Policiais civis suspeitos de receber propina. Três agentes foram afastados por suposta proteção a clínica de aborto - JOSÉ LUÍS COSTA, ZERO HORA 14/09/2011
Suspeitos de receber propina de uma clínica clandestina de aborto no centro de Porto Alegre, três agentes do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o órgão de elite da Polícia Civil, foram denunciados à Justiça pelo Ministério Público (MP). Os policiais exerceram a função de chefe de investigações na Delegacia de Homicídios da Capital – responsável por reprimir esse tipo de crime – e estão afastados do trabalho desde o começo de agosto por ordem do Conselho Superior de Polícia.
Além deles, o MP denunciou outras sete pessoas por suposto envolvimento em abortos e pagamento de propina a policiais – cinco delas tiveram a prisão preventiva decretada – e, pelo menos uma já é ré em um processo por crime de aborto que tramita na 1ª Vara do Júri de Porto Alegre.
Assinada pela promotora Lúcia Helena de Lima Callegari, a denúncia contra os agentes é resultado de investigações de policiais de Canoas e da Corregedoria-geral da Polícia Civil (Cogepol), baseada em depoimentos, quebra de sigilo telefônico e escutas autorizadas pela Justiça.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, quando surgiam queixas, os policiais civis teriam se omitido de investigá-las e avisariam a clínica sobre eventuais buscas no local. Em troca, os agentes teriam recebido dinheiro. A investigação da Cogepol e do MP apontou que essa prática teria ocorrido entre novembro de 2010 e abril deste ano.
PMs integrariam esquema
Em uma conversa gravada, em 21 de março, que teria como interlocutores uma mulher da clínica, Sandra Maria Indicatti, e o policial civil Walter Reyes Boehl, eles marcariam um encontro no Centro.
–Vou levar as tuas calças, que tu mandou fazer a bainha, mas vê se tu me paga, né? Vou te dar um descontinho porque tu trouxe bastante calça dos teus amigos – disse a mulher.
No entender da Cogepol e do MP, a frase significaria que o policial estaria recebendo propina por indicar clientes para a clínica. Em outra conversa grampeada, também em 21 de março, Sandra teria feito contato com outro agente, Paulo Vladimir de Farias Quintana. Conforme a denúncia, Sandra teria, em uma agenda pessoal e na memória de celulares, números de telefones particulares e funcionais dos policiais. Sandra também teria mantido contatos com outro policial, Pedro Oldimar Diniz, que foi chefe de investigações da Delegacia de Homicídios de 2008 até o final do ano passado.
Há suspeita de que quatro PMs, até agora não identificados, davam cobertura para as atividades da clínica. Uma cópia da denúncia foi remetida para a Corregedoria da Brigada Militar. No período de interceptações telefônicas foi constatado que cinco médicos – da Serra, do Vale do Sinos e de Canoas – teriam encaminhado pacientes para a clínica.
Estimativas policiais indicam que na clínica clandestina eram feitos, em média, cem abortos por mês, a preços de até R$ 3,8 mil. A clínica funcionava em três salas do quarto andar de um prédio na Avenida Otávio Rocha, sob a fachada de uma loja de confecções, em condições precárias de higiene.
A denúncia aponta que o corretor de imóveis José Fernando de Moura seria uma das pessoas que realizava os procedimentos, e o que marido de Sandra, João Alberto Souza Carbone, atuaria como olheiro na portaria do prédio.
Contrapontos
O que diz o advogado Marcos Vinícius Barrios, defensor do policial Paulo Vladimir de Farias Quintana - “Não temos acesso ao processo. Assim que tivermos, vamos apresentar a defesa. O Quintana tem um histórico com bons serviços prestados à polícia. Não recebeu propina, e o afastamento dele das funções foi por um ato da Corregedoria”.
O que diz o policial Pedro Oldimar Diniz - Zero Hora tentou contato com Diniz por meio de três celulares dele, mas estavam desligados e deixou recado com colegas dele. Em depoimento à Cogepol, Diniz negou ter recebido propina. Afirmou que tinha passado o telefone dele para uma mulher ao investigar a morte de um médico, suspeito de praticar aborto, em outubro do ano passado.
O que diz o policial Walter Reyes Boehl - ZH tentou falar com Walter por meio de dois celulares dele, mas estavam desligados. Colegas dele informaram que não poderia informar outros contatos. Em depoimento à Cogepol, acompanhado do advogado Santo Viríssimo Camacho Rodrigues, Walter disse que investigava a clínica e negou receber propina.
O que diz o corretor de imóveis José Fernando de Moura - ZH ligou para o celular de Moura, mas estava desligado. Na casa dele, uma pessoa atendeu ao telefone e informou que ele está em viagem.
O que diz o advogado César Peres, defensor de Sandra Maria Indicatti e João Alberto Souza Carbone - “A Sandra é funcionária de uma loja de confecções. Ela responde a uma processo por aborto, que se alonga há anos na Justiça, mas ela nada tem a ver com crimes. Se tornou suspeita por causa desse processo, mas é inocente. Tanto é verdade que, quando ocorreu a batida policial na loja, não encontraram nada. O João é aposentado, presta serviço de motorista e faz entregas para a loja”.
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