FORA DE SERVIÇO. Aposentadoria compulsória gera discórdia na polícia
Lei que tira da atividade policiais com 65 anos divide opinião de delegados da velha e da nova gerações
CARLOS WAGNER
CARLOS WAGNER
A decisão do governo do Estado de pôr em prática a aposentadoria compulsória aos 65 anos abriu um foco de discórdia na Polícia Civil, com troca de farpas entre delegados da velha e da nova gerações. Na segunda-feira, o chefe de Polícia, delegado Ranolfo Vieira Junior, envia à Secretaria da Administração e dos Recursos Humanos do Estado uma relação de 20 delegados e 17 agentes para serem aposentados.
De acordo com Ranolfo, a saída desses policiais não irá afetar a eficiência dos serviços da corporação. Até a entrada em vigor da medida, os policiais podiam ficar em atividade até os 70 anos. No Rio Grande do Sul, o cumprimento da lei teve início no ano passado, por exigência da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), explica o delegado.
– A discussão sobre a aplicação da lei durou mais de 20 anos – afirma o procurador Roque Marino Pasternak, coordenador da Procuradoria Previdenciária, que está vinculada à PGE.
A legislação nasceu em dezembro de 1985, na Lei Complementar 51, que trata da aposentadoria especial dos policiais. Um dos artigos determina o afastamento aos 65 anos. A legislação ainda não tinha sido implantada porque, em 1988, foi promulgada a Constituição Federal.
No entendimento de muitos juristas, a carta magna havia deixado de fora a lei. O questionamento acabou virando um processo que foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). No ano passado, a corte decidiu que a lei é válida.
– Desde 2011, dezenas foram aposentados compulsoriamente – afirma Pasternak.
Para grupo de delegados, lei tem nome: “expulsória”
A atual visibilidade do tema pode ser creditada ao fato de que a lei atinge delegados conhecidos, por terem trabalhado em casos de grande repercussão. Na segunda-feira, a direção da Associação dos Delegados de Polícia do Estado (Asdep) se reúne para definir sua posição em relação à aposentadoria. A Asdep está em saia justa porque os novos delegados apoiam a aplicação da lei.
Um grupo de 12 delegados está inconformado com a medida. Eles devem se reunir, na segunda-feira, com um advogado para discutir um recurso judicial para tentar evitar a aposentadoria compulsória.
Um delegado conversou com Zero Hora, na condição de não ser identificado. Ele diz que os policiais sofrerão uma enorme perda no salário. Por já terem tempo de aposentadoria e estarem em atividade, ganham 35% a mais no salário e outros 30% se trabalharem como substituto em mais de uma delegacia, prática comum no Interior.
Para o grupo, a lei ganhou outro nome: “expulsória”.
O delegado Abílio Pereira, 65 anos, vai virar criador de gado em Encruzilhada do Sul, no Vale do Rio Pardo. Famoso pelas brigas que comprou na carreira, Abílio foi um dos delegados destacados para trabalhar no caso do assassinato do deputado José Antonio Daudt, em uma fria noite do inverno de 1988, em Porto Alegre. A tarefa dele era investigar o círculo de amizade da vítima.
– Levo para a aposentadoria a mágoa de não terem nos deixado esclarecer aquele caso – comenta.
Abílio entrou na Polícia Civil em 1978, como delegado, e passou por vários cargos dentro da corporação. Ele é titular da 10ª DP (bairro Bom Fim) da Capital. O policial já tinha planejado trocar o terno preto, uma de suas marcas, pela bombacha no final do ano. A aposentadoria compulsória apressou o processo.
– A fila precisa andar. É hora de ir trabalhar em outro projeto e deixar o caminho para a gurizada – conclui.
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