá desaparecer perdendo mais de 200 anos de história. Há muito tempo as polícias militares deixaram de o militarismo puro para executar o papel de polícia ostensiva, mantendo apenas as regras disciplinares e uma estrutura ainda arcaica, mas voltada á atividade civil de polícia.

As mazelas que fomentam o descrédito nas PPMM são as promoções e privilégios para carreiristas que afronta o clima organizacional; apadrinhamentos políticos; forte interferência partidária nas estratégias, táticas e técnicas policiais; insuficiência de efetivos operacionais; muitos comandos; falta de oficiais na linha operacional; desvios de efetivos para setores não policiais; desprezo à presença real e ostensiva nos bairros e ruas; priorização da contenção em relação à prevenção; burocracia exagerada;  salários injustos; desmotivação na carreira; programas isolados e calcados em estratégia partidária; operações midiáticas e de resultados superficiais; e políticas imediatista para colocar efetivos nas ruas sem uma formação adequada.

A propósito: diante dos argumentos de desmilitarização, as polícias civis do Brasil devem ser muito eficientes com inquéritos em dia, procedimentos ágeis, salários justos, efetivos suficientes, disciplina exuberante, respeito à hierarquia, ótima cadeia de comando, sem irregularidades e corrupção, sem sobrecarga administrativa, e eficaz..muito eficaz na elucidação de delitos.

Respeito o contraditório!