DIÁRIO GAÚCHO 23/09/2015 | 07h02
Justiça imediata. Nos primeiros 20 dias de atuação da Justiça no Presídio Central de Porto Alegre, 31 presos relataram ter sofrido violência policial
Novo modelo permite que juiz olhe no olho do preso antes de autorizar a prisão Foto: Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Eduardo Torres
O homem entrou na sala de audiências montada dentro do Presídio Central praticamente se arrastando. Tinha pouca força para falar e dificuldade até mesmo para respirar. Vestia uma camiseta que parecia ter sido simplesmente colocada sobre ele, visto que o homem mal conseguia erguer os braços. O auto de prisão em flagrante registrava: resistiu à prisão, sendo necessário o uso da força.
— A situação dele não correspondia ao que estava relatado no flagrante, então não teria como confirmar a prisão. Ele disse que foi agredido pelos PMs a socos e pontapés. Havia visíveis sinais de espancamento que precisam ser investigados — detalha o juiz Sidinei Brzuska.
Juiz percebe
Colocadas em prática para humanizar os processos criminais deixando o suspeito frente a frente com um juiz antes que a prisão seja homologada, as audiências de custódia têm revelado que esse caso está longe de ser uma exceção.
Um relatório do Conselho Nacional de Justiça fechado com dados dos primeiros 20 dias das audiências na Capital aponta que nesse período, 12% (31 casos) dos 243 autuados em flagrante que chegaram ao plantão do Fórum reclamaram de maus-tratos por parte dos policiais.
Eles foram encaminhados, com os vídeos das audiências, ao Ministério Público e à Corregedoria da BM para que sejam apurados. O volume médio diário de casos relatados é o mesmo de São Paulo, onde as audiências de custódia tiveram início em fevereiro.
Quando o juiz percebe que as lesões não correspondem ao relatado no exame de corpo de delito o caso é levado adiante.
— É um número bem elevado, mas não pode ser considerado conclusivo. O uso da força em muitos casos é necessário e, em boa parte dos casos em que encaminhamos as informações para serem melhor investigadas, isso não anula a prisão em flagrante. Muitos desses presos relatam as agressões, mas já foram medicados e o que motivou a prisão se configura — aponta o juiz Vanderlei de Olindo.
Casos de agressão ganham novo olhar
A criação das audiências de custódia já é vista como um marco pela Defensoria Pública. Segundo o núcleo de Direitos Humanos do órgão, os relatos de violência policial no momento das prisões é uma realidade que já era observada nos flagrantes. O que mudou agora foi o olhar.
Sem as audiências de custódia imediatas — até 24 horas depois da prisão —, o juiz plantonista confirmava ou não os flagrantes baseado unicamente nos relatórios policiais. Ele só teria contato com o preso na primeira audiência de instrução, que poderia levar meses. Casos de agressão escapavam dessa percepção.
— Com o magistrado tendo a oportunidade de analisar o preso e as condições em que ele foi conduzido, o caso ganha celeridade e credibilidade. Acredito que até mesmo a conduta policial tende a melhorar com esse procedimento — afirma a coordenadora do núcleo de defesa criminal da Defensoria, Carolina Zago.
Aumentam os enfrentamentos
Entre os relatos de agressões, pelo menos um elemento chama a atenção do juiz Vanderlei de Olindo. Quase sempre, os agredidos colecionam outros antecedentes.
— Raramente um primário relata ter sido agredido. Não diria que isso é decisivo para determinar a veracidade de uma agressão, mas é sintomático que alguém, já tendo sido preso, resista a uma nova detenção — avalia o magistrado.
Mesma observação faz o corregedor da Brigada, tenente-coronel Jéferson Jaques.
— Não creio que tenha aumentado a violência do policiamento nas ruas, mas a resistência dos suspeitos aumentou.
Quando uma denúncia chega à corregedoria, o primeiro passo, segundo o oficial, é verificar se o caso é compatível com a realidade. Depois, instala-se um inquérito policial militar.
— Em casos com comprovação de tortura vai para a Justiça comum — explica o corregedor.
As audiências de custódia
- No primeiro mês, 382 autuados em flagrante foram apresentados à Justiça.
- 105 desses presos foram liberados sem a necessidade da audiência de custódia.
- 277 passaram por audiências de custódia e 39 deles receberam alvarás
de soltura.
- Até o dia 19 de agosto, quando 159 presos haviam passado por audiências, 31 registraram possíveis agressões policiais.
