ZERO HORA 26 de março de 2013 | N° 17383
EDITORIAIS
Criou-se uma situação aberta aos mais variados entendimentos a decisão da Polícia Civil de sugerir também a responsabilização do prefeito de Santa Maria pela tragédia na boate Kiss. A partir desta citação, até mesmo como estratégia de defesa, setores políticos ligados ao governante passaram a questionar a suposta omissão de gestores estaduais, como se o dramático episódio devesse ser reduzido a uma disputa partidária. Ora, este debate é inaceitável, pois desrespeita as vítimas, seus familiares e não condiz com as expectativas da sociedade pela plena apuração dos fatos e pela correção das falhas que provocaram a morte de tantas pessoas.
Em primeiro lugar, cabe reconhecer o trabalho objetivo e bem fundamentado da Polícia Civil, que resultou em um exaustivo inquérito com mais de 13 mil páginas e na apresentação de provas testemunhais e técnicas convincentes. Ao propor, no relatório final, que o senhor Cezar Schirmer seja processado por homicídio culposo e improbidade administrativa, a polícia apenas provoca o Ministério Público e a Justiça, como é da praxe jurídica, a se manifestar sobre a existência de nexo causal entre as atribuições do administrador e o fato ocorrido. Caberá agora a essas duas instâncias, nos prazos estabelecidos, corroborar ou corrigir as investigações policiais, para que sejam bem conduzidas essas e outras questões.
O que a população deseja é que o caso seja plenamente esclarecido. Para que tal desejo se cumpra, nesta etapa decisiva para o MP e para a Justiça, as instituições precisam trabalhar sem os ruídos de interferências políticas. Nesse sentido, a cadeia de responsabilidades deve se estender até onde seja necessário, para identificar as negligências e as omissões criminosas que provocaram o infortúnio de tantas famílias, para que o julgamento dos responsáveis seja justo e no tempo adequado e também para que tragédias como essa sejam evitadas.
Investigações policiais que incluem ocupantes de cargos públicos entre seus personagens estão, naturalmente, propensas a questionamentos políticos. Não interessa à sociedade que esse tipo de abordagem se propague para além dos ambientes que reúnem, de um lado, setores ligados ao prefeito e, de outro, defensores do governador. O que as famílias das vítimas e a comunidade de Santa Maria, em especial, e todos os gaúchos e brasileiros esperam é que se faça justiça, sem a discriminação de even- tuais envolvidos e sem que qualquer gesto, antes dos veredictos, represente julgamentos públicos sumários. Ministério Público e Judiciário estão diante do processo sobre a maior tragédia do Estado e certamente farão tudo para que as melhores expectativas não sejam frustradas.
O julgamento da tragédia da boate Kiss deve ficar alheio a ruídos políticos, para que a lei alcance todas as esferas envolvidas.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Este inquérito teve a propriedade de mostrar o quanto custa o esforço da polícia civil para produzir uma carga burocrática que é o inquérito policial, uma peça considerada meramente acessória na justiça. Todos os depoimentos podem ser anulados, mas o relatório e as perícias serão peças essenciais ao processo. Na justiça, haverá um retrabalho com a retomada de depoimentos até o julgamento do fato, cuja sentença não será definitiva, pois recursos serão providenciados tanto pelas defesas como pela promotoria, podendo cair o transitado em julgado lá nas cortes supremas. Se tivéssemos no Brasil uma descentralização do transitado em julgado e um sistema de justiça criminal integrado, ágil e desburocratizado, com investigação policial se baseando no relatório policial, perícias e depoimentos em vídeo, a justiça assumiria seu papel tomando depoimentos e dando andamento bem mais rápido e oportuno, com recursos dentro do âmbito federativo.
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