FOLHA.COM 07/11/2015 02h00
EDITORIAL
Antes de designar uma corporação, o sentido original da palavra "polícia" remete às disposições criadas para garantir a ordem e a segurança física do conjunto dos cidadãos. Uma polícia que perca a confiança do público, por reincidir em atentados contra a integridade de indivíduos e o ordenamento legal, experimenta a pior deturpação que se pode imaginar.
Essa é a realidade, lamentavelmente, de muitas forças de segurança pelo Brasil. Não é raro que a Polícia Militar de um Estado carregue a fama de violenta e demasiado letal, nem que sua Polícia Civil passe por inoperante ou corrupta.
Bem representativa dessa grave situação é a pesquisa Datafolha com moradores da capital paulista publicada nesta sexta-feira (6). A maioria (60%) diz ter mais medo que confiança na Polícia Militar. No caso da civil, o temor é só um pouco menos prevalente: 55%.
Haverá exceções regionais, decerto. E não faltará quem pondere que uma categoria inteira não deve ser condenada pela má conduta de alguns agentes. A sucessão de flagrantes de brutalidade policial e leniência investigativa, contudo, enfraquece sobremaneira essa linha de argumentação.
Considere-se o caso da morte do menino Eduardo de Jesus Ferreira, 10, pelo disparo de fuzil de um policial no complexo de favelas do Alemão, em abril. Não é a primeira tragédia do gênero, no Rio de Janeiro ou noutras partes do país, mas voltou a causar comoção pelo resultado do inquérito.
A PM alega ter sido recebida à bala. A família diz que nem tiroteio ocorria. Fato é que a cabeça do garoto foi alvejada e que a Polícia Civil concluiu que o policial militar teria agido em legítima defesa.
A afirmação soa inverossímil, para não dizer precursora de uma via para a impunidade. O policial estava a cinco metros de Eduardo, que tinha um celular na mão. Do que o agente se defendia?
Outras ocorrências notórias têm reforçado a impressão de que mortes injustificáveis são causadas a sangue frio por policiais –como as de dois suspeitos rendidos pela PM de São Paulo, em setembro, parcialmente flagradas em vídeo.
Estatísticas corroboram a sensação de aumento da letalidade. Em 2014, 3.022 pessoas foram mortas por policiais no Brasil, acréscimo de 37% sobre as 2.203 de 2013.
Não se pode dizer, contudo, que a reputação duvidosa de nossas polícias seja tendência inédita ou recente –não na capital paulista.
Nos últimos 20 anos, período em que a Polícia Militar sempre respondeu a governos do PSDB, todas as pesquisas Datafolha sobre o tema mostraram que a parcela dos paulistanos que confia nessas corporações sempre foi superada pela fatia dos que delas têm medo.
Algo está muito errado. O poder público precisa arrostar a noção incivilizada de que letalidade policial é popular e dedicar-se mais a policiar a própria polícia.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - LAMENTÁVEL ESTE "MEDO". Lamentável ter medo da única instituição do Estado que socorre o cidadão e defende a população neste Brasil de leis permissivas, justiça leniente, execução penal irresponsável e poder político omisso que favorecem a impunidade e o aumento da violência neste país. Os policiais brasileiros foram abandonados pelo estado, enfraquecidos pelas leis, segregados pela justiça, sucateados em efetivos e partidarizados pelo poder político. Não é a toa o descrédito. Hoje eles arriscam a vida enxugando gelo contra o crime.
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