Justiça imediata. Nos primeiros 20 dias de atuação da Justiça no Presídio Central de Porto Alegre, 31 presos relataram ter sofrido violência policial
Novo modelo permite que juiz olhe no olho do preso antes de autorizar a prisão Foto: Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Eduardo Torres
O homem entrou na sala de audiências montada dentro do Presídio Central praticamente se arrastando. Tinha pouca força para falar e dificuldade até mesmo para respirar. Vestia uma camiseta que parecia ter sido simplesmente colocada sobre ele, visto que o homem mal conseguia erguer os braços. O auto de prisão em flagrante registrava: resistiu à prisão, sendo necessário o uso da força.
— A situação dele não correspondia ao que estava relatado no flagrante, então não teria como confirmar a prisão. Ele disse que foi agredido pelos PMs a socos e pontapés. Havia visíveis sinais de espancamento que precisam ser investigados — detalha o juiz Sidinei Brzuska.
Juiz percebe
Colocadas em prática para humanizar os processos criminais deixando o suspeito frente a frente com um juiz antes que a prisão seja homologada, as audiências de custódia têm revelado que esse caso está longe de ser uma exceção.
Um relatório do Conselho Nacional de Justiça fechado com dados dos primeiros 20 dias das audiências na Capital aponta que nesse período, 12% (31 casos) dos 243 autuados em flagrante que chegaram ao plantão do Fórum reclamaram de maus-tratos por parte dos policiais.
Eles foram encaminhados, com os vídeos das audiências, ao Ministério Público e à Corregedoria da BM para que sejam apurados. O volume médio diário de casos relatados é o mesmo de São Paulo, onde as audiências de custódia tiveram início em fevereiro.
Quando o juiz percebe que as lesões não correspondem ao relatado no exame de corpo de delito o caso é levado adiante.
— É um número bem elevado, mas não pode ser considerado conclusivo. O uso da força em muitos casos é necessário e, em boa parte dos casos em que encaminhamos as informações para serem melhor investigadas, isso não anula a prisão em flagrante. Muitos desses presos relatam as agressões, mas já foram medicados e o que motivou a prisão se configura — aponta o juiz Vanderlei de Olindo.
Casos de agressão ganham novo olhar
A criação das audiências de custódia já é vista como um marco pela Defensoria Pública. Segundo o núcleo de Direitos Humanos do órgão, os relatos de violência policial no momento das prisões é uma realidade que já era observada nos flagrantes. O que mudou agora foi o olhar.
Sem as audiências de custódia imediatas — até 24 horas depois da prisão —, o juiz plantonista confirmava ou não os flagrantes baseado unicamente nos relatórios policiais. Ele só teria contato com o preso na primeira audiência de instrução, que poderia levar meses. Casos de agressão escapavam dessa percepção.
— Com o magistrado tendo a oportunidade de analisar o preso e as condições em que ele foi conduzido, o caso ganha celeridade e credibilidade. Acredito que até mesmo a conduta policial tende a melhorar com esse procedimento — afirma a coordenadora do núcleo de defesa criminal da Defensoria, Carolina Zago.
Aumentam os enfrentamentos
Entre os relatos de agressões, pelo menos um elemento chama a atenção do juiz Vanderlei de Olindo. Quase sempre, os agredidos colecionam outros antecedentes.
— Raramente um primário relata ter sido agredido. Não diria que isso é decisivo para determinar a veracidade de uma agressão, mas é sintomático que alguém, já tendo sido preso, resista a uma nova detenção — avalia o magistrado.
Mesma observação faz o corregedor da Brigada, tenente-coronel Jéferson Jaques.
— Não creio que tenha aumentado a violência do policiamento nas ruas, mas a resistência dos suspeitos aumentou.
Quando uma denúncia chega à corregedoria, o primeiro passo, segundo o oficial, é verificar se o caso é compatível com a realidade. Depois, instala-se um inquérito policial militar.
— Em casos com comprovação de tortura vai para a Justiça comum — explica o corregedor.
As audiências de custódia
- No primeiro mês, 382 autuados em flagrante foram apresentados à Justiça.
- 105 desses presos foram liberados sem a necessidade da audiência de custódia.
- 277 passaram por audiências de custódia e 39 deles receberam alvarás
de soltura.
- Até o dia 19 de agosto, quando 159 presos haviam passado por audiências, 31 registraram possíveis agressões policiais.
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