ZERO HORA 0 de setembro de 2015 | N° 18290
MARCELO RECH*
Ao ser reconhecida como uma das melhores polícias do Brasil, a BM é um dos derradeiros motivos de orgulho dos gaúchos. Aqui, a Brigada foi forjada na força da tradição e do cumprimento do dever. Valores como honra e sacrifício passam de geração em geração, muitas vezes herdados de pais e avôs brigadianos. Em alguns Estados do Brasil, se a PM entrasse em greve de verdade, é provável que a criminalidade caísse. No Rio Grande do Sul, a qualidade da seleção e formação dos oficiais se transfere até a base, e a corporação expurga os desvios de conduta em rituais bem mais rígidos do que a triste realidade nacional.
No entanto, esta história de 178 anos está em xeque agora. Uma força armada pode sofrer restrições, mas não pode ser desmoralizada – nem no Egito, na Venezuela ou na Suécia. O atraso no soldo solapa a hierarquia e a disciplina, base das organizações militares. A corrupção e a desordem tendem a se tornar crônicas, degradando toda a corporação. Na BM, a recusa em cumprir uma determinação deveria ser punida com prisão, e um protesto, tratado como motim. No entanto, os comandantes estão compreensivelmente constrangidos, sensíveis ao fato de que a exigência mínima da contrapartida de um homem ou mulher que põe sua vida em risco pelos outros todo dia é estômago cheio e salário no banco.
A humilhação da polícia abre um vácuo na sociedade, que afeta a todos, servidores e suas famílias ou não. Mas em segurança não há vazio. É como se cavar um buraco na água: algo ocupa o lugar. No caso gaúcho, veremos cada vez mais, de um lado, traficantes mantendo a ordem em territórios dominados e, de outro, linchamentos e milícias de autodefesa se armando contra os bandidos. Ainda não chegamos a um ponto de não retorno, mas estamos a caminho. Para o bem de todos os gaúchos, ou os poderes públicos e a sociedade salvam a BM ou não haverá muito mais o que salvar.
*Jornalista do Grupo RBS
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