ALERTA: A criminalidade e a violência crescem de forma assustadora no Brasil. Os policiais estão prendendo mais e aprendendo muitas armas de guerra e toneladas de drogas. A morte e a perda de acessibilidade são riscos presentes numa rotina estressante de retrabalho e sem continuidade na justiça. Entretanto, os governantes não reconhecem o esforço e o sacrifício, pagam mal, discriminam, enfraquecem e segmentam o ciclo policial. Os policiais sofrem com descaso, políticas imediatistas, ingerência partidária, formação insuficiente, treinamento precário, falta de previsão orçamentária, corrupção, ingerência política, aliciamento, "bicos" inseguros, conflitos, autoridade fraca, sistema criminal inoperante, insegurança jurídica, desvios de função, disparidades salariais, más condições de trabalho, leis benevolentes, falência prisional, morosidade dos processos, leniência do judiciário e impunidade que inutilizam o esforço policial e ameaçam a paz social.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

CUSTO DA VIOLENCIA CONTRA POLICIAIS

EXTRA 03/06/18 04:30

Estudo da PM mostra que violência contra policiais apenas em 2017 custará R$ 35 milhões ao Estado

Cabo Braga, que perdeu a pena em operação policial, abraça seu filho.
Cabo Braga, que perdeu a pena em operação policial, abraça seu filho. Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo
Matheus Maciel

Vila Cruzeiro, Complexo da Penha, 8h da manhã de 11 de janeiro de 2017. Numa emboscada, o grupo tático da UPP é atacado a tiros. O cabo Braga é o primeiro a descer do carro. Em segundos, uma granada explode perto de seu corpo. Ele é arremessado a quatro metros de altura. Quando tenta se levantar, percebe que perdeu a perna esquerda.

No meio do tiroteio entre policiais e traficantes, Braga é socorrido e levado para o Hospital estadual Getúlio Vargas, na Penha. Sofre três paradas cardíacas e precisa de dez bolsas de sangue. Apesar disso, quando se lembra daquele dia, o cabo, que prefere não ter o nome completo divulgado, se considera um homem de sorte: não se tornou mais um dos 28 policiais militares mortos em serviço no ano passado.

Uma perda que não é medida pela Polícia Militar apenas em vidas e famílias destruídas. Um estudo feito pela corporação mostra que a violência cometida contra esses PMs, durante o tempo que teriam de atividade profissional, custará em pensões R$ 35 milhões ao Estado. Um preço que o governo paga pela sua própria incapacidade de reduzir a criminalidade.

O estudo, produzido pela Diretoria de Assistência Social (DAS) da PM e obtido pelo EXTRA, mede os custos para os cofres do estado do que define como uma "guerra urbana". Nos últimos 24 anos, foram 3.397 policiais mortos, e outros 15.236 feridos.

— Sem falar na perda imensurável na questão humana, a PM diminui cada vez mais seu efetivo policial e gera um rombo no investimento ainda maior — afirma o coronel Fábio Cajueiro, responsável pela DAS.

O oficial explica que o cálculo foi feito com base no salário que a família de cada policial receberá no tempo restante que o PM teria de serviço. Ou seja, caso o agente tenha morrido com apenas cinco anos de corporação, o cálculo multiplica os 25 anos restantes para a aposentadoria por 13 (referente aos 12 meses de salário somado ao 13º) e, por fim, pelo salário mensal.

Dessa forma, a morte de um soldado no seu quinto ano de atividade policial representará para a corporação cerca de R$ 1,3 milhão. Sem reforçar a segurança do estado. Ao ser morto em serviço, o PM recebe um soldo acima do cargo hierárquico em que estava: o soldado utilizado como exemplo receberá como cabo.

— É importante frisar que estamos apresentando um cálculo que leva em consideração apenas os salários, sem os demais custos que existem. É um número assustador que só vem crescendo — conta Cajueiro.

Além do cálculo baseado nas mortes do ano passado, o estudo realizou um levantamento sobre o custo de cada policial afastado em razão de ferimentos por armas de fogo. No total, foram levados em conta 255 policiais entre os 784 feridos em 2017. O valor final se aproxima dos R$ 3,5 milhões. Nesse caso, o cálculo considera os dias afastados de serviço de cada PM.

Agora reformado por invalidez, o cabo Braga não entra nos cálculos do DAS. O policial agora leva seus dias tentando melhorar as condições para os companheiros de farda que mais precisam. Ele faz parte da Comissão de Valorização de Veteranos Mortos e Feridos da PM.

— Infelizmente, a situação só piora. E com as perdas constantes, há uma menor qualidade de equipamentos, meios de prevenção, treinamentos e auxílios aos profissionais — lamenta Braga.

A VIDA EM FAMÍLIA

A vida do policial mudou por completo desde que sofreu o ferimento. Ele é faixa preta em taekwondo e tinha um projeto social de artes marciais gratuito no Morro São João, no Engenho Novo. O projeto deu certo e conseguiu atingir mais de 200 jovens, mas durou apenas dois anos. Teve de ser encerrado pelo crescimento da criminalidade na região.

— Eu perdi minha melhor perna de chute. Agora, não posso mais fazer algo que tinha paixão. Mal posso me locomover pela cidade, na verdade. O Rio não é preparado para os deficientes — comenta o cabo.

O PM conta que apenas percebeu a falta que faria para o filho quando estava deitado na cama do hospital, com a perna amputada e correndo risco de vida. A família decidiu por preservar a notícia da criança enquanto a visita no hospital não era possível. Braga contou com o apoio de sua esposa e de sua família durante todos os momentos difíceis.

— Escondemos durante uns dias. Minha esposa e minha família foram essenciais. Mas, quando vi meu filho, não aguentei. Ele me deu um abraço e ficamos chorando juntos. Eu não tinha chorado até ali. Foi o momento da minha derrocada pessoal.

O filho de apenas quatro anos nasceu após Braga estar há dois anos na corporação. Ao contrário dos conselhos que escutava dos companheiros, não diminuiu o ritmo de trabalho:

— Eu queria dar ao meu filho uma vida mais tranquila. Achava que, para tornar a sociedade melhor, precisava ir além.

Apesar da pouca idade, o filho tenta não chorar mais na frente do pai. Ainda não há uma noção total da dificuldade que Braga tem com a perda da perna. No entando, a admiração não foi abalada pelo acidente e gera até brincadeiras.

— Ele brinca comigo, pula num pé só. Mas ao mesmo tempo dá conselho: "pai, toma cuidado para os bandidos não tirarem sua outra perna". Ele não entende tudo, mas tem a preocupação — compartilha o cabo.

MORTES PRECOCES SÃO ALARMANTES

Entre os dados apresentados pelo estudo, há o tempo de atividade dos policiais mortos em serviço no ano passado. Cerca de um terço dos PMs morreram quando tinham no máximo 5 anos de corporação.
— De infeliz destaque, há um soldado que só teve dois anos trabalhando na Polícia Militar. Uma vida tão nova já sendo retirada pelo crime e deixando de servir a corporação pelos próximos 28 anos. É uma perda imensurável — afirma Cajueiro.

Outro número também chama atenção entre os mais novos. Em 2017, o afastamento psiquiátrico gerou um gasto superior a R$ 28 milhões. Cerca de 58% dos licenciados estão nos primeiros dez anos de serviço.

— Esses policiais podem acabar retornando, mas não temos como saber. São uma perda em relação ao pessoal disponível no efetivo policial e uma perda para toda a sociedade. São humanos afetados pela guerra em que vivemos — completou o coronel.

RESULTADOS E PROPOSTAS

A Diretoria de Assistência Social trouxe propostas de prevenção com base nos dados levantados. De acordo com o estudo, o custo com os salários e seguros de mortos em feridos foi de R$ 208 milhões no ano passado.

A blindagem dos carros é posta em pauta como principal precaução. Com base nos números citados, o custo da blindagem 3A (proteção para os calibres 22, 38, 9mm e Magnum 375 e 44) das 3.000 viaturas no estado do Rio seria de 50% do valor gasto em 2017 com as perdas.

— O ideal é que haja um olhar especial para a prevenção. Seja nas blindagens, coletes balísticos e leis mais rigídas — afirma o cabo Braga.

